O curso de direito na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) pretende agora chegar ao ano de seu centenário, em 2032, com total acessibilidade a pessoas com deficiência. A meta do centro de ciências jurídicas se trata do legado de uma estudante: Vera Rejane Veleda Machado da Roza, que, aos 54 anos, se tornou a primeira aluna cega a defender um trabalho de conclusão de curso (TCC) em direito na instituição.

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A defesa ocorreu no último dia 22. Aprovada pela banca avaliadora, Vera propôs mudanças na acessibilidade do curso com o trabalho “Direito à educação inclusiva e a acessibilidade a partir da experiência do Curso de Graduação em Direito da UFSC”, baseado em sua própria vivência, que pretende abrir caminhos para novos universitários com condições e necessidades particulares.

— Sou uma mulher totalmente fora dos padrões do curso de direito. Vivi momentos muito difíceis, complicados, que exigiram um desdobramento enorme da minha parte — disse a estudante a uma publicação da UFSC.

Em um primeiro momento de sua vida universitária, Roza diz que encontrou pouco acolhimento de colegas de turma e dificuldades na rotina. Foi quando contou com ajuda da Associação Catarinense para Integração do Cego (Acic). Com o tempo, ela reconhece que passou a haver uma mobilização para que fosse inclusa no curso.

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— Não havia, até então, um caso que nos mostrasse o que devia ser feito, mas ela veio com a proposta — disse, também em entrevista a uma publicação da UFSC, o professor José Isaac Pilati, que é diretor do centro de ciências jurídicas e firmou o compromisso de adotar medidas propostas pela estudante em seu TCC.

Ao longo do curso, que é conhecido por exigir bastante leitura, Vera precisou, por exemplo, enviar cartas a cada professor das disciplinas em que se matriculava antes de cursá-las, para expor suas condições e ter acesso prévio ao material que seria estudado. Ela fazia isso para que um serviço de acessibilidade da Biblioteca Universitária pudesse adaptar textos da bibliografia a um software que faz a leitura para a aluna.

— É um trabalho técnico, bem importante e bem demorado. Minhas disciplinas têm demanda de leitura bem grande e essa é uma etapa essencial — disse Vera.

Uma iniciativa de uma outra estudante da universidade, a graduanda Maria de Fátima Medeiros e Silva, do curso de Letras- Português, também foi fundamental: o Projeto Releituras, que produz audiolivros para alunos cegos ou com baixa visão.

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Vera Roza perdeu a visão aos 48, seis anos depois de ter superado um câncer de mama. Antes de chegar ao curso de direito, ela já era formada em pedagogia e especializada em gestão escolar. O início da trajetória acadêmica também precisou superar uma espera de longos anos, já que ela vivia antes no interior, onde não tinha acesso a uma universidade, e optou por criar os filhos.

Com o TCC já aprovado, ela ainda terá que cursar mais algumas disciplinas até se formar, o que está previsto para o ano que vem. Até lá, a estudante já se prepara para o exame da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e alimenta um outro sonho: se tornar juíza.

— Vou me formar com a idade que muitos estão se aposentando e com carreira já consolidada. Eu não me imagino como uma pessoa inválida, por isso eu não digo que eu gostaria de ser. Eu digo que eu serei.

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