Reco desce da moto, saca a escopeta e mira no motorista da viatura parada na praça principal de Tijucas. BUM, é o estrondo que chega aos ouvidos do soldado Thiago Fernandes José. Pelo vidro estilhaçado da janela do motorista ele vê a calibre 12 sendo engatilhada para um segundo disparo. A situação é tão crítica que nem percebe o companheiro de Polícia Militar com a base do crânio aberta pelo tiro. O sangue do soldado Everton Rodrigues de Bastos mancha o banco do motorista. É 8 de abril de 2010 – dois anos e meio antes do assassinato da agente penitenciária Deise Alves -, data em que o Primeiro Grupo Catarinense (PGC) faz a sua primeira vítima entre agentes de segurança pública do Estado.
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Thiago tem mais sorte, mas não sai ileso. Quando percebe que está sendo atacado, se joga para fora do carro, mas não é rápido o suficiente. Reco atira antes de ele sair do alcance da arma. O matador tem habilidade nas mãos. Na pele, estampa três palhaços tatuados, marca dada a integrantes do PGC que executam policiais.
Enquanto se move para fora da viatura, o soldado sente um impacto no peito acompanhado de calor. Cerca de 30 balotes de chumbos da escopeta calibre 12 perfuram seus pulmões, esôfago e diafragma. Não há intervalos nos tiros, indício de que há outra pessoa disparando. É Bolão e seu revólver.
Assim que toca o chão, Thiago saca a pistola .40 e atira uma, duas, três vezes. Os assassinos fogem. O soldado vai parar na UTI do Hospital Regional de São José. A informação do homicídio chega por telefone no Presídio de Tijucas.
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– A cadeia tremeu -conta uma detento incluído no programa de proteção às testemunhas.
Os mandantes da execução, Eliezer Pires e Davis Pires, são cumprimentados.
Antes daquela noite, em janeiro de 2010, um parente deles envia um salve (mensagem) para o segundo ministério da facção pedindo autorização para o crime. O plano é aceito e a quadrilha aproveita a saída temporária de Israel Bittencourt, o Reco, da Penitenciária de São Pedro de Alcântara, em 7 de abril, para encomendar o assassinato. na rua, ele encontrou Douglas Daniel da Cruz, o Bolão. Juntos, cumprem a ordem, ou fazem a fita, como dizem nas cadeias.
O clima de êxtase na prisão diminui quando uma chamada por celular avisa: um policial sobreviveu. Eliezer brada:
– A testemunha que não podia ter ficado viva.
Logo depois, os detentos ficam sabendo que morreu a pessoa errada. O policial Rafael Luz, considerado inimigo do PGC por causa de sua atuação no combate ao tráfico em Tijucas, é quem deveria ter sido executado. A confusão ocorreu porque os matadores tinham a informação de que o alvo estava num Corsa Sedan, única viatura do tipo em Tijucas.
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Azar de Thiago e de Evandro, que naquela noite de abril fecharam os vidros do carro porque chovia. Sem visibilidade, ficou mais complicado perceber os assassinos se aproximando.
Todos os envolvidos no episódio em que o PGC, pela primeira vez, tirou a vida de um agente da segurança, foram presos. Em fevereiro deste ano, a Justiça determinou que seis acusados sejam levados a júri popular. Sobrevivente, o soldado Thiago continua no mesmo batalhão, mas não quer dar entrevistas. Everton foi promovido a cabo post mortem e, neste caso, a indenização paga pelo Estado à família é maior.
::Agente penitenciário também foi vítima
A Polícia Militar não foi a única a entrar na lista de vítimas do PGC em 2010. O agente penitenciário Sandro Mariano de Sá sentiu na pele a violência da facção ao ser baleado por dois adolescentes em frente a um mini mercado no Centro de Florianópolis. Ele trabalhava no raio 4 da Penitenciária de São Pedro de Alcântara, onde estão os líderes da facção.
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Grampo da Polícia Civil revela o que aconteceu naquele 31 de agosto. Os adolescentes passaram de moto pela Rua Frei Caneca, que dá acesso a morro da região central de Florianópolis, reconheceram o agente penitenciário e ligaram para o chefe do PGC na cidade. Repetiram o caminho para se certificarem que era mesmo Sandro. Diante da da confirmação, receberam aval para atirar.
Atingido no braço, o agente penitenciário passou duas semanas no Hospital Celso Ramos. As investigações descobriram que a ordem da tentativa de assassinato partiu de Leomar Borges da Silva, o Leoma. O criminoso é um dos chefes do PGC, exerceu a função de tesoureiro e cumpria pena justamente no raio 4 da Penitenciária de São Pedro de Alcântara.