Aos 60 anos, a professora Ana Maria Dias nem parece que acabou de se aposentar. Após mais de duas décadas dando aulas na Escola Básica Albertina Madalena Dias, na Vargem Grande, no norte da Ilha, não tem quem não a cumprimente, sejam ex-colegas, ex-alunos ou os pais deles.
Continua depois da publicidade
— Ela é de casa — diz o diretor Claudir Didomenico.
A história da professora se confunde com a da escola. Aliás, ela nasceu dentro dela. Aninha, como é carinhosamente chamada, conta que a mãe Albertina Madalena Dias, já falecida, transformou a sala de casa em sala de aula. Isso foi em junho de 1957. Um mês depois, Aninha nasceu.
Na época, a escola que surgiu em sua casa atendia cerca de 50 alunos de 1ª a 4ª série, o antigo primário. Era chamada Escola Mista da Vargem Grande. Foi na casa-escola que Aninha aprendeu a ler e a escrever tendo a mãe como professora.
Continua depois da publicidade
— A minha mãe, mesmo com os filhos, era muito rígida. Era tudo certinho, não podia fazer nada de errado. E aquela época era muito boa, a gente fazia fila para entrar na sala, hasteava a bandeira, cantava o hino nacional — relembra.
Quando terminou a 4ª série, foi morar no centro da cidade na casa de parentes, onde cursou o ginásio e o segundo grau. Aninha lembra que para visitar os pais no fim de semana era uma verdadeira viagem. Primeiro ia de ônibus até Canasvieiras e depois de carroça até a Vargem Grande.
Em 1977 ela casou e foi morar em Criciúma, no Sul do Estado. Oito anos depois veio a separação e Ana voltou para a casa dos pais com dois filhos pequenos e outro na barriga. Foram tempos difíceis, conta Aninha, mas com o apoio da família conseguiu dar a volta por cima.
Continua depois da publicidade
— Meu irmão trouxe um jornal que falava do concurso da prefeitura. Mas eu disse: “como vou trabalhar com três crianças?” Minha mãe deu o maior suporte, foi meu porto seguro, ela me disse: “filha, faz o concurso que se tu passar a mãe ajuda a cuidar dos filhos”.
Aninha ficou em primeiro lugar como auxiliar de sala na creche Raul Francisco Lisboa, no bairro Santo Antônio de Lisboa, onde trabalhou por sete anos. Em 1995, mesmo ano da morte da mãe, ela foi transferida para a creche que funcionava dentro da então chamada Escola Desdobrada de Vargem Grande. Nesta época, a escola já não funcionava mais na casa dos pais de Ana, mas em um prédio construído pela prefeitura no terreno ao lado.
Um ano depois, a unidade se transformou em escola básica, passando a oferecer todo o ensino fundamental. No mesmo ano, a direção resolveu homenagear a fundadora e professora Albertina Madalena Dias, que desde então dá nome à unidade. Em 2017, um retrato de Albertina foi pendurado na parede da escola.
Continua depois da publicidade
Paixão pela educação infantil desde cedo
— Eu sempre tive esse dom e o sonho de um dia seguir a carreira da minha mãe. Esse era um dos maiores sonhos dela. A minha maior paixão é a educação infantil, acho que trago de berço. Um das coisas que minha mãe sempre pediu era que eu amasse muito as crianças.
O conselho da Albertina foi seguido a risca por Aninha. Ela se aposentou no dia 15 de fevereiro, depois de 30 anos de profissão. Se alguém duvida da dedicação e do excelente trabalho que ela fez em sala de aula, é só dar um pulo na unidade. Não tem quem não cumprimente, abrace ou pare para conversar com a professora mais querida da comunidade.
— Foi uma excelente profissional. A melhor professora que a minha filha já teve. Ela tem um cuidado, um carinho especial pelas crianças — diz a comerciante Cassiele de Campos, 30, mãe de Rebeca de Campos, seis anos, que foi aluna de Aninha até o ano passado.
Continua depois da publicidade
Suzana Regis, 32, supervisora escolar, conta que no final de 2017, já sabendo da aposentadoria de Aninha, a escola preparou uma despedida para a professora. Segundo ela, todos os alunos, até os mais velhos, participaram.
— Ela tem alunos de muitos anos, então, desde os do 9º ano queriam prestar uma homenagem, porque eles não esquecem dela. Foi muito emocionante.
Ana ainda não lida tão bem com a separação:
— O coração ainda está batendo um pouco forte. Eu ouço o barulhinho das crianças ao lado e todos os dias eu acordo cedo, tomo meu banho, me arrumo como se fosse para o colégio. Eu sou completamente apaixonada por eles.
Continua depois da publicidade
Mesmo com a saída oficial da escola, tudo indica que a professora não deve passar muito tempo longe das crianças. Os planos para o futuro, além de descansar, curtir a família, principalmente os dois netos de quatro meses e cinco anos, é dar aulas de catequese.
— Assim como foi a minha mãe. Quero reencontrar meus alunos lá — diz, com a voz embargada pela emoção.