O presidente da Colômbia, Juan Manuel Santos, anunciou nesta quarta-feira, em Havana, ter acordado com o líder das Farc, Timoleón Jiménez, a assinatura de um acordo final de paz “no mais tardar em seis meses”, após as duas partes vencerem um importante obstáculo nas negociações de paz.

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“O chefe do secretariado das Farc e eu acordamos que, no mais tardar em seis meses, seis meses, esta negociação deve ser concluída e um acordo final [de paz], assinado”, disse Santos na presença de Jiménez e do presidente cubano, Raúl Castro.

“Não vai ser uma tarefa fácil porque faltam muitos pontos difíceis para acordar, mas esta é a instrução que demos às nossas delegações”, disse o presidente colombiano, que fez uma escala em Havana para assistir à assinatura de um acordo de criação de “uma jurisdição especial para a paz”.

Logo após o anúncio, a promotoria da Colômbia anunciou a suspensão dos processos contra membros da cúpula das Farc por “graves violações dos direitos humanos”.

“Em virtude deste acordo em matéria de justiça transicional, dei instruções muito precisas para que se suspendam todas as ações que estavam programadas contra a cúpula das Farc (…) por graves violações dos direitos humanos”, disse o promotor-geral, Eduardo Montealegre.

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O secretário americano de Estado, John Kerry, saudou o “progresso histórico” na direção do acordo de paz entre Colômbia e as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), a maior guerrilha do país.

“Os anúncios realizados hoje sobre as conversações de paz em Havana representam um progresso histórico em direção a um acordo final de paz que acabe com mais de 50 anos de conflito armado”, assinalou Kerry em um comunicado.

“A paz está agora mais próxima para o povo colombiano e para milhões de vítimas do conflito”, acrescentou.

“Estamos esperançosos de que as partes concluam em breve um acordo final para encerrar esta guerra terrível. O povo colombiano merece uma paz justa e duradoura e esta será a sua vitória”, disse o chefe da diplomacia americana.

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Santos fez uma viagem surpresa a Havana, onde as negociações são celebradas.

Esta foi a primeira vez que ele apareceu nas negociações que ele pôs em andamento há quase três anos, em cujo sucesso apostou sua presidência.

Também foi a primeira vez que se encontrou frente a frente com Timoshenko, a quem deu um aperto de mãos após o acordo assinado.

As negociações em Havana, iniciadas em novembro de 2012, tinham empacado na espinhosa questão de se os guerrilheiros deveriam ser condenados à prisão por sequestros, o uso de soldados crianças, tráfico de cocaína e outros crimes.

As Farc começarão a se desarmar 60 dias depois da assinatura do acordo final para se tornar movimento político.

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O acordo sobre justiça “sem dúvida vai gerar um clima propício para avançar sobre convênios na temática restante da agenda” de paz, declarou Timochenko.

Ele disse, ainda, que este novo sistema de justiça foi projetado “para todos os envolvidos no conflito (….) e não só para uma das partes”, e “abre possibilidades de oferecer verdade detalhada e plena” sobre o conflito armado, que deixou 220 mil mortos e seis milhões de deslocados, segundo cifras oficiais.

Acordo pós-conflito

O comunicado conjunto das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia e do governo de Santos divulgado nesta quarta-feira prevê a forma como será aplicada a justiça quando o conflito armado de mais de meio século for encerrado.

As duas partes acordaram uma “ampla anistia” após o fim do conflito, excluindo da mesma os crimes contra a humanidade.

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Segundo o texto do acordo, “o Estado colombiano outorgará a anistia mais ampla possível a delitos políticos e correlatos (…) Em todo caso, não serão objeto de anistia ou indulto as condutas tipificadas na legislação nacional que correspondam a crimes contra a humanidade, o genocídio e os graves crimes de guerra, entre outros delitos graves, como a tomada de reféns ou outra privação grave da liberdade, a tortura, o deslocamento forçado, o desaparecimento forçado, as execuções extrajudiciais e a violência sexual”.

A jurisdição especial contará com salas de justiça e um tribunal para a paz.

O governo colombiano e as Farc já realizaram negociações de paz anteriormente, a última no fim dos anos 1990 e começo dos 2000, mas terminaram em fracasso e as hostilidades foram retomadas.

Até agora, as partes acertaram três dos seis pontos da agenda e nos últimos ciclos de diálogo (41 foram celebrados até agora) vinham discutindo a reparação às vítimas, que inclui o tema da justiça, enquanto uma subcomissão conjunta preparava paralelamente planos para um cessar-fogo definitivo.

Desde julho vigora na Colômbia uma trégua unilateral das Farc e o presidente Santos determinou a suspensão de bombardeios contra posições rebeldes.

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As duas partes encerraram o tema da reforma agrária (maio de 2013), participação política (novembro de 2013) e das drogas ilícitas (maio 2014). Além disso, acertaram em março deste ano um programa de retirada de minas e, em abril, a formação de uma Comissão da Verdade.

Apelo papal pela paz

No passado, Santos, de 64 anos, conduziu uma dura operação contra as Farc quando foi ministro da Defesa.

Mas ele mudou de postura ao assumir a Presidência, em 2010, e ao ser reeleito no ano passado ao prometer avançar no processo de paz que iniciou.

O feito histórico se segue à visita a Cuba do papa Francisco, que alertou no domingo que a Colômbia não poderia suportar “mais um fracasso nos diálogos de paz” e pediu “uma reconciliação definitiva”.

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Depois de décadas, o conflito colombiano arrastou não apenas tropas oficiais e vários grupos guerrilheiros de esquerda, mas também paramilitares de direita – atualmente banidos oficialmente – e traficantes de drogas.

Maior guerrilha de esquerda ainda ativa na Colômbia, as Farc têm 7.000 combatentes, segundo estimativas.

O outro grupo rebelde remanescente, o Exército de Libertação Nacional (ELN), tem cerca de 2.500.

O ELN e o governo iniciaram conversas “exploratórias” em janeiro de 2014, mas ainda não abriram um processo de paz formal.

* AFP