A produção dos fitoterápicos foi um dos caminhos trilhados por Diva Vani Deitos, 60 anos, que mora na Linha São Paulo, em Seara, no Oeste do Estado. Casada e mãe de três filhos, a agricultora apostou na produção agroecológica e sua propriedade é um grande canteiro com mudas de flores e plantas (lavanda, carqueja, arruda, manjericão, hortelã, boldo, entre outros) que passam pelo processo de cultivo, desidratação e secagem antes de transformadas em óleos essenciais e sais temperados.

Continua depois da publicidade

Clique aqui e receba notícias no WhatsApp

O sítio faz parte da rota de Cheiros e Sabores do Vale das Borboletas, uma alusão ao trabalho do entomólogo Fritz Plaumann e que deu ao município de Seara o maior museu entomológico da América Latina. Seara é reconhecida como Capital Catarinense da Borboleta.

– Temos mais de 100 plantas aromáticas e medicinais – diz Diva.

A propriedade está na rota turística rural e oferece uma trilha de 500 metros que pode ser percorrida pelos grupos e pessoas interessadas em conhecer nosso trabalho. Há pelo menos 30 anos a família de Diva trabalha com agricultura orgânica. Mas foi em 2017 que por iniciativa dela os fitoterápicos ganharam espaço. Para isso, ela precisou se capacitar por cursos.

Continua depois da publicidade

Dos canteiros de lavanda ao trato com animais, as mulheres na agricultura de SC

Diva é formada em fitoterapia, faz trabalho com medicina vibracional e utiliza florais. Para ela, a agroecologia é importante por cuidar da saúde da própria família e das outras pessoas, além oferecer mais possibilidades:

– A geração de renda nos dá autonomia. As mulheres precisam de condições para produzir agroecologia com assistência técnica, terra e crédito.

SC se torna um dos maiores produtores de batata Pringles do mundo

A produtora também cita outro ponto importante, a violência patrimonial que muitas vezes se faz presente na vida das campesinas:

– As mulheres não têm autonomia sobre o próprio patrimônio. Muitas vezes são alienadas da própria herança, que fica para os filhos homens, e por isso a importância de ter renda e direitos assegurados – defende ela, coordenadora da Associação dos Pequenos Agricultores do Oeste Catarinense (Apaco).

Continua depois da publicidade

Confira imagens de produtoras familiares de Santa Catarina

Ana Carla Harmatiuk Matos, advogada e diretora nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), reconhece avanços. Mas considera ainda grandes desafios para as mulheres do campo. Ana Carla cita o combate ao feminicídio e as violências física, psicológica e patrimonial como a fratura mais exposta e grave dos temas de gênero. Os números mostram grandes mazelas. No ano de 2022, conforme o Observatório da Violência Contra a Mulher, 56 mulheres morreram vítimas de feminicídio no Estado. Assassinatos que resultam principalmente do ciúme, resultado do machismo.

Entre janeiro e julho deste ano, foram 35 mulheres assassinadas. Das mortes, 15 em municípios com até 50 mil habitantes. Tomando-se por base que dos 295 municípios catarinenses 262 têm menos de 50 mil, o patriarcado segue como uma erva daninha a ser ceifada nos campos catarinenses.

Oficinas despertam interesse em práticas sustentáveis

Sandra Bergamim é secretária de finanças da Cooperativa Alternativa da Agricultura Familiar (Cooperfamiliar), em Chapecó. Dos 408 associados, 174 são mulheres. Os números refletem a força do sistema no Estado: de acordo com a Organização das Cooperativas (Ocesc) são 250 associadas, 3 milhões e 900 mil cooperados e 65 mil empregos.

Continua depois da publicidade

Fundada em 1995, a Cooper Familiar nasceu do debate sobre a necessidade e a importância de haver um instrumento que viabilizasse o trabalho da cooperação agrícola, compras coletivas de produtos e insumos na região Oeste. Desde então, a organização apostou em princípios da economia solidária, agroecologia, agroindústrias familiares e em programas como o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE).

Chefes do Agro: reportagem especial conta a história de mulheres líderes do agronegócio em SC

Em 2018, foi ampliado o estatuto para integralização das cotas partes da família (homem, mulher e jovem) e aumentou a participação nos espaços diretivos da entidade. A formação é um dos pilares da Cooperfamiliar, com encontros e oficinas sobre técnicas de produção. Além do preparo de alimentos, como pães de doces, a lida com fitoterápicos caseiros é uma das atividades desenvolvida pelas cooperadas.

– A participação das mulheres cresceu, criamos um coletivo com ações específicas e existem pelo menos cinco grupos com sete agricultoras cada voltados para suas discussões. A gente estimula a participação delas, pois reconhecemos a importância do trabalho nas propriedades, inclusive, com atividades alternativas que ajudam na renda familiar – diz Sandra.

Indústria de pescados em SC conquista certificação Lixo Zero

Para Justina Cima, dirigente do Movimento das Mulheres Camponesas (MMC) que neste 2023 celebra 40 anos, a diversidade que configura a agricultura em Santa Catarina, formada por indígenas, quilombolas, camponesas, adeptas da agroecologia e do agronegócio. Lembra, ainda, que a organização das mulheres ocorre de forma diferente, seja em coletivos, cooperativas, sindicatos, pastorais, movimento social. E até individualmente.

Continua depois da publicidade

– Para nós, do MMC, a prioridade é a agroecologia por entendermos ser um projeto de sociedade, um movimento que produz ciência e conhecimento, que pode levar a uma vida digna no campo.

Golpe financeiro contra idosos cresce em SC e deixa autoridades em alerta

Conforme Justina, além de focar na produção de alimentos saudáveis, o MMC pensa no ambiente, na organização social dos territórios, na natureza.

Saindo do mar da invisibilidade

Marcia da Rosa Gomes é extensionista rural e responsável pelo programa Capital Humano e Social da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de SC (Epagri), que tem como objetivo fortalecer conhecimentos e habilidades de pequenos agricultores e de pescadores. Uma das ações é o curso Flor-e-Ser, instituído em 2019, que promove capacitação em todo o Estado.

A qualificação é realizada em cinco encontros de dois dias e abrange os eixos social, humano, ambiental e de empreendedorismo. Ao longo das etapas, as participantes aprendem sobre políticas públicas para mulheres, cooperativismo, oportunidades de renda e negócio, educação financeira, turismo, artesanato. Um dos objetivos do programa é estimular o protagonismo e o fortalecimento das mulheres no enfrentamento das questões de gênero que se impõem no dia a dia, estimulando a ocupação de espaços de decisão.

Continua depois da publicidade

– Na pesca, especialmente, ainda percebemos um pouco de invisibilidade social e institucional. Nosso papel é o de ajudar as mulheres perceberem que fazem um importante trabalho e ampliar a concepção do conceito sobre o que é pescar, que não é apenas ir ao mar.

Conheça a tecnologia de SC que já fez 11 milhões de leituras faciais em prédios do país

Dentro do curso Flor-e-Ser, as participantes desenvolvem planos de negócio para acessar linhas de crédito, como do Programa Realiza, da Secretaria da Agricultura. Na área da pesca, recursos podem viabilizar a construção de agroindústrias, ranchos de pesca, compra de barcos e equipamentos.

jane-nascimento-de-andrade-da-silva
Após fazer o curso ” Flor-e-Ser”, da Epagri, Jane montou um projeto para financiar a compra de uma nova embarcação (Foto: Aires Mariga , Epagri, Divulgação)

Foi o que ocorreu com Jane Nascimento de Andrade da Silva, 48 anos, moradora na Armação do Itapocorói, município de Penha, Litoral Norte, casada e mãe de quatro filhos. Ela é uma das 43 mil pescadoras artesanais de SC. Até fazer o curso da Epagri, era vista como “a esposa que ajudava o marido pescador”, mesmo sendo ela a encarregada de comprar gelo e óleo, manipular e comercializar os peixes e camarão.

Hoje, ela tem um olhar bem mais abrangente sobre a profissão, resultado das aulas no curso Flor-e-Ser. Jane conta que, em 2016, o barco da família sofreu uma avaria no casco, ficando sem poder navegar. Jane colocou em prática o que aprendeu nas aulas e elaborou um projeto de financiamento. Conseguiu convencer a família e graças ao financiamento de R$ 30 mil, adquirido em 2022, os Silva têm uma nova embarcação.

Continua depois da publicidade

– O curso me deu oportunidade de crescer do ponto de vista profissional e social. O convívio com outras mulheres mostrou que temos as mesmas dificuldades e que a experiência de uma vai ajudando a outra.

Infográfico explica como funciona a agricultura familiar:

Leia também:

Japão retira embargo e reabre mercado para carne de frango de SC

Maracujá de SC ganha fama de melhor do país e tem safra 27% maior com refino da produção

Empresas de tecnologia de SC têm mais de 100 vagas abertas; veja lista