O Ministério Público deu prazo de dez dias para a Prefeitura de Barra Velha informar a qualificação acadêmica e profissional da primeira-dama, Soneiva Cruz, nomeada como secretária de assistência social em janeiro de 2017 pelo marido e prefeito Valter Zimmermann (DEM). Um inquérito civil foi instaurado em setembro do ano passado pelo promotor Gláucio José Souza Alberton, da 2ª Promotoria de Justiça, para apurar denúncias de nepotismo na nomeação.

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Soneiva tem um salário de R$ 7,5 mil mensais e foi nomeada para o cargo na gestão municipal atual, logo após a posse do marido. A Lei Orgânica de Barra Velha prevê que “as nomeações para as funções e/ou cargos em comissão ou de confiança não podem incidir em pessoa que tenha parentesco, afim ou co-sanguíneo, até o terceiro grau com o prefeito, vice-prefeito e vereadores (…)”. O texto ainda diz que se houver uma nomeação dessa natureza, ela deverá ser anulada.

A própria secretária publicou um vídeo em uma rede social reconhecendo que, segundo a Lei Orgânica, ela não poderia ter sido nomeada para o cargo. No pedido do MP para apresentação da qualificação acadêmica e profissional de Soneiva, o promotor destaca que a primeira-dama “não possui qualificação técnica para o cargo, situação que é confirmada por ela própria em um vídeo (..)”.

Nas imagens, ela afirma que quando foi designada ao cargo não conhecia nada da pasta, mas que gostava de trabalhar com pessoas por ter experiência no atendimento ao público em hospitais. A secretária ainda diz que levou pessoas com experiência na área para trabalhar na Assistência Social e ensiná-la.

— No mesmo semestre em que comecei, eu vi que precisava saber do que eu estava falando (…). Eu queria ter também o olhar técnico e não só a de Sol, primeira-dama. Eu comecei a fazer faculdade e já fiz um ano de assistência social. (…) — diz no vídeo, que foi apagado das redes sociais posteriormente.

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A polêmica sobre a nomeação de Soneiva ganhou mais força há cerca de um mês, quando o prefeito enviou um projeto de emenda à lei orgânica para a Câmara de Vereadores pedindo que a restrição na contratação de pessoas com parentesco não inclua a posição de secretário, que considera um cargo político. A mudança teve primeira votação em 12 de junho, com seis votos a favor e três contra. A segunda votação ainda não tem data agendada.

CONTRAPONTO

Segundo a Prefeitura de Barra Velha, via departamento de comunicação, o projeto é respaldado pelo Supremo Tribunal Federal (STF). A Súmula Vinculante 13 (um enunciado que traduz o entendimento consagrado do Tribunal em causas similares) diz, em resumo, que é nepotismo a nomeação de cônjuge, companheiro ou parente até terceiro grau para cargo comissionado ou de confiança e para funções gratificadas. De acordo com a Prefeitura, o projeto de emenda não será retirado e Soneiva permanece no cargo.

STF vai decidir sobre nomeações

Como a Súmula Vinculante 13 não fala em cargo político, o próprio Supremo Tribunal Federal reconheceu que o texto deixa margem para dúvidas. Como há outros casos semelhantes ao de Barra Velha pelo país, o assunto teve repercussão geral reconhecida, por unanimidade, no plenário da Corte. Haverá discussão para julgamento do mérito, quando os ministros vão definir se a proibição ao nepotismo alcança também a nomeação para cargos políticos. A votação ainda não tem data prevista para ocorrer.

— Ao não diferenciar cargos políticos de cargos estritamente administrativos, a literalidade da súmula vinculante sugere que resta proibido o nepotismo em todas as situações – afirmou o ministro Luiz Fux, relator da matéria.

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Fux afirmou que, em decisões anteriores do STF, o Supremo tem entendido ser necessário analisar caso a caso, com a ausência de qualificação técnica dos nomeados como um indicativo de fraude à lei. Ele ainda diz que a indefinição sobre o assunto tem gerado uma insegurança jurídica.

— Tanto o administrado quanto o Poder Público desconhecem a real legitimidade de diversas nomeações a cargos públicos até que haja um pronunciamento definitivo do Poder Judiciário — analisou.

Em outros casos da região, os prefeitos também tentaram recorrer à Súmula Vinculante 13:

JARAGUÁ DO SUL

A ex-prefeita Cecília Konell foi condenada duas vezes por nepotismo em decisões em primeira instância publicadas em 2016. Em janeiro de 2009 ela nomeou a irmã, Carmelita, que era funcionária pública concursada como digitadora, para a função gratificada de supervisora da Biblioteca Pública e, logo depois, para o cargo de supervisora de patrimônio arquitetônico. Além de não possuir qualificação profissional para o último cargo, Carmelita nunca chegou a exercer nenhum dos dois, já que estava à disposição da 2ª Vara Cível no mesmo período. A sentença foi de cinco anos de prisão em regime inicialmente aberto e proibiu Cecília de ocupar cargo público pelo mesmo período. Ela ainda foi condenada à pena de dez meses e 15 dias de detenção, em regime aberto, por ter nomeado a filha, Fedra, para os cargos de chefe de gabinete e de secretária de administração; e o marido, Ivo Konell, para o cargo de secretário de administração e da fazenda. As contratações foram feitas entre 2009 e 2012 e a sentença foi substituída por prestação de serviços à comunidade.

MAFRA

Em 2015, a Justiça determinou a perda da função pública do prefeito Roberto Scholze, de Mafra, por improbidade administrativa. Ele teria nomeado a mãe Valnete dos Santos como secretária municipal da criança e ação social, além de empregar a madrasta Wilmara Herzer como secretária municipal do programa Bolsa Família. O caso aconteceu em 2013. A sentença determinou também o ressarcimento dos valores aos servidores, decretou a perda dos direitos políticos por três anos, aplicou multa e ainda definiu como nulos os atos do prefeito.

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