Quantas histórias surgem ao longo de 90 anos? São vários acontecimentos bons, outros ruins, e muitas lembranças. Imagine se essas memórias tivessem, todas elas, uma testemunha em comum: a Ponte Hercílio Luz. O eterno símbolo de Florianópolis e de Santa Catarina completa nesta sexta-feira nove décadas. Cerca de um terço deste tempo sem poder contribuir plenamente com o trânsito da cidade, é verdade, ora fechada para carros, ora para pedestres também. Por isso muita gente já pensou em derrubá-la, construir uma nova e mais moderna. Para outros, porém, isso é impensável e como uma senhora que precisa de cuidados especiais, merece atenção, paciência – e gera muitas despesas. Nesse quase centenário da ponte, o Grupo RBS conversou com pessoas para que elas pudessem contar, nesse trabalho multimídia, a sua relação com a primeira ligação entre a ilha e o continente. Deixamos, só hoje, a cobrança de prazos, do andamento da obra e dos detalhes de engenharia de lado para valorizar o sentimento que o povo catarinense tem por este monumento. Durante as gravações, algumas lágrimas caíram dos olhos que já viram muita vida na ponte. Agora, nesse nosso material, você vai poder relembrar daqueles tempos ou conhecer uma ponte que era muito mais do que uma obra inacabada. Nesse primeiro capítulo, você vai ouvir o relato da dona Terezinha Eva Schlosser. Ela é aposentada, tem 77 anos e filha da dona Eva, que trouxe junto do pai toda a madeira usada para a construção da Hercílio Luz.

Continua depois da publicidade

Numa época em que uma ligação telefônica exigia hora marcada, nas três primeiras décadas do século XX, o desenvolvimento econômico de Florianópolis estava começando. A parte continental da cidade – os bairros do Estreito e de Coqueiros – já eram a origem de grande parte da mão-de-obra da ilha. Outros municípios contribuíam com produtos que eram vendidos nos estabelecimentos da cidade. A Associação Comercial e Industrial de Florianópolis – ACIF – foi fundada no mesmo dia da inauguração da ponte, 13 de maio, mas em 1915. Anos mais tarde, nas décadas de 70 e 80, o empresário Osvaldo Moritz chegou à presidência da entidade e pôde perceber o quão importante foi a ponte velha para os primeiros passos do comércio na cidade.

A construção da ponte Hercílio Luz durou quatro anos, de 1922 a 1926. Na obra trabalharam operários catarinenses e também americanos. Um dos mais lúcidos trabalhadores, o seu Nicolau, se lembra que havia poucas máquinas e a maior parte da força para os trabalhos vinha dos braços humanos. Ele faleceu no final dos anos 90, mas um pouco antes, em 1996, participou do documentário “Ponte Hercílio Luz: Patrimônio da Humanidade”, do cineasta Zeca Pires. Lá ele conta como se construiu o símbolo da capital e já demonstra revolta sobre a forma como os administradores públicos lidam com a restauração.

A história da ponte foi filmada, compilada e registrada por muita gente. Um desses materiais foi o documentário “Ponte Hercílio Luz: Patrimônio da Humanidade”, dirigido pelo cineasta catarinense Zeca Pires. O material foi produzido para mostrar ao mundo a necessidade de preservar a ponte através desse título.

Todo o carinho do povo catarinense pela ponte Hercílio Luz já foi registrado de várias formas. Uma delas foi a produção do ourives Juan Pedro Alvarez, de 63 anos: ele fez duas réplicas em miniatura da ponte, com o medo de que se a original caísse, teria uma reprodução para se lembrar. A primeira foi adquirida pela Fundação Besc, que depois a cedeu para um museu. A outra está com ele até hoje.

Continua depois da publicidade

Para a maioria dos moradores da capital e dos municípios vizinhos, as maiores lembranças da ponte vêm da travessia, muitas vezes a pé, do continente para a Ilha ou vice-versa. O Pedro Eugêncio da Silveira é arte-finalista. Através da Hercílio Luz ele foi várias vezes surfar nas praias da ilha. Tantas idas e vindas fizeram com que ele montasse um arquivo com centenas de fotos antigas da cidade, entre elas, imagens da ponte. O Velho Lobo do Mar, como é conhecido, relembra.