Ao longo de sua história, o Atelier Livre abrigou-se em vários locais, inclusive no Mercado Público, até ganhar seu espaço definitivo no Centro Municipal de Cultura, inaugurado em 1978. A escola ocupou boa parte dos 1,7 mil metros quadrados do edifício, garantindo salas amplas que fariam inveja a muitas instituições. Mas o descaso foi tanto que a estrutura hoje se deteriora a ponto de pôr em perigo seus frequentadores. A parede divisória entre uma sala de desenho e a de pintura perdeu a parte superior e outros painéis ameaçam cair. Uma claraboia no auditório, inicialmente projetada para oferecer luz natural para a prática artística, perdeu a tampa. Antes de receber uma solução paliativa, foi coberta com uma lona que saía do lugar a cada chuva e inundava o ambiente.

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A Secretaria Municipal da Cultura possui uma equipe de manutenção que visita o prédio semanalmente para serviços urgentes como troca de lâmpadas, conserto de vazamentos e curtos-circuitos. No entanto, falta verba até para substituir maçanetas. Com sete membros, a equipe atende a todos os prédios culturais da cidade – cerca de 20, entre eles casas antigas como o Arquivo Histórico, a Casa Torelly e a Usina do Gasômetro.

– Tenho R$ 1 mil por mês para fazer compras para todos os prédios. Uma fechadura daquelas do Atelier custa em torno de R$ 150 – explica Wolney Carvalha Prado, chefe da equipe de administração dos prédios culturais.

Segundo o servidor, o Atelier Livre precisa de uma reforma geral nas instalações elétrica e hidráulica. Mas isso está longe de acontecer, nas condições atuais:

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– O orçamento é precário. Teria de ser 10 vezes maior para fazer a manutenção preventiva e corretiva para que os prédios possam funcionar com segurança. O ideal também seria termos uma equipe terceirizada com pessoal jovem, pois os servidores da minha equipe têm 60 anos, em média. Fica difícil fazer trabalhos que demandam esforço físico maior.

Na sala de xilogravura e gravura em metal, prensas caras estão ociosas por falta de manutenção devida ou são usadas com materiais improvisados. O professor Wilson Cavalcanti faz tantos reparos que foi apelidado de ¿mecânico¿. Na sala anexa, onde se manipulam ácidos, o exaustor não funciona. As condições do prédio inspiram soluções criativas:

– Acabamos indo para a rua, já que o gás é perigoso. Também tenho feito um ácido caseiro que não é tóxico, à base de vinagre, sal grosso e cobre – conta Cavalcanti.

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Nessas duas salas, apenas um entre nove tanques funcionam. Há danos herdados de um incêndio de anos atrás e também de um alagamento – entre o Natal e o Ano-Novo de 2016, um registro arrebentou e inundou todo o andar inferior.

Alguns objetos que parecem novos aos olhos de quem visita o lugar, na verdade, vêm do bolso de alunos e professores.

– No final do ano passado, todos os professores fizeram feiras no Natal. E rifas, também – lembra a assistente-administrativa Rejane Santos da Silva, acrescentando que os ganhos são aplicados em melhorias nas salas de aula.

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É graças aos alunos que a sala de litografia, onde estão raras pedras importadas da Alemanha, tem ar-condicionado:

– Vendemos um calendário para comprar um ar-condicionado no ano retrasado – relata Inói Varela, artista que desenvolve trabalho no Atelier.

Do lado de fora, um velho problema: os assaltos

Uma queixa comum dos frequentadores do Atelier Livre é a insegurança. Segundo a Guarda Municipal, o edifício tem patrulhamento fixo, com duas pessoas à noite e uma durante o dia. No entanto, alunos dizem que o estacionamento fica desatendido. É lá que assaltantes costumam agir.

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– A segurança é zero. No ano passado, foram pelo menos cinco assaltos, professores tiveram seus carros levados do estacionamento. E também roubaram obras da última exposição (o saguão do edifício abriga mostras continuamente) – denuncia Bragança.

– Vários alunos desistiram do turno da noite por causa dos assaltos realizados sistematicamente na área do estacionamento – concorda Rejane.

O comandante-geral da Guarda Municipal, Luiz Antonio Pithan, afirma que a principal reclamação que recebe é relativa a flanelinhas:

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– Temos guarda fixo 24h e, nos eventos de grande porte, temos viatura no local no início e ao final. O maior problema são os flanelinhas que ficam achacando o pessoal. Estamos atuando com mais intensidade nesse sentido.

Além disso, as salas do segundo andar costumam sofrer vandalismo. Em 2016, pedras arremessadas contra a sala de desenho quebraram seis vidros – já substituídos.

O Atelier Livre através do tempo

1960

O Atelier Livre é idealizado em dezembro de 1960, quando um grupo de jovens artistas participa dos Encontros com Iberê, na Galeria Municipal de Arte, no antigo abrigo dos bondes da Praça XV. Na mostra de encerramento da oficina, Iberê Camargo, que recém havia criticado publicamente o marasmo cultural de Porto Alegre, declara: ¿Este movimento foi uma arrancada. É intenção dos jovens expositores prosseguir, associados num atelier livre¿.

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1961

O projeto é adotado pelo Secretário da Educação da época, Carlos de Britto Velho. Em 10 de abril, o Atelier Livre nasce, com a nomeação de seu primeiro diretor, Xico Stockinger.

1962

O Atelier Livre é transferido para os altos do Mercado Público.

1964

Danúbio Gonçalves assume a direção. Fica até 1979.

1973

A sede muda novamente, para uma casa na Rua Lobo da Costa.

1978

Na esquina das avenidas Erico Verissimo e Ipiranga, é inaugurado o Centro Municipal de Cultura que se torna a sede definitiva do Atelier Livre. Com mais professores, o perfil da instituição também muda, aproximando-se de uma escola.

1986

É criado o Festival de Arte Cidade de Porto Alegre, com a presença do artista Hudinilson Jr., um entre os vários artistas de renome nacional e internacional que o evento traria à capital gaúcha a partir de então.

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1996

É realizado o primeiro e único concurso para instrutores do Atelier Livre. Dez das 17 vagas são preenchidas.

2011

O Atelier Livre completa 50 anos com programação especial, exposições no Margs, no Santander Cultural e no Paço Municipal e recebe homenagem no Prêmio Açorianos de Artes Plásticas.