Em 2013, Chris Rock, o host do Oscar deste ano, havia escrito para o Hollywood Reporter sobre sua profissão. Comparava as oportunidades que Arsenio Hall, Eddie Murphy e Keenen Wayans lhe deram no início da carreira, quando era apenas um jovem de 19 anos impressionado com os carros que Murphy dirigia. Para um garoto do Bronx, aquilo era como um conto de fadas. Ao falar sobre a representatividade do negro numa “indústria branca”, o comediante exemplificava o caso de Leslie Jones, a quem ele havia indicado para o Saturday Night Live:

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– Ela era tão engraçada quanto um ser humano pode ser, mas não se apresentava na Second City (uma companhia de comédia improvisada), ela não fazia stand-ups no The Cellar e não trabalhava com o Judd Apatow, então, como conseguiria ser contratada ao menos que alguém como eu falasse para Lorne Michaels: ei, olhe para essa pessoa, ok?

Rock tocava num ponto importantíssimo, que é o fato do talento ser tão reconhecível quanto o de qualquer colega, mas não receber o mesmo entusiasmo. É por isso que uma atuação tão gigante quanto a de Ryan Coogler em Creed, por exemplo, deixa de ser lembrada – ou David Oyelowo, pelo trabalho primoroso em Selma no ano passado, e até mesmo Idris Elba, pelo assustador desempenho em Beasts of No Nation, não tenham sido indicados. O recado que a indústria continuamente passa é: se você é negro, precisa ter a fama e o reconhecimento de um Morgan Freeman ou de um Denzel Washington para ser reconhecido em premiações. Mas como se chega lá, com a falta de oportunidades?

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Não é um debate novo. Nos últimos anos, negros e mulheres são sempre deixados como coadjuvantes. Com o intuito de reverter esse panorama, a Academia prometeu algumas mudanças. As intenções são de transformar a ideia de que o conservadorismo está na alta idade dos votantes no sistema. As cédulas serão apenas preenchidas por membros ativos, que ainda estão realizando trabalhos. Dessa forma, pelo que o sistema sugere, a indústria descartaria os cineastas aposentados, assim como os membros mais antigos. É difícil dizer que seja o caminho, quando – como o próprio host da cerimônia já apontou em entrevista – o problema é muito maior do que uma mudança na votação.

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Os cinco de Spotlight

Não me aprofundarei em Os Dez Mandamentos, que chega nesta quinta-feira em grande parte das salas de SC. Só no Continente Shopping, em São José, a rede Cinépolis vendeu cerca de 13 mil ingressos para a estreia do filme. Na cidade de Recife, apenas um homem comprou 22,7 mil ingressos para distribuir. Já são mais de 2 milhões de entradas comercializadas. Com o incentivo maciço dos pastores aos fiéis, o longa pode abrir um precedente histórico. Mas os mandamentos que merecem análise são os de Spotlight, filme que revi nesta semana. Há cinco instantes fantásticos que haviam passado despercebidos e evidenciam o porquê da montagem ser tão impressionante. 

1) Uma bela tacada de beisebol, após a descoberta de um novo nome para a matéria. 

2) Marty está num café, na frente da igreja, enquanto o sacerdote discursa sobre intimidade e fé. 

3) Num primeiro momento, o líder da associação das vítimas revela aos jornalistas seus sobreviventes, assim como os traumas que carregam, como o vício em bebida e outras drogas. 

4) Logo depois, quando Mike e Sacha conversam com as vítimas ao mesmo tempo, ambas evidenciam os vícios (seja como depoimento ou nas cicatrizes expostas nos braços). 

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5) Robby e Ben estão na frente do quadro. Eles são separados pela figura de Marty, lá no fundo da redação, como se estivessem em opostos naquele momento. Depois, os dois vão se juntando a ele, chegando ao momento em que Ben fica ao seu lado, no clímax.