A decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que cassou o prefeito e o vice de-prefeito de Brusque e tornou Luciano Hang inelegível partiu do entendimento de que a campanha, em 2020, a favor de José Ari Vequi (MDB) e Gilmar Doerner (Republicanos), foi muito além do exercício da liberdade de expressão e de declarar voto na dupla, como alega o empresário. O uso da estrutura da Havan para impulsionar os então candidatos se configurou em claro abuso de poder econômico, segundo os cinco ministros da Corte que votaram pela cassação.

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— O empresário Luciano Hang pode votar e deve votar em quem ele bem entender, pode defender a candidatura que ele bem entender, pode criticar os demais partidos adversários, isso não está em discussão. O que não é possível é colocar a força da sua empresa com claro abuso do poder econômico em detrimento de uma candidatura e a favor de outra candidatura não só durante todo o período eleitoral, mas ampliando isso na véspera das eleições — afirmou o presidente do TSE, o ministro Alexandre de Moraes, durante a leitura de seu voto pela condenação.

Moraes narrou, com exibição de 19 prints em seu voto, diversas situações em que Hang usou a estrutura da Havan. De acordo com o presidente do TSE, ele confundiu a pessoa física com a jurídica para desequilibrar as eleições em Brusque, com vídeos publicados em suas redes sociais que tiveram ampla repercussão e que foram gravados no interior de suas lojas.

— Em todos os vídeos, não era só uma manifestação pessoal, era utilizando a força da empresa, que, sabemos, é uma empresa extremamente bem sucedida, principalmente no Sul do país, em Santa Catarina e aqui em Brusque, com inúmeros empregados e inúmeros fornecedores, reiteradamente utilizando a empresa para promover uma determinada candidatura [de Vequi e Doerner] — afirmou.

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O presidente do TSE disse que Hang ainda feriu a isonomia das eleições em Brusque ao fazer uso de sua empresa em outras práticas consideradas ilegais, como assédio eleitoral. Para Moraes, houve uma “campanha paralela”, e não apenas uma ilegalidade isolada.

— No dia 14 de novembro, [Hang] aparece entrevistando diversos funcionários, em uma forma de coação, imagine se um funcionário vai se negar a ser entrevistado pelo patrão… nesse momento, [aparece] entrevistando funcionários e funcionárias venezuelanas induzindo a comunidade brusquense a não votar no PT porque Brusque viraria “uma Venezuela”. Ainda no dia 14, véspera de eleição, também entrevista uma pessoa recém-contratada na Havan pedindo voto, dizendo categoricamente “não vote errado aqui”, ou seja, não só induzindo, mas coagindo um eleitor — exemplificou Moraes, entre as várias publicações de Hang citadas por ele.

— Não tenho nenhuma dúvida que houve quebra na isonomia, houve abuso do poder econômico claramente, com imagens claras de assédio eleitoral aos seus funcionários e aos seus fornecedores. Houve a tentativa de se fazer uma confusão para o eleitor entre a pessoa física e jurídica, tanto que ele mesmo se identifica como “véio da Havan”, colocando a força da empresa na cidade de Brusque contra uma candidatura, inclusive com desinformação, com fake news, com várias notícias falsas e fraudulentas, e ao mesmo tempo pedindo voto — completou o presidente do TSE.

O ministro destacou que a conduta de Hang se deu com concordância de Vequi e Doerner, que chegaram a aparecer em vídeos com o empresário. Moraes lembrou que a eleição de 2020 foi especialmente sensível à prática de abuso econômico, pois ocorreu durante a pandemia, quando a campanha de rua foi substituída pela divulgação nas redes sociais. Ele afirmou que a prática de assédio eleitoral se tornou amplamente recorrente desde então.

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O presidente do TSE foi acompanhado em seu voto pelos ministros Benedito Gonçalves, Carlos Horbach, Carmen Lúcia e Sérgio Banhos. O caso só foi ao plenário da Corte justamente por iniciativa de Moraes, que havia divergido do entendimento do relator da ação, o então ministro Ricardo Lewandowski, de que faltavam elementos para se configurar abuso do poder econômico. O ministro Raul Araújo ainda votou em acordo com o relator, deixando o placar final em 5 a 2.

O caso chegou ao TSE por conta de um recurso apresentado pelos diretórios brusquenses dos partidos Podemos, PT, PSB e Partido Verde. Antes de ir à Corte superior, eles haviam tido apelo negado pelo Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina (TRE-SC).

Ao julgar a ação, o TRE-SC havia entendido não haver provas suficientes sobre eventual desequilíbrio ou irregularidade das eleições municipais de Brusque em 2020. A Corte estadual pontuou, na ocasião, que os candidatos investigados não impulsionaram as postagens de Hang e que o empresário apenas exerceu o seu direito à liberdade de expressão ao se manifestar.

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