O lugar é um ranchinho, daqueles típicos de filme onde o que prevalece é o aconchego. Nas paredes, o predomínio é do tijolinho à vista. No chão, pisos de cerâmica dão charme ao ambiente. É nesse local, na Ponta Aguda, que quatro amigos se
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reúnem todos os meses para fazer uma bebida alcoólica produzida quando um extrato aquoso de malte e lúpulos é metabolizado por fermentação graças a leveduras. Lá, entre beta-amilases, quebra de enzimas, maltose e sacarificações, o quarteto mantém um hobby que cada vez atrai mais adeptos em Blumenau: fazer cerveja em casa.
Mas calma, não é preciso ser um expert em química, um Walter White do Vale do Itajaí, ou ter que relembrar os tempos de terceirão no Ensino Médio para poder entrar nesse universo. Embora as palavras difíceis citadas acima remetam a tempos de notas baixas, não são lá um bicho de sete cabeças quando colocadas em prática. É em qualquer lugar, desde o cômodo não utilizado de casa até um espaço alternativo, como esse dos amigos Fernando Beckhauser, Vicente Koch, Gustavo Kielwagen e Matheus Grando, que uma mescla de quatro ingredientes pode virar uma cerveja artesanal.
Em Blumenau, o número de cervejeiros caseiros disparou de 10 anos para cá. Passou de pouco mais de 50 em 2012 – período em que o interesse por estilos diferentes de cerveja estava se consolidando no Brasil – para 600 neste ano, um crescimento de 1.200%. O dado vem dos cadastros das lojas da cidade que vendem insumos.
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Alimentado principalmente pela facilidade de acesso a informações, apostilas de estudos, insumos, equipamentos e cursos para tudo quanto é lado, centenas de pessoas passaram a investir no hobby que vem aliado à constatação de que fazer cerveja não é coisa de outro mundo.
– Iniciamos com um encontro para degustar, aí decidimos dar um passo maior e começar a produzir. Hoje fazemos até quatro estilos diferentes de cerveja por mês – conta Beckhauser.
Só para se ter ideia, em cada leva de produção o quarteto engarrafa em média 45 litros. Cada gota vai para consumo próprio ou para comemorações entre amigos.
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– Foi algo que a gente se apaixonou, mesmo. É um universo enorme, que nos prende e nos junta a amigos – finaliza Koch, enquanto, com uma pá cervejeira de polietileno, mexe para lá e para cá o mosto com tom amarronzado que daqui a algumas semanas virará uma Weizenbock – cerveja escura de trigo.
Produção dos caseiros chega a 20 mil litros por mês
Basta ficar alguns minutos de uma sexta-feira em uma loja que vende produtos a amantes do hobby para ter ideia de quantas pessoas produzem cerveja em Blumenau. Entre a busca pelo malte que dará a melhor coloração, o lúpulo que transmitirá o aroma perfeito ou então o amargor ideal para o estilo, cervejeiros artesanais da cidade são responsáveis por uma produção de aproximadamente 20 mil litros por mês. Os dados são do empresário Reginaldo Filippus, proprietário da Vale do Lúpulo, primeiro a explorar a cultura cervejeira como um mercado em Blumenau.
– A região teve um grande salto no número de pessoas que fazem cerveja em 2015, mas eu acredito em um novo boom até o ano que vem. É algo diretamente ligado à economia. Hoje a gente sente que pessoas com menos poder aquisitivo têm interesse em começar a produzir, o que é muito bacana – explica.
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Do entretenimento ao custo-benefício
Até 10 anos atrás fazer cerveja em Blumenau não era tarefa fácil. Quem tinha a empolgação para aprender esbarrava na dificuldade para comprar equipamentos e insumos. Já aqueles com condição de adquirir pela internet tropicavam em dificuldades e dúvidas que surgem na produção. Hoje isso mudou.
Com pelo menos três lojas vendendo desde a matéria-prima até os apetrechos necessários, ficou mais fácil – e barato – produzir. O mesmo vale para cursos: são pelo menos 15 por mês na região e ensinam a arte de fazer cerveja em panela.
Mas o que leva as pessoas a fazer bebida e não comprá-la? Para uns, é o contexto que mais lembra uma confraria: pessoas com interesses em comum se reunindo para falar sobre – e, no caso da cerveja, bebê-la e fazê-la.
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– A gente se reúne uma, duas vezes por mês entre amigos para beber uma cerveja boa, bater um bom papo, fazer um rango. É um entretenimento, para fortalecer a amizade – conta Edson Oechsler, que tem um pub particular às margens da Rua Bahia, onde ele e amigos degustam a produção caseira.
Para outros, o que vale – além de poder dizer aos amigos “fui eu que fiz” – é a relação custo-benefício. Uma produção de 40 litros de uma Weizen (de trigo), englobando insumos e garrafas, gira em torno de R$ 200 – custo de R$ 2,50 por ampola. Se você conseguir os cascos em doação – o que é comum em comunidades cervejeiras pela região – a leva fica ainda mais barata: chega a R$ 1,50 em um recipiente de 500ml. Aí basta somar a despesa com gás e energia para chegar ao valor final.
Essa é a ideia de Eduardo Chiminelli Puhlmann, que se importa com a qualidade do que produz, é claro, mas muito mais com a economia que terá:
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– Consigo fazer algo que gosto e aprecio e ao mesmo tempo ter economia até em comparação às cervejas populares – conta.