Policiais, engenheiros e peritos que investigam a morte de 236 pessoas na danceteria Kiss, em Santa Maria, procuraram, procuraram, procuraram, mas não encontraram o nome do responsável técnico pelo Plano de Prevenção e Combate a Incêndio (PPCI) da boate. Se ele existe, não consta no material enviado pelo Corpo de Bombeiros para a Polícia Civil.

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– O PPCI existe, mas não está acompanhado de um projeto de engenharia. Com isso, não há como os órgãos de fiscalização responsabilizarem um engenheiro pela tragédia. Tudo indica que os bombeiros autorizaram o plano mesmo assim e, agora, terão de informar porque permitiram que funcionasse uma danceteria sem saída, sem luzes de emergência visíveis e com reformas num prédio que originalmente não era destinado a ser boate – pondera uma das autoridades que investiga o incêndio.

O PPCI foi recebido pela Polícia Civil na quinta-feira e repassado a peritos, que estão confrontando as informações contidas ali com as que foram coletadas (imagens, resíduos) no local da tragédia. A ideia é comparar o que diz o plano e as reais condições da danceteria.

O PPCI da Kiss, conforme confidencia a Zero Hora uma pessoa que teve acesso ao documento, é uma versão simplificada, geralmente permitida a bares e outros locais sem grande afluência de público.

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O plano teria sido assinado pela irmã de um dos donos da boate, Elissandro Spohr, o Kiko, com informações sobre como são as vias de escape e dispositivos antifogo do estabelecimento. Bombeiros de todo o Estado estariam permitindo esse tipo de plano, sem assinatura de engenheiro. O problema, ressaltam engenheiros e policiais ouvidos por ZH, é que a Kiss não era um prédio pequeno e muito menos simples.

– Qualquer coisa lá realizada deveria ter engenheiro, até por que no prédio funcionava antes um cursinho pré-vestibular. A adaptação desse tipo de estabelecimento para uma danceteria demanda muitos dispositivos de segurança adicionais e não poderia ser feita sem um especialista.

Deveria constar no PPCI da Kiss a ART (Anotação de Responsabilidade Técnica), documento com informações técnicas sobre o prédio, assinadas por um engenheiro. Os peritos que examinaram o documento não encontraram a ART – ou seja, o PPCI não teria o responsável técnico.

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Os policiais investigam se uma empresa de arquitetura realizou obras de decoração de interiores na boate. Essa empresa seria da mulher de um bombeiro reformado. Mesmo com uma engenheira atuando na obra, ela não teria feito o projeto do PPCI.

O que diz a legislação:

Decreto 38273/98: feito pelo governo do Estado, determina que o Plano de Prevenção e Combate a Incêndio deve ser acompanhado:

– Nas edificações com apenas um pavimento e que exigem somente prevenção por extintores, não há necessidade de ART.

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– Nas demais edificações, o documento é obrigatório.

O Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Rio Grande do Sul (CREA-RS) considera a legislação falha e há cinco anos tenta que toda a obra tenha, obrigatoriamente, responsável técnico (engenheiro).

– Como vamos responsabilizar alguém pelas falhas num prédio que incendiou, se não existe reponsável? Essa é nossa grande briga – diz Luiz Alcides Capoani, presidente do CREA-RS.

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