A portaria do Exército Brasileiro que liberou o acesso à população a armas que antes eram de uso exclusivo das forças de segurança pode gerar mais perigo nas ruas no futuro. A avaliação é do professor de direito penal da Universidade do Vale do Itajaí (Univali), Rodrigo Miotto.

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Conforme a portaria, agora será possível às pessoas adquirem pistolas e revólveres com calibres .45 ou .357. Essas armas possuem poder de fogo maior do que os revólveres de calibres menores, como os .22 e .38, que eram liberadas até então, mas proíbe a venda de fuzis. O texto também prevê a importação de alguns modelos, o que também não era permitido no uso para segurança pessoal.

— Com esse decreto, nós podemos ter criminosos acessando armas que não eram tão fáceis de acessar.

Segundo Miotto, estudos mostram que a maioria das armas apreendidas com criminosos comuns, não ligados a facções, é oriunda de furtos a residências, onde armas legais são levadas e acabam sendo usadas para novos crimes.

— Mais da metade das armas que são apreendidas com criminosas foram fabricadas no Brasil. Elas foram compradas por alguém de forma lícita, normalmente alguém que não tem o cuidado devido – explica.

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A análise do professor é baseada nos chamados criminosos comuns, que praticam crimes de menor impacto. Para ele, isso não tem relação direta com o crime organizado, já que facções criminosas conseguem acesso a quase qualquer tipo de arma, independente de proibições ou regulamentos.

— O crime organizado tem os seus fornecimentos de armas, seja pelo exterior, seja pela polícia de forma ilegal — diz, lembrando o caso recente da apreensão de mais de XX fuzis, pela polícia do Rio de Janeiro.

Para o professor, o aparecimento dessas armas legais nas mãos de criminosos nas ruas não será instantânea. Isso porque vai depender da eventual popularização dos armamentos, do preço para se adquirir e também da disponibilidade, já que a legislação para se ter um revólver em casa ainda é bastante restritiva.

— Considerando que essa é uma realidade histórica, com essa liberação de armas automáticas, com maior poder de fogo, nós vamos ter um aumento no médio e no longo prazo dessas armas nas ruas — acredita.

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O professor avalia que essa situação poderá colocar em risco até mesmo agentes de forças de segurança, pois em casos de eventuais confrontos, os criminosos poderão responder em igualdade de condições.

Sensação de segurança

O maior poder de fogo das armas permitidas, na avaliação de Miotto, não significa, necessariamente, mais segurança às pessoas que pretendem adquirir uma pistola ou revólver para se defender. Segundo o professor, a forma de reagir a eventuais crimes é o fator determinante em situações de risco e, normalmente, é o criminoso quem sai em vantagem.

— O criminoso tem o fator surpresa. Ele domina o momento da rendição. Pouco importa se a arma é de maior ou menor calibre — afirma.

O professor acredita que a liberação desses armamentos tem um caráter mais eleitoreiro do que prático, visto que essa foi uma promessa de campanha do presidente Jair Bolsonaro (PSL). No lado do comprador dessas armas, a questão do consumismo parece ser preponderante na avaliação dele.

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— No fundo, dentro do tema da liberação, o calibre não é a questão diferencial. Podemos dizer que armas automáticas ou de maior calibre poderiam desenvolver alguma espécie de fetiche ou consumismo. As armas são muito caras. Quem quer ou precisa, vai adquirir a que está mais dentro do orçamento— pontua.

O professor também lembra que a legislação ainda mantém uma série de restrições para quem quer ter direito à posse ou ao porte de armas. Como todo o conjunto tem um custo alto, ainda é inviável para a maioria das famílias o acesso a uma arma legal no Brasil.