Antes de qualquer coisa, é preciso dizer que não existe, dentro do atual processo de tentativa de impedimento, qualquer crime de responsabilidade fiscal que se configure como prova contra a Presidenta Dilma Rousseff. E explica-se a seguir, dentro do estabelecido em lei. Impedimento é o nome do procedimento dado às apurações dos crimes de responsabilidade contidos na Constituição Federal, de 1988 (CF/88), e definidos na Lei nº 1.079/50 (Crimes de Responsabilidade). São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República, elencados taxativamente no art. 85 da CF/88, aqueles que atentem à norma constitucional, especialmente contra a probidade na administração e a lei orçamentária.
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Compreende-se que os crimes de responsabilidade só ocorrem quando do exercício do cargo, neste caso da Presidência da República, por isso se estabelecem processo e procedimentos próprios, que constam na Lei nº 1.079/50.
Dito isso, quando falamos sobre o pedido de impedimento contra a Presidenta, que se pauta nas popularmente chamadas “pedaladas fiscais”, chega-se à conclusão de que do ponto de vista jurídico ele não se sustenta.
Em breves palavras, diz-se que as “pedaladas” tratam do nome dado à prática do Tesouro Nacional de atrasar de forma propositada o repasse de dinheiro aos bancos (públicos e privados) financiadores de despesas do governo com benefícios sociais e previdenciários, tendo como objetivo ajudar a fechar as contas de um determinado mês ou até de um ano fiscal, vez que jogam a conta para o período seguinte. Diante desta prática usual, construiu-se um novo entendimento de que as ?pedaladas? ferem a Lei de Responsabilidade Fiscal (art. 36), alegando que seriam como uma operação de crédito. Fato que, em hipótese alguma, se verifica.
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Por sua vez, na defesa da Presidenta no processo de impedimento em curso, alegou-se, em suma, que: elas já haviam sido praticadas por governos anteriores, mais especificamente nos anos de 2000 e 2001; 17 governos estaduais também se utilizaram das pedaladas nos últimos anos, o que abriria precedente para que vários governadores sofressem impedimento; e, os repasses não podem ser considerados como um empréstimo, mas, sim, como uma prestação de serviço para pagamento de benefícios sociais.
Todavia, como já sustentado pelo Advogado Geral da União, as “pedaladas” não configuram crime, face à ausência do dolo no não pagamento da dívida. O motivo é, e foi comprovado, equilibrar as despesas de acordo com as necessidades e urgências. No caso, a utilização para cumprimento dos programas sociais do governo, possibilitando que, ao final do ano fiscal, as dívidas e finanças fossem equilibradas dentro do próprio orçamento, não havendo qualquer inadimplência que configurasse crime previsto na Lei de Responsabilidade Fiscal.
Cumpre lembrar que foi a partir do parecer do TCU, que chama atenção às “pedaladas”, que se interpôs o presente pedido em análise. Conclui-se, então, que as “pedaladas” não configuram crime, muito menos crime de responsabilidade.
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Assim, nos termos da lei, o impedimento deveria ter sido arquivado pelo Presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, a quem compete receber, arquivar ou dar prosseguimento.
Como vimos, ele acolheu e deu prosseguimento, inclusive atropelando e suprimindo instâncias, pois age a partir de um processo de arquitetura de um golpe à deposição da Chefe do Poder Executivo, atacando diretamente o Estado Democrático de Direito.
Em síntese defende-se aqui a legalidade, o Estado, as Instituições, a Democracia e as liberdades. Ainda, defesa do voto enquanto garantia da manutenção do sistema político.
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Este é o desafio que temos para refletir e frear a marcha para um Estado de Exceção. O impedimento, nestes termos, é um golpe de Estado.