Protagonista de qualquer brinde, no Natal ou Réveillon, o espumante é presença garantida nas taças dos brasileiros. A estimativa é que 20 milhões de litros da bebida borbulhante sejam vendidos ao ano no mercado interno, segundo o Instituto Brasileiro do Vinho (Ibravin). Os vinicultores de Santa Catarina já perceberam esse nicho, e pelo menos 520 mil garrafas foram produzidas este ano a partir da última safra, conforme prevê o setor.
Continua depois da publicidade
Os primeiros experimentos com a bebida foram no início dos anos 2000, no meio Oeste. Os produtores do Vale do Rio do Peixe, com o apoio da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina (Epagri) de Videira, elaboraram um espumante de uva Niágara. Sob a orientação do enólogo Jean Pierre Rosier, a ideia era fazer "um vinho nobre de uma uva pobre", relembra Vinícius Caliari, pesquisador em Enologia da Epagri.
A uva Niágara não é da família das uvas viníferas destinadas aos vinhos finos. O resultado foi uma bebida suave e adocicada produzida no método Asti, de fermentação única. A experiência abriu caminho para os moscatéis, hoje bastante conhecidos. Esses espumantes “mais docinhos” costumam ser a porta de entrada para novos apreciadores.
Quase ao mesmo tempo, a cerca de 400 quilômetros dali, as leveduras trabalhavam para que o vinho branco de uva Goethe se transformasse no primeiro espumante dessa uva. Originada a partir do cruzamento de viníferas (87%) com videiras norte-americanas (13%), a Goethe rendeu à Santa Catarina a única indicação de procedência do setor vitivinicultura fora do Rio Grande do Sul.
– Na Serra o processo começou um pouco depois, a vocação tanto ali quanto no Planalto Sul era para o vinho tinto, assim que surgiu. Com a adaptação da Sauvignon Blanc, o apelo se voltou a essa uva, que hoje é bastante plantada. Os espumantes rosés surgiram e partir da utilização das uvas tintas para dar sabor e cor – explica Caliari.
Continua depois da publicidade
Hoje em dia, as três principais regiões produtoras de uva e vinho conseguem entregar no mercado produtos diferenciados e com características únicas. Na avaliação de Eduardo Bassetti, presidente da Associação Vinhos de Altitude – Produtores e Associados, as vinícolas têm apresentado bebidas de qualidade. O que pode agregar ainda mais valor, e apelo ao produto, é encontrar uma identidade para ele.
– As vinícolas ainda buscam um estilo de espumante que faça sentido para a região. Hoje temos com variedade de uva italiana, francesa. O Rio Grande do Sul achou o espaço de qualidade nesse estilo de vinho, e nós estamos indo em uma direção onde o espumante têm crescido – analisa Bassetti.
Parcerias fomentam crescimento do setor
O Meio Oeste é a maior região produtora de uva no Estado, principalmente para consumo in natura. No ano passado foram colhidas 61,2 mil toneladas da fruta em 4,2 mil hectares. O maior volume de uvas processadas para vinho, suco ou espumante se concentra nas cidades de Pinheiro Preto, Videira, Iomerê e Tangará.
Como precursora no ramo de vinhos finos, a região também abriga grandes negócios no setor. A Vinícola Santa Augusta, fundada em 2006, em Videira, vinifica entre 400 mil e 450 mil litros por ano entre os 18 rótulos e as bebidas de terceiros. Da marca própria são sete espumantes, que correspondem a 85% da produção.
Continua depois da publicidade
A vinícola, que surgiu do sonho de dois irmãos, vai encerrar o ano com 80 mil litros da bebida borbulhante espalhadas também pelo Rio Grande do Sul e Paraná. Esse é o foco, trabalhar com um público mais próximo e fiel, cujo paladar aprovou as características do vinho catarinense.
No total, 11 vinícolas do Estado vão produzir 200 mil litros de espumante neste ano com o auxílio da Santa Augusta, que tem capacidade para fazer o beneficiamento de uva para a marca e terceiros. Essas empresas fazem a segunda fermentação do espumante no método Charmat, em autoclaves. A técnica preserva características da bebida.
– O paladar do brasileiro é fresco, clima tropical, acostumado a fruta, paladar mais doce. Também acostumado com o frescor da cerveja, então é muito mais fácil acostumar com o frescor do espumante do que o seco do vinho – analisa Taline Denardi, sócia da empresa.
A sommelier costuma dizer que o espumante é um vinho curinga, que harmoniza desde a entrada até o final de uma refeição. É excelente para a gastronomia, beira de piscina e celebrações, com muita versatilidade.
Continua depois da publicidade
– Ele deixou de ser uma bebida de fim de ano. É aperitivo de entrada, e se e uma festa com música, dança, ele vai a festa toda, não somente com o jantar – completou Eduardo Bassetti, presidente da Associação Vinhos de Altitude – Produtores e Associados.
Na versatilidade, um mercado em expansão
Presente nas taças o ano inteiro, uma das vinícolas que enxergou essa mudança de comportamento em relação ao espumante foi a Abreu Garcia, de Campo Belo do Sul. Quando começou a vinificar, em 2010, a produção era 90% de vinhos tintos e 10% de brancos. Hoje, os números são outros: 60% são espumantes, 30% brancos e rosés e 10% são tintos. Seis dos 16 rótulos da marca são espumantes.
Apesar da mudança no hábito de consumo, o verão ainda é o período onde a bebida é mais consumida. A elaboração da safra atual começou em julho e terminou no mês passado, totalizando 25 mil garrafas. A produção focada nas bebidas borbulhantes corresponde a 50% do que sai da vinícola, e alguns rótulos já começam a receber premiações.
– O espumante é um produto muito versátil. Nosso terroir é propício para a elaboração de grandes espumantes, foi observado um comportamento diferente nas plantas pela altitude. A acidez lembra limonada, não é agressiva em boca, dá jovialidade ao produto e sensação refrescante – avalia o enólogo da vinícola, Leonardo Ferrari.
Continua depois da publicidade
O terroir, palavra francesa bastante utilizada no mundo do vinho, remete às características de solo e clima de uma região. Trata também da contribuição do ser humano no manejo desde os parreirais até a elaboração do produto. São esses elementos, únicos, que tornam cada região produtora, e os respectivos vinhos, especiais.
O que define um espumante?
O vinho espumante é o resultado da fermentação da uva sã, fresca e madura, e que apresenta gás carbônico, as famosas borbulhas. A classificação do espumante está ligada ao método de elaboração e também ao teor de açúcar. A segunda fermentação da bebida pode ser feita no processo Tradicional ou Champenoise, dentro da garrafa, ou nos tanques, no método Charmat.
O espumante Moscatel, produção que mais cresce no Brasil, é feito de maneira diferente. De fermentação única em tanques de pressão, as borbulhas também não podem ser adicionadas, elas se formam naturalmente. Esse trabalho fica por conta das leveduras, que transformam o açúcar em álcool e gás carbônico.
Como funciona a classificação
Espumante Brut: De 6 a 15 gramas de açúcar por litro.
Espumante Demi-Sec: De 20 a 60 gramas de açúcar por litro.
Espumante Doce: Mais de 60 gramas de açúcar por litro.
*Fonte: Instituto Brasileiro do Vinho (Ibravin)