O campo de aviação do Campeche, no Sul da Ilha, vai ganhar um posto de saúde a partir de 2015. A ordem de serviço para a construção da estrutura deve ser assinada no final de maio. A notícia teria tudo para ser boa se não fosse por um imbróglio que se estende por mais de cinco anos no bairro.
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O campo de aviação, junto com a casa de pilotos e resquícios de antenas de rádio, guarda a memória da companhia francesa Générale Aéropostale, atual Air France, que teve como um de seus pilotos Antoine de Saint-Exupéry, autor de O Pequeno Príncipe.
Tanto a Associação dos Moradores do Campeche (Amocam) quanto a Associação Memória da Aéropostale no Brasil (AMAB) aguardam a construção de um parque e o tombamento do terreno, mas temem que a construção do posto de saúde descaracterize o patrimônio histórico.
No século 20, o campo de aviação, com mais de 300 mil metros quadrados, servia como pista de pouso e decolagem aos aviões. Por esse motivo, entraria em projeto de tombamento dos vestígios da Aéropostale no Brasil pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) como patrimônio da humanidade.
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As duas associações, baseadas em uma carta encaminhada pelo presidente da Associação de Arquitetos de Patrimônio da França e avaliador da Unesco, Rémi Desalbres, acreditam que a área poderá ser retirada da inscrição para tombamento com a construção de um posto, que não tem a ver com o projeto original para o espaço: um parque com elementos que preservam a memória da aviação e integram a comunidade.
A obra da Secretaria Municipal de Saúde, no entanto, foi aprovada pelo Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e pelo Instituto de Planejamento Urbano de Florianópolis (Ipuf) e, consequentemente, liberada pela Superintendência do Patrimônio da União em Santa Catarina.
A área de 2 mil metros quadrados foi cedida à Prefeitura de Florianópolis pela União, proprietária de 114 mil metros quadrados do terreno. O restante do campo de aviação pertence à Força Aérea Brasileira (FAB).
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Patrimônio da humanidade
– Alertado sobre um projeto de construção no local do terreno de aviação do Campeche, estamos hoje particularmente preocupados com as consequências que esta acarretaria para o projeto de inscrição da Linha Aérea Latécoère/Aérpostale na lista do Patrimônio Mundial da Humanidade pela Unesco. Assim, pedimos junto às autoridades brasileiras e à cidade de Florianópolis, que tomem todas as providências a fim de salvaguardar e valorizar esse patrimônio excepcional – diz, em tradução, parte da carta encaminhada por Rémi Desalbres a órgãos da prefeitura e da União.
A carta foi protocolada por Mônica Cristina Corrêa, presidente da AMAB. Ela tenta há cinco anos tirar do papel, com a ajuda do governo francês, a revitalização da casa de pilotos e a construção do parque no campo de aviação.
Segundo ela, a questão não é mais apenas de Florianópolis. A escala na Ilha dialoga com mais outras 11 escalas em todo o país que entram na inscrição para tombamento. Membros de uma comissão devem vir à Capital catarinense ainda em 2014 para avaliar os patrimônios.
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A superintendente do Ipuf, Vanessa Maria Pereira, afirma que o projeto do posto de saúde foi avaliado pelos técnicos do Sephan, órgão de patrimônio histórico e cultural da prefeitura, e que não haverá comprometimento do patrimônio.
O Iphan e o Ipuf concordaram que com o número de pavimentos, dois, e as características do imóvel nem mesmo a relação visual com o Morro do Lampião será afetada para obra. Sobre a carta de Desalbres, Vanessa diz que tiver o documento em mãos avaliará o conteúdo.
– Já não existe integralidade do patrimônio. A avenida Pequeno Príncipe corta o campo de aviação e ele não é mais como era antes – revela Pereira.
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Atual posto será desativado
A construção do parque está garantida. O posto de saúde será integrado a um Museu da Aviação e a outros elementos que resgatam a memória do local em projeto que já está sendo elaborado pelo Ipuf.
Para o secretário municipal de Saúde, Carlos Daniel Moutinho Júnior, o posto corresponde a apenas 1,5% do terreno, não comprometendo o valor histórico, e garantindo o acesso fácil da população.
O atual posto de saúde do Campeche será desativado com a inauguração do novo posto, no primeiro trimestre de 2015. Além de não atender ao número de habitantes, o antigo posto funciona em espaço alugado desde 2007.
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– Não tinha outro terreno com esse tamanho que pudesse comportar o posto. É uma área bem localizada, com capacidade para atender 15 mil pessoas. Poderemos integrar atividades ao parque, como caminhada e exercícios. Será uma boa experiência como a de Coqueiros – complementa.
O vice-presidente da Amocan, Ataide Silva, garante que a prefeitura têm outros terrenos em que poderia erguer o posto de saúde. A população do bairro deseja a construção do parque, uma das carências do Sul da Ilha.
– A construção do posto pode abrir espaço para que outros queiram construir no terreno que tanto lutamos para preservar como patrimônio. Essa não é a vontade da comunidade – lamenta.
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