O número de questões não mudou, mas a dificuldade… O Enem deste ano, apesar de manter a média de três perguntas envolvendo conhecimentos artísticos na prova de Linguagens, pesou a mão: todas foram consideradas complexas por professores, exigindo informações específicas e fornecendo respostas com as quais nem todo mundo concorda.
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Neste ano, as questões foram do Surrealismo à Arte Contemporânea, mas, desta vez, mais do que a exigência de interpretação de texto ou imagens, que sozinha poderia levar à resposta correta em outras provas, houve a necessidade de conhecer detalhes das obras.
Entenda as diferenças nos gabaritos oficial e extraoficial do Enem 2015
– O Enem 2015 cobrou conhecimentos muito específicos, que não estavam diretamente expostos nas questões. Seria preciso mais do que um ano de aulas de Artes, que geralmente é o oferecido no Ensino Médio – reflete Ana Valéria Machado, professora no Colégio Monteiro Lobato.
Além da dificuldade dos conteúdos, as respostas também não vieram sem críticas. Professores contestaram a formulação de enunciados e a dubiedade de alternativas que levaram muitos a apontar soluções diferentes do gabarito oficial.
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– A arte é subjetiva, e as alternativas cobraram uma resposta objetiva que não corresponde à interpretação de todos. Tem questões ali, como a do Magritte
(veja ao lado), em que há ambiguidade: ninguém pode afirmar 100% que a alternativa apontada é a verdadeira – avalia o professor do Universitário Marcos Bondan.
Como as universidade públicas do RS utilizam a nota do Enem
Letras de músicas voltaram a marcar presença na prova, assim como a descrição de manifestações culturais. Um exemplo foi o texto sobre o rap e o funk na socialização da juventude.
– Veja o caso de Lucien Freud. É um artista específico, mas pouco trabalhado. A indicação do texto faria, pela interpretação, que quem presta a prova pudesse resolver a questão. A arte nesse caso foi só o tema, mas a questão era de interpretação – diz André Rocha, professor de Arte na Fundação Educacional João XXIII.
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ANÁLISE
Confira os comentários do professor André Rocha sobre as questões de Arte no Enem 2015. A numeração segue a ordem da prova rosa.
Questão 106 – resposta E
Com o texto, torna-se mais acessível argumentar que a resposta correta é “E”, pois ao representar um corpo “neste específico espaço de tempo”, a idealização da forma fica
prejudicada, o que faz com que se represente sem truques, como é de fato. “A” cai, pois o texto não sugere gênero, “B” fala em ideal: fora. “C” está desqualificada, pois nota-se que a pose é do centro e pende para a direita, diferente de uma simetria. “D” é eliminada, porque o contemporâneo abre espaço para a diversidade, e o discurso da estética do “belo” ficou com a arte clássica e neoclássica até o impressionismo.
Questão 107 – resposta D
O modernismo trouxe uma fuga da arte que tinha no “belo”, na representação mimética da realidade a sua primazia, ou seja, a arte moderna distorceu, mudou cores e formas. O encontro desta proposta com as artes de culturas estranhas à cultura europeia foi um dos achados do modernismo, em particular o cubismo, que simplificou formas, mas não só isso: tentou mostrar a realidade por diferentes ângulos ao mesmo tempo. Como a arte modernista distorce, a letra “A” está fora, pois as proporções não são preservadas. A letra “B” cita movimento, o que não pode ser considerado, pois apenas os futuristas italianos remetiam a isso na pintura, tentando exatamente fugir das estruturas “primitivas”. “C” não é de todo incorreto, pois a simetria (ambos os lados proporcionais e iguais) não era um comprometimento modernista. A grande certeza é a letra “D”, na qual a sintetização das formas foi um dos carros-chefe da representação modernista. Por fim, em “E”, a valorização estética (remetendo ao “belo” novamente) está fora da proposta moderna.
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Questão 109 – resposta D
A performance é uma das linguagens no que diz respeito à contemporaneidade, e a artista citada é uma das referências no ramo. A letra “A” refere-se ao museu. Bem, não que não possa acontecer em museus, mas a performance está mais para a praça, o pátio, o tumulto na multidão, por isso pode ser descartada. A letra “B” também, porque nem toda a proposta artística tem o viés educativo, ainda mais as performances marcantes. A letra “C” novamente cita museu, não sendo este o espaço mais indicado para a performance. A letra “D” diz respeito à participação mútua entre artistas e público, com papéis participativos além do sentido visual como outrora. A contemporaneidade chama isso, ou seja, espectador ou espectadora, o faz não apenas com os olhos, mas com outros sentidos também. Talvez a letra “E” se exclua pela ainda pouca aceitação dessas linguagens contemporâneas a um público mais amplo, pois ela é de difícil paladar.
Questão 126 – resposta A
Questão de grau elevado, na qual se escancara a necessidade de análise da arte desde as vanguardas modernas, não mais apenas pelo viés da sensação ótica (visão), mas de uma completa imersão nas propostas. Magritte é um dos gênios do surreal, fazendo grupo com o famoso Dalí, com Chagall e com o metafísico De Chirico. A letra “A” se revela como a mais lógica, pois descreve boa parte do trabalho de Magritte, não apenas nesta obra, mas na maioria delas. A estrutura do passado poderia ser representada conforme sempre ocorreu, ou seja, alguém frente ao espelho se olharia. Assim, a letra “B” se descarta. A letra “C” também pois não há representação de perspectiva nesta obra, o fundo é borrado e sem profundidade. A letra “D” se descarta, pois o automatismo é uma característica muito mais marcante no dadaísmo do que no surrealismo. Por fim, a letra “E” diz uma inverdade, que o livro foi colado e o reflexo do livro acusaria isso. Porém, ao observar, nota-se que o livro está perfeitamente refletido, pois tudo que do livro aparece no reflexo está devidamente espelhado ao contrário.