Lei de Ordenamento Territorial, terceirização das contratações de profissionais da saúde, reforma administrativa. São apenas três temas entre os vários que levaram a Prefeitura de Joinville a sofrer diversos reveses na Justiça nos últimos anos, com ações e liminares que impedem que o município coloque em prática as propostas que têm para a cidade.

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O próprio prefeito Udo Döhler (PMDB) não esconde a sua insatisfação. Diante de sucessivas derrotas, ele queixa-se da judicialização de questões que considera fundamentais para o andamento do seu governo. Deixa nas entrelinhas que, pelo menos em sua administração, nada sai do papel sem que haja uma disputa no Judiciário.

– Se este é o modelo que querem, entregue-se a gestão do município a outra esfera – disse Udo, em entrevista concedida ao colunista de economia de “AN”, Claudio Loetz, na última semana.

A judicialização de ações de governo não ocorre exclusivamente em Joinville. Para citar dois casos recentes no cenário nacional, o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), sofreu no final do ano passado uma amarga derrota e teve de desistir do reajuste do IPTU na maior cidade do País. O processo, movido pelo empresariado local, chegou até o Supremo Tribunal Federal (STF).

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De acordo com o jurista Luiz Ernesto Prado, diante deste cenário, os administradores municipais precisam trabalhar com mais força na prevenção de situações como esta.

– Os administradores atuais, em todas as esferas de governo, precisam ter habilidades para mobilizar, convencer e prevenir situações extremas. A judicialização da política está posta. É mais uma arma da democracia – afirma Prado.

Segundo o advogado Marcelo Harger, que atua em Joinville e trabalha na área de direito administrativo, é preciso entender a dimensão histórica da judicialização da política.

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– Em um primeiro momento, não se admitia a interferência do Judiciário em atos administrativos. Mas o direito não é uma coisa estática. O próprio Judiciário, que recusava essa interferência, hoje passou a analisar não só as questões de legalidade, mas outros pontos de vista – explica.

Procurado pela reportagem, o procurador do município, Eduardo Buzzi, preferiu não se manifestar sobre o assunto.

Sete das principais ações do governo Udo foram judicializadas. Confira:

REFORMA ADMINISTRATIVA

Uma das mais recentes decisões diz respeito à tentativa de fazer mudanças nos cargos, funções e na estrutura do governo. No fim de março, uma liminar suspendeu a reforma administrativa na Prefeitura de Joinville, a pedido do vereador Maycon César, da oposição. A lei sequer chegou a ser publicada no Jornal do Município. A decisão determinou que a Comissão de Finanças da Câmara analise o projeto do Executivo. Entre as mudanças previstas na reforma estão a criação da Secretaria de Serviços Públicos e a transformação de alguns órgãos, como a Fundema e o Ittran. A alegação de Maycon foi de que o regime interno da Câmara e a Lei Orgânica de Joinville foram descumpridas porque o projeto da reforma não passou por todas as comissões. No próximo dia 22 de maio, uma audiência pública será realizada para tentar avançar com as propostas. A principal motivação é a polêmica envolvendo a emenda do vereador James Schroeder (PDT), que reivindica a Fundação Municipal do Meio Ambiente (Fundema) como subordinada à Secretaria de Serviços Públicos. Para ele, a emenda garante a autonomia do órgão.

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ZONA AZUL

Uma série de liminares, especialmente no começo do ano passado, fez com que a Zona Azul se transformasse num impasse permanente do governo Udo Döhler. Em junho do ano passado, ficou bastante claro que o impasse iria continuar. A Justiça atendeu ao pedido da Dom Parking e determinou que a empresa fosse avaliada dentro da licitação que havia na época. A Prefeitura suspendeu tudo e resolveu adotar um novo processo. O prefeito considera o sistema importante para disciplinar as vagas, admite que pode ter havido problemas para estacionar, mas nega que tenha se transformado no “grande problema” da cidade. Não há uma previsão de quando seja possível colocar o estacionamento rotativo em prática novamente na cidade.

LEI DE ORDENAMENTO TERRITORIAL

É um dos temas mais judicializados dos últimos governos em Joinville. Desde a criação do Conselho da Cidade, as discussões se dividem entre gabinetes, auditórios e ações na Justiça. Em abril de 2013, um grupo de associações de moradores, cidadãos, estudantes e profissionais liberais entrou com um processo contra a Prefeitura de Joinville e o Ippuj para anular a Conferência da Cidade, que foi realizada no dia 18 de maio do mesmo ano. A ação questionava uma série de métodos adotados para o critério de votação. O principal era a suposta falta de isonomia que havia no fato de que os eleitores cidadãos só podiam votar no segmento de associações de moradores, mas não teriam os seus votos válidos para outras categorias, como entidades empresariais, ONGs e instituições de ensino superior. Em maio, a Justiça determinou que fossem contabilizados os votos dos cidadãos-eleitores em separado, o que criou duas listas. Uma delas acabou descartada. No fim do ano passado, a Prefeitura suspendeu as reuniões.

MÁQUINAS PARADAS

Dezenas de máquinas paradas no pátio da Prefeitura, algumas há mais de dois anos, dão um outro tom às disputas judiciais. Mais do que o “andamento” dos trabalhos, é a população que sai perdendo. A contratação dos serviços de empresas terceirizadas está parada porque a licitação enfrenta contestações judiciais abertas por uma das empresas concorrentes no processo. O caso já foi parar no Tribunal de Justiça, que deve julgar um novo recurso nos próximos dias.

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SAÚDE PÚBLICA

Embora os problemas da saúde pública de Joinville sejam acompanhados pelos ministérios públicos Federal e Estadual há anos, foi no começo de 2014 que a situação ganhou contorno de conflito. Em março, após uma série de descumprimentos de acordos e decisões por parte da Prefeitura, o então secretário de Saúde, Armando Dias, foi afastado do cargo pela Justiça.

Desde 2010, o MP vem apresentando dezenas de ações exigindo fim da demanda reprimida em consultas, exames e cirurgias em várias especialidades. Em parte das ações, a cobrança também vai para o governo do Estado. Na maioria dos casos, a Justiça pede a elaboração de planos para acabar com a fila em determinado prazo. Se a medida não é cumprida, a Justiça tem determinado até bloqueio de contas na Prefeitura no valor estimado para custear o pagamento dos procedimentos. Na última semana, o projeto que previa a contratação de médicos terceirizados para acabar com as filas foi suspenso pela Justiça do Trabalho.

RADARES FIXOS E MÓVEIS

Foi um escândalo nacional que colocou em xeque todo o sistema de radares no País. Após uma reportagem no Fantástico, da Rede Globo, em 2012, que denunciou fraudes em licitações de radares em todo o país, a Justiça catarinense e o TCE investigam editais e contratos em andamento de 29 municípios. O de Joinville estava entre eles. Em setembro de 2013, as lombadas e os radares foram desligados no município e, desde então, não foram mais acionados. Não havia mais como prorrogar o contrato de forma emergencial. Quando o TCE determinou a suspensão da licitação aberta em 2012 devido à suspeita de irregularidades no edital, o valor máximo estimado era de R$ 23,9 milhões para 100 radares em dois anos e meio. Não há uma data para a volta.

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ILUMINAÇÃO PÚBLICA

O caso da licitação para a manutenção da iluminação pública é o maior exemplo de como os processos administrativos também estão se transformando em longos e demorados embates jurídicos. Por enquanto, os questionamentos estão na esfera administrativa, mas é pouco provável que não haja também uma disputa judicial. Hoje, há 4 mil lâmpadas apagadas ou danificadas – precisam ser substituídas ou arrumadas com urgência. Ao todo, são 54 mil. Se houver recurso na Justiça, a Prefeitura será obrigada a assinar contrato emergencial, como já ocorreu na última licitação. O contrato atual está em fase final de vigência e a Prefeitura não tem como emitir novas ordens de serviço para as ações.