A prefeitura de Imbituba, no Sul de Santa Catarina, chamou de “rápida e eficiente” a ação da Polícia Militar denunciada como racismo pela família do adolescente de 16 anos retirado de um ônibus escolar do município. A afirmação foi feita em nota (íntegra abaixo) divulgada nesta terça-feira (9). O menino voltava do estágio quando foi abordado e recebeu um mata-leão. As informações são do g1 SC

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A Secretaria de Educação Cultura e Esporte disse que o texto foi escrito “no sentido de agradecer o pronto atendimento e o cuidado com a segurança das crianças”. Questionada sobre ter retirado e prendido o menino negro, que não estava envolvido na ação, a pasta informou que a “Justiça e o Ministério Público irão avaliar a situação”.

Luka França, que faz parte do o Núcleo de Pesquisa Direito e Descolonização da Universidade São Judas Tadeu, pontua que questões de raça estruturam relações institucionais, econômicas e sociais.

— Quando a gente vê um caso de violência policial contra um rapaz negro que nada tinha a ver com o caso, a gente verifica que, pelo fato de entrar no esteriótipo negro, é visto como criminoso e já é alvo da violência policial — contextualizou.

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O advogado da família do adolescente, o defensor Paulo Marcos da Silva, afirmou que, além de desproporcional, a ação foi motivada por racismo, pois ele era a única pessoa negra dentro do ônibus. A PM disse que vai abrir sindicância para apurar o caso e rechaça a acusação de discriminação.

Racismo é crime segundo o Código Penal brasileiro. Ele é definido pela praticar, induzir ou incitação a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. O crime prevê pena de um a três anos de reclusão e multa.

A prefeitura acrescentou que a confusão começou quando outros dois adolescentes teriam feito ameaças já dentro do ônibus. Nenhum deles era o rapaz negro imobilizado pela PM, informaram a gestão municipal e a própria Polícia Militar.

Entenda o caso

De acordo com a prefeitura, no dia da ocorrência, por volta das 12h30min, dois jovens, que não são alunos da rede municipal ou estadual, teriam tentado entrar no ônibus na altura do bairro Vila Nova.

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Às 17h30min, o servidor foi a uma unidade de ensino e encontrou os dois adolescentes que teriam batido no ônibus mais cedo. Além deles, estava o rapaz que foi imobilizado pela PM. Segundo a prefeitura, o adolescente negro teria entrado no ônibus de carona. A família afirma que ele fazia esse trajeto com o veículo com frequência.

No interior do ônibus, ainda segundo a prefeitura, os dois adolescentes da primeira ocorrência teriam feito ameaças ao monitor do veículo e afirmaram estar com uma arma de fogo. Depois das ameaças e da recusa para descer do veículo, a Polícia Militar foi acionada.

Segundo a PM, pessoas dentro do veículo teriam descrito que um dos adolescentes envolvidos nas ameaças usava um moletom preto. Nas imagens, é possível ver os militares se aproximando do rapaz negro, que estava de moletom branco, e de outro adolescente de moletom preto.

No vídeo, o adolescente que faz estágio na prefeitura está de pé e diz aos policiais que não havia feito nada. “Bota a mão pra trás”, diz um policial. Num determinado trecho, ele se senta novamente e um policial militar, então, o manda levantar e retira o jovem do veículo.

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Em seguida, o adolescente é imobilizado com um “mata-leão”. O outro jovem que estaria envolvido nas ameaças também foi rendido por outro PM.

Já o outro adolescente que teria participado das ameaças, não aparece no trecho das imagens divulgadas. A Polícia Militar informou, no entanto, que os três adolescentes, dois envolvidos e o estagiário negro, foram conduzidos a delegacia.

Família de adolescente foi agredida na delegacia, diz advogado

O advogado Paulo Marcos da Silva informou que o adolescente negro foi algemado e levado a uma delegacia. A família teria ido ao local e afirmou ter sido desrespeitada. Segundo a denúncia do defensor, o pai também teria sido imobilizado e algemado. Devido a essa agressão dentro da delegacia, a família fez um boletim de ocorrências.

De acordo com a nota da prefeitura de Imbituba, o estagiário foi levado à delegacia por desacatar os policiais. No vídeo que mostra parte da ocorrência, o adolescente afirma, repetidas vezes, que estava voltando do trabalho.

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Após o vídeo ser divulgado nas redes sociais, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SC) publicou uma nota repudiando a ação da PM. Na nota, a OAB afirma que acompanha as investigações “visando à punição dos envolvidos e o necessário amparo ao cidadão vítima do ato racista”.

A PM também se manifestou e disse “rechaçar qualquer tipo de discriminação” e que “utiliza de todos os protocolos para a identificação dos suspeitos e para a resolução da ocorrência”. Na nota, a PM afirma que os menores foram apreendidos por ameaça, desobediência e desacato.

Assista ao vídeo da agressão

Notas na íntegra

O que disse a Prefeitura de Imbituba

“Segundo a Secretaria Municipal de Educação, Cultura e Esporte (SEDUCE), no último dia 03 de agosto, dois adolescentes, que não são alunos da rede municipal ou estadual de ensino, tentaram entrar no ônibus escolar da Prefeitura de Imbituba, por volta de 12h30, na altura do bairro de Vila Nova Alvorada (Divineia).

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Por não estarem portando a carteirinha de estudante, eles foram impedidos de entrar no veículo. Diante do fato, os menores de idade efetuaram chutes e socos no ônibus, deixando cerca de 40 crianças assustadas.

O motorista, então, seguiu viajem até o destino, a Escola de Educação Básico Henrique Lage, no Centro de Imbituba. Após deixar os estudantes no local, o condutor se dirigiu até a sede da Secretaria Municipal de Educação, Cultura e Esporte e registrou um boletim de ocorrência on-line.

Por volta de 17h30, o motorista retornou à escola Henrique Lage para buscar os alunos. No local, ele foi surpreendido, novamente, pelos dois jovens. Desta vez, os rapazes estavam acompanhados de um terceiro adolescente, este estagiário da prefeitura, que entrou no veículo para pedir uma carona.

No interior do ônibus, a dupla fez ameaças ao monitor, alegando estarem portando uma arma de fogo. Após as ameaças e a recusa em a descer do veículo, a Polícia Militar foi acionada.

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A partir desse momento, toda a ação relacionada aos adolescentes foi conduzida pela PM, no intuito de proteger as crianças que estavam no veículo.

Ainda segundo a SEDUCE, os jovens foram conduzidos à delegacia, inclusive, o terceiro rapaz, que não estava envolvido no caso, mas, que teria desacatado os policiais.

A Secretaria de Educação Cultura e Esporte esclarece que é de responsabilidade das escolas encaminharem a lista atualizada dos alunos e a veracidade das informações contidas na mesma. A SEDUCE agradece ao 34º Batalhão de Polícia Militar de Imbituba pela rápida e eficiente ação, zelando pela segurança dos alunos.”

O que disse a PM

A Polícia Militar de Santa Catarina, através do 34º BPM, a respeito de ocorrência do dia 03 de agosto de 2022, em Imbituba, vem esclarecer que:

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1. Policiais do 34º BPM foram acionados para atender uma ocorrência onde alguns adolescentes estariam no interior de um ônibus escolar ameaçando o motorista e o monitor afirmando que os mesmos estariam armados;

2. No relato, as ameaças começaram quando o motorista e o monitor do ônibus escolar pediram para que os adolescentes mostrassem as carteiras de estudantes ao entrarem no ônibus, porém um dos adolescentes disse que não era estudante e iria pegar uma carona e outros dois se negaram a mostrar o documento solicitado. Diante das ameaças, o motorista parou o ônibus em frente à Secretaria Municipal de Educação e informou a situação acionando a Polícia Militar;

3. Quando os policiais chegaram ao local, as vítimas, ao descreverem os adolescentes que estavam causando o transtorno, apontaram como um dos suspeitos um rapaz que estava usando um agasalho de cor preta. “Foi o de preto”, afirmou uma das vítimas. Nesse momento um dos policiais pergunta: “Esse aqui de preto?”, aproximando-se do suspeito, reconhecido pelas vítimas que estavam no interior do ônibus.

4. A Polícia Militar de Santa Catarina rechaça qualquer tipo de discriminação e utiliza de todos os protocolos para a identificação dos suspeitos e para a resolução da ocorrência;

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5. Os adolescentes foram apreendidos por ameaça, desobediência e desacato e encaminhados à Delegacia de Polícia Civil para realização dos procedimentos cabíveis.

6. A Polícia Militar de Santa Catarina e o comando do 34º BPM trabalha para preservar a ordem e proteger a vida e sempre preservou pela observância total dos protocolos operacionais.

O que disse o MPSC

“Quanto aos fatos, a 2ª Promotoria de Justiça de Imbituba tem a informar que, tão logo o Ministério Público tomou conhecimento dos fatos, instaurou-se um procedimento para apuração da conduta dos policiais, tendo realizado a oitiva do adolescente no dia 5-8-2022 e encaminhado pedidos de diligências aos órgãos públicos envolvidos. Foram solicitadas à Polícia Militar, à Polícia Civil e à Secretaria de Educação do município imagens de câmeras de segurança que possam ter registrado os fatos. Além disso, houve remessa de cópias à 1ª Promotoria de Justiça de Imbituba, em razão da sua atribuição em matéria de infância e juventude.”

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