A idade fez o ritmo diminuir um pouco, mas parar nunca foi uma opção. Já aposentada, a professora Zelita Chamone, 68, sempre amou a profissão e faz disto um exemplo. Há mais de 20 anos, pacientemente, ela ensina o “beabá” para idosos carentes na garagem da própria casa, em Coqueiros, região continental de Florianópolis, dando a eles mais que a oportunidade de aprender a ler e escrever: ela oferece qualidade de vida.
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_ Eles se matricularam na minha vida e o mínimo que posso fazer é retribuir isso. Já tive aluno que se alfabetizou e depois foi fazer o EJA, para conseguir um diploma _ orgulha-se Zelita, que já perdeu as contas de quantas pessoas conseguiu ajudar.
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Mãe de três filhos e avó de sete, a psicopedagoga mantém sozinha o projeto que, segundo ela, não “custa nada”, mas fez e faz a alegria de muitas pessoas, como Olivia Nicolete Fernandes, que aos 86 anos é a mais experiente da atual turma.
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Craque em matemática
Frequentando o projeto há quase 20 anos, ela é a única que ainda não sabe ler, nem escrever, mas é craque em matemática e adora os encontros com Zelita. Com sorriso largo e sincero, ela explica que não está lá só pelo aprendizado das letras, mas pela amizade que desenvolveu com a professora.
_ Esse é o melhor momento da minha vida e eu adoro estar aqui. Não aprendi a ler nem escrever porque as letras não entram na minha cabeça desde nova, quando eu desisti da escola, mas aqui a gente aprende muito mais que isso _ disse a aposentada, que é natural de Brusque e mãe de 24 filhos, mas que não deixa de ligar para Zelita um dia sequer.
Organização das letras
Quem também faz questão de explicar o bem que as aulas fazem é a Vanilda Kamers, 67 anos, que participa das atividades há 12.
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_ Eu larguei os estudos cedo porque não tinha tempo de ir à aula. Não sabia ler nem escrever e isso me causava vergonha, porque quando eu era promovida em algum emprego, recusava porque não queria contar que era analfabeta _ desabafou.
Vanilda chegou até Zelita por meio de uma amiga, que sabia das aulas. Depois que aprendeu a entender a “organização das letras”, a vida dela melhorou muito.
_ Até minha autoestima ficou mais elevada. Eu me sentia mal por não saber ler, hoje, viajo e vou pra todo canto. Antes não sabia nem onde estava direito.
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Atrás do tempo perdido
O casal Atacília Doralice Ferreira, 78, e Maurilio da Silva, 70, frequenta as aulas há mais de 20 anos. Também foi uma amiga que os apresentou para a professora Zelita e foi através dos ensinamentos dela que ambos se alfabetizaram.
_ A professora Zelita é como uma mãe para mim. Não tem nada que ela faça em casa que não convide a gente para participar. Até nos aniversários dela a gente vem _ disse Atacília, emocionada. Mãe de 12 filhos, ela foi outra que saiu cedo da escola, mas corre atrás do tempo perdido, por acreditar que nunca é tarde demais para aprender.
As aulas
Inicialmente, o projeto fazia parte de Grupo Soroptimistas, uma organização não-governamental que visa ajudar mulheres e meninas por todo o mundo. Participante do grupo, Zelita resolveu montar o projeto para apresentá-lo em um congresso. Como sempre atuou na área de educação, ela então se dispôs a dar aulas para mulheres carentes.
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Passado o congresso, com as alunas batendo na porta e o coração cheio de vontade de trabalhar e ajudar, ela continuou, por conta própria, com as aulas, que eram realizadas semanalmente mas, com o passar dos anos, agora só acontecem no último sábado do mês, das 9h às 11h.
Durante os encontros na garagem de casa, Zelita passa lições básicas de português, matemática, faz jogos e dinâmicas para estimular memória, coordenação e capacidade de aprendizado dos idosos.
Ela já foi convidada a levar seu trabalho para dentro de ONGs, tentou, mas não funcionou. Agora, prefere mantê-lo mesmo na sua garagem, onde tem um espaço que funciona como um pequeno bazar, onde ela deixa as bijuterias, roupas e acessórios que ganha das filhas e netas à disposição para as estudantes pegarem o que lhes servir.
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Para quem ainda duvida que nunca é tarde para aprender, Zelita também é estudante de Direito, além de coordenadora pedagógica de duas instituições e palestrante sobre dificuldades de aprendizado.