Postes, lixeiras, desníveis, bueiros com tampa solta, buracos e carros estacionados. As calçadas da Grande Florianópolis são verdadeiras armadilhas para os pedestres. Se para quem consegue enxergar o caminho a atividade não é muito segura, o que falar da situação dos cegos que precisam driblar todos estes obstáculos no escuro?
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Segundo o último Censo de 2010, somente nas quatro maiores cidades da Grande Florianópolis – na Capital, em São José, em Palhoça e em Biguaçu – são mais de 2,2 mil pessoas totalmente cegas e pelo menos 20 mil com problemas sérios de visão. Para eles, o que os olhos não veem, o corpo literalmente sente.
::: Confira galeria de fotos dos trechos visitados
São tantos esbarrões, batidas e tombos ao andar pelas ruas que Marcos Schlosser, 32 anos, já faz piada sobre o assunto.
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Acidentes são corriqueiros
Por um erro médico ele perdeu a visão ao nascer e diariamente se locomove sozinho de sua casa, no Bairro João Paulo, até o trabalho, no Centro. Depois, vai a pé para o seu segundo emprego e volta de ônibus.
– Já caí em bueiro com a tampa solta e um táxi já passou por cima do meu pé. Fiquei meio quebrado uma semana, mas o carro amassou ainda mais. Bem feito pra ele – conta, tirando sarro da própria desventura.
Testamos com quem entende
Levamos Marcos e o instrutor de orientação e mobilidade da Associação Catarinense para Integração do Cego (Acic), Igomar Zicchi, para testarem algumas calçadas na Grande Florianópolis, e a constatação é desanimadora. Embora existam leis federais que garantam acessibilidade para pessoas com deficiência, e também uma norma da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) que assegura estes mesmos direitos, a maior parte das calçadas ainda não estão padronizadas.
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Igomar explica que a pavimentação deveria seguir o conceito chamado de desenho universal, ou seja, atender à maior gama de variações possíveis das características da população.
De acordo com este conceito, qualquer um deveria conseguir se locomover nas calçadas de forma autônoma, independentemente de ter alguma deficiência.
Vídeo: veja o trajeto feito por um cego por ruas da Grande Florianópolis:
O que é acessibilidade?
Condição para utilização, com segurança e autonomia, total ou assistida, dos espaços, mobiliários e equipamentos urbanos, das edificações, dos serviços de transporte e dos dispositivos, sistemas e meios de comunicação e informação, por pessoa portadora de deficiência ou com mobilidade reduzida.
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À mercê da boa vontade alheia
O presidente da Acic, Jairo da Silva, sente que muitas vezes falta vontade e informação aos gestores públicos. Temos exemplos de mudanças simples que trariam um benefício enorme para os cegos. Se nos consultassem, poderíamos ajudar a tornar a cidade mais acessível.
– A gente sai de casa sob tensão. São tantas armadilhas no meio do caminho, e coisas simples que facilitariam nossa vida não são feitas, como as sinaleiras sonoras para pedestres. Nos daria tranquilidade e autonomia para atravessar, não precisaríamos ficar esperando alguém se dispor a ajudar – comenta.
Fora do padrão
Apesar de existirem alguns locais com a “calçada para cego”, a maior parte não está feita de forma adequada. As vias municipais são de responsabilidade de cada prefeitura, mas as calçadas em frente às residências são de cada proprietário. Como a fiscalização quase não existe, cada morador faz do jeito que acha melhor.
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Em Palhoça, na Avenida Aniceto Zacchi, na Ponte do Imaruim, o cúmulo do absurdo: se o cego for seguindo o piso guia, cairá em um mato que leva para um rio poluído.
Em Florianópolis, bons e maus exemplos. A Avenida Beira-Mar Norte, depois que foi reformada, se tornou um bom modelo de acessibilidade. O piso guia está por toda a avenida. No Ticen, os semáforos com som para travessia de pedestres é um dos poucos da cidade.
O que dizem as prefeituras:
Palhoça
:: Reni Antonio Scweitzer, secretário de Infraestrutura
– As novas calçadas de vias públicas já estão sendo feitas dentro das normas, estamos seguindo a lei federal. Temos oito fiscais nas ruas fazendo um levantamento. Quantos às calçadas particulares, já começamos a intimar os moradores para que ajustem, e se não regularizarem nós mesmos vamos fazer e cobrar no carnê do IPTU.
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São José
:: Gleciomar Garcia Barbosa, secretário geral dos fiscais da Secretaria de Serviços Públicos
-Todos os projetos de calçadas da prefeitura e particulares passam pela nossa secretaria, e os engenheiros fiscalizam as normas da ABNT e a lei de acessibilidade. Quando recebemos denúncias de calçadas irregulares, notificamos os proprietários, que têm um prazo para arrumar, caso contrário multamos. Temos somente quatro fiscais, por isso trabalhamos na base das denúncias.
:: Denúncias no telefone: 0800 644 9040
Florianópolis
:: João Antônio Heinzen Amin Helou – Diretor de fiscalização da Secretaria de Obras de Florianópolis
– As novas calçadas da prefeitura são feitas de acordo com a regras ABNT, e todos os projetos são elaborados corretamente de acordo com a lei. Um exemplo é a Avenida Beira-Mar. A fiscalização das calçadas particulares cabe à Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano.
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