Prefeito eleito de Passos Maia, no Oeste de Santa Catarina, Nei Nervis (PT) é integrante do Movimento Sem Terra (MST) e possui uma história simbólica de envolvimento na política. Membro de uma família moradora de um assentamento, Nervis foi eleito prefeito na eleição do dia 6 deste mês com 54,2% dos votos válidos. Para o governo, planeja ações para incentivar pequenos agricultores do município.
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Nei, na verdade, chama-se Neimar Luiz Nervis e tem 37 anos. Venceu a corrida pela prefeitura logo na primeira vez que disputou o cargo. Antes disso, foi eleito vereador na eleição de 2020, a única da qual ele havia participado até este ano.
A família, porém, tem experiência política mais extensa. O pai, Norino Nervis, foi vice-prefeito da cidade por duas vezes, entre 2005 e 2011. Tinha o nome cogitado para concorrer a prefeito nas eleições de 2012, mas morreu um ano antes, aos 50 anos, em junho de 2011.
Nei na época não tinha pretensões políticas, mas nos anos seguintes passou a receber apelos de companheiros do MST e da cidade para dar sequência ao legado do pai. Aceitou o desafio e neste ano comemorou o triunfo nas urnas.
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Ele conta que guardou um terno e uma gravata do pai após a morte dele, e que agora pretende usá-los na cerimônia de posse. Uma forma de homenagear Norino, que inspirou sua luta política.
— Dia 1º de janeiro quero assumir com a roupa dele em homenagem a ele e aos amigos dele aqui do município — conta Nei, que diz desejar dar sequência ao legado do pai no município.
Passos Maia é uma cidade com 4 mil habitantes, segundo o Censo 2022, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A economia é baseada na agropecuária e em serviços. Grande parte da população é de assentados.
A família nasceu em Galvão, cidade a 120 quilômetros de Passos Maia, mas se mudou para um acampamento do MST quando Nei ainda era jovem. A fazenda com áreas improdutivas, que havia sido invadida pelos sem-terra, foi adquirida pelo governo federal e repassada às famílias acampadas, que criaram o assentamento. A luta junto aos sem-terra fez do pai uma liderança na cidade.
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A mãe de Nei chegou a se eleger vereadora em 2012. Oito anos depois, em 2020, foi a vez de Nei atender a pedidos de colegas e da cidade para concorrer como vereador. Eleito como o mais votado da coligação, tornou-se presidente da Câmara e nome do Partido dos Trabalhadores para disputar a prefeitura este ano. Elegeu-se com apoio de PP, União Brasil, PSB e PSD. O PL, arquirrival dos petistas no cenário nacional, não apoiou ninguém e manteve-se neutro.
Veja fotos do prefeito eleito de Passos Maia
Discriminação com movimento foi superada
Nei ainda mora no assentamento, mas ao longo dos anos a família comprou mais terras na região. Hoje, cultivam soja em uma área de 300 hectares, sendo 150 deles e 150 arrendados, com uma produção de 20 mil sacas ao ano.
Em Passos Maia, o prefeito eleito afirma que a relação da cidade com o MST passa longe da rejeição observada em outras regiões. Segundo ele, os assentamentos levaram um crescimento econômico à cidade, que teria mudado a visão dos moradores sobre as ocupações sem-terra. Segundo ele, apenas um assentado produziria hoje mais do que a fazenda antes da presença do MST.
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— O município cresceu muito com os assentados. Hoje aqui o assentamento é uma potência, tem produtor de leite que movimenta R$ 500 mil no mês. Tem várias famílias que movimentam de R$ 100 mil a R$ 180 mil por mês. Conseguiram manter de pé o município, então hoje aqui não tem mais aquela discriminação que a gente tinha no começo por ser assentado. A gente sofreu muito, mas agora as pessoas olham com um outro olhar — conta.
Apesar da liderança exercida entre o grupo do MST, Nei faz questão de ressaltar que a candidatura teve adesão também de outros setores da cidade. No comércio, nos bancos e nos postos de combustíveis, por exemplo, onde são feitos negócios com os agricultores, ele também conseguiu apoio dos empresários.
— Eu ganhei em todas as urnas dentro da cidade, então não foi que a gente ganhou só nos assentamentos a eleição — defende.
O prefeito eleito conta que é amigo do dono da fazenda que foi comprada para montar o assentamento dos integrantes do MST, e que teve o apoio dele como eleitor nas eleições. Nei inclusive planta em terras arrendadas por ele junto ao antigo proprietário das terras.
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— Você ver uma pessoa tão grande, que tem tantas fazendas fora do município, do Estado e estar aqui apoiando, falando que o certo seria eu ser prefeito, administrar o município. Então, aqui é tudo diferente de que a visão que as pessoas de fora imaginam — pontua.
Questionado sobre a rejeição que o movimento sofre em algumas regiões, responde que isso ocorre por incompreensão de parte da população.
— Isso é totalmente errado porque os assentamentos só se criam através de uma compra de uma área pela União. Então, o governo compra a área do dono da terra. O dono vai receber um valor, e a União está passando para as pessoas que não têm terra para produzir — detalha.
“Votamos nas pessoas”, diz prefeito
Nos últimos anos, os assentamentos diminuíram na cidade, mas Nei atribui isso a uma queda na demanda de pessoas sem-terra em busca de espaços para produzir alimentos.
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O PT elegeu três vereadores na cidade, e o PL, um. Nei diz que a polarização entre direita e esquerda não interfere muito na eleição municipal. Segundo ele, os eleitores votam “nas pessoas”. O petista estima que metade dos votos recebidos tenham vindo de quem optou por Bolsonaro em 2022.
— Agora na próxima eleição quem gosta de votar no lado direito lá, no Bolsonaro, vota, quem gosta de votar na esquerda, vota. E nossa eleição é assim. Cada um puxa para seu partido, faz sua campanha limpa para deputado federal ou estadual, e depois nós voltamos a conversar, [sobre] município, pessoas — afirma.
Para o governo que começa em janeiro, Nei tem planos que envolvem melhorias para a população rural. Estão nesta lista uma parceria com o Incra para dar documentação a terras de famílias que ainda não têm os títulos e uma feira de produtos agrícolas para servidores municipais, com um vale-alimentação extra que só poderá ser gasto no local, com os pequenos agricultores. Outras demandas envolvem a habitação, onde tentará buscar ajuda de programas federais do governo Lula, e a saúde, onde a prioridade são um posto de saúde e um projeto de mini-hospital.
— Eu penso que o primeiro passo é emprego, saúde e moradia — finaliza, projetando o início do governo.
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