Praticar corrida de rua, modalidade que tem crescido principalmente entre as mulheres nos últimos anos, pode não ser tão simples quanto parece. As dificuldades não estão somente ligadas à atividade física, mas também aos riscos que elas enfrentam todos os dias. Cansada do assédio, a professora e moradora de Criciúma Giseli Trento, 39 anos, criou o @soquerotreinar, para dar dicas de segurança às mulheres. O perfil no Instagram cresceu, e hoje reúne dezenas de relatos de atletas de todo o país.

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As histórias chegam de todos os cantos, e chamam a atenção pelo desrespeito com quem quer, somente, treinar. São palavras de baixo calão, comentários sobre o corpo e a vestimenta, sem contar os ataques e as tentativas de estupro. Atleta amadora, Giseli fez a primeira corrida em 2016, e de lá para cá encontrou uma segunda família dentro do esporte. Ouvir e dar voz a dezenas de mulheres tem se tornado um aprendizado.

— Virou uma rede de ajuda, uma apoia a outra para não desistir da prática esportiva. As tentativas de estupro são as histórias mais sofridas, pois não tem nada pior do que essa invasão à privacidade — comenta Giseli.

O perfil nasceu para dar dicas de segurança para corredoras de Criciúma, depois de uma sucessão de assédios sofridos pela professora. Enquanto se preparava para uma meia maratona, ela iniciava os treinos de manhã cedo, e no caminho ouvia todo tipo de assédio. A conta foi recebendo cada dia mais adeptos, as histórias começaram a chegar e hoje são mais de 10,5 mil pessoas em apenas três meses de atividade.

— Assovios, palavrões, comentários que deixam a agente assustada, mas mesmo assim não devemos desistir. Nunca sabemos se é uma piada, de muito mau gosto por sinal, ou se é algo que vai acontecer, e isso dá medo — comenta.

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A ideia de discutir o assédio vai além da agressão física ou verbal, e se propõe a trazer o assunto para a roda de conversa. Giseli sabe que muitos desses comportamentos são normalizados pela sociedade, porém não quer dizer que eles sejam corretos. Enquanto alguns homens intimidam, outros se juntam à causa e se tornam defensores de algo básico, que é o direito de ir e vir das mulheres.

— Um dia uma mulher foi contar ao marido sobre o assédio e ele disse "também, você com essa roupa". Às vezes o machismo está dentro de casa e a gente não sabe. A roupa não é um convite para nada — argumenta.

A conta também serviu para aproximar mulheres, e alguns grupos de corrida têm se organizado a partir da rede social. Em Criciúma, um treino coletivo está marcado apara o dia 16 de março, sábado da próxima semana, às 8h. A turma vai se encontrar no Parque de Nações para socializar, trocar contatos para treinar em companhia e falar sobre o combate ao assédio.