Rivalidade alta, comércio afetado, boatos de compra de votos e até apostas sobre o vencedor fazem parte do enredo de uma eleição. Em um pleito fora de época, como foi o caso de Petrolândia, ainda mais. Mas apesar da agitação e do fim de semana alternativo, a pequena cidade do Alto Vale virou exemplo para o restante do mundo ao mostrar, com pompa e elegância, que as urnas eletrônicas são confiáveis. E mais: que o discurso de ‘fraude’ é papo de boteco.
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Neste domingo (13), os pouco mais de 5 mil eleitores do município elegeram Irone Duarte (PP) como prefeito. No dia anterior, enquanto representantes da Justiça Eleitoral provavam por “A” mais “B” a eficácia e segurança das urnas a observadores internacionais, alguns moradores em bares garganteavam a desconfiança sobre o processo — apesar de nunca ter havido prova de qualquer fraude.
— Acho que tinha que ser voto impresso. O Bolsonaro ‘tá’ vendo para criar uma lei sobre isso, vocês vão ver — disse um morador de Petrolândia enquanto bebia cerveja gelada. Ao mesmo tempo, um evento do Tribunal Regional Eleitoral (TRE) a alguns metros dali mostrava o quanto a urna eletrônica é eficiente. Ele não quis participar da cerimônia do TRE para ver de perto como o equipamento funciona.
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Irone foi eleito com apenas 16 votos de diferença da segunda colocada. Toda a apuração das 11 urnas levou menos de uma hora. Quando a certeza veio, o homem chorou, abraçou os filhos e a esposa, e saiu em carreata. Dezenas de automóveis formaram uma fila barulhenta na principal rua da cidade. Depois, esquecendo-se da pandemia, dezenas de pessoas ocuparam uma via e comemoraram o resultado.

Mas a maior vitória da democracia, talvez, tenha ocorrido no dia anterior. Observadores internacionais chegaram ao município no sábado (12) para analisar todo o processo eleitoral. O Tribunal Regional Eleitoral (TRE) aproveitou para fazer, pela primeira vez em uma eleição suplementar, o que normalmente é feito nas ordinárias: as auditorias nas urnas, que comprovam que não há formas de interferir nos votos computados.
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O evento foi aberto ao público, em uma escola estadual, mas não houve tanto interesse por parte da população. Enquanto o presidente do TRE, Fernando Carioni, falava sobre a demonstração, ouvia-se buzinadas ao fundo. Alheios à presença das autoridades, moradores subiam e desciam as ruas da região central, com bandeiras vermelhas ou azuis, dependendo do partido, penduradas nas janelas.
Em todos os cantos, o assunto era a movimentação por conta da disputa. Os pelegos (como são chamados os apoiadores do MDB em Petrolândia) e os colas brancas (do PP), não frequentam os mesmos locais. Os dois partidos, historicamente, dividem a preferência dos eleitores. Há pontos de encontro para cada grupo. A forte rivalidade, comum no interior, gera até apostas sobre os possíveis vencedores. Há quem perdeu dinheiro tentando acertar o nome do eleito.
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Voto impresso?
Nos botecos, as opiniões sobre as urnas também se dividem. De um lado, os que confiam no sistema, sem pestanejar. De outro, os que repetem o discurso endossado pelo presidente Jair Bolsonaro, que defende a volta do voto impresso. Bolsonaro já havia afirmado haver irregularidades no pleito de 2018. Saiu vencedor e nunca apresentou qualquer prova sobre a denúncia.
— Fizemos essa demonstração porque queríamos mostrar para o povo que não tem como haver interferências. O sistema anterior (de papel) era maléfico, porque a fraude era muito grande. Para mim, desconfiar das urnas é discurso de perdedor — disse, taxativo, o presidente do TRE.
Os quatro observadores internacionais passaram o domingo analisando o vaivém no maior local de votação do município, a mesma escola onde as auditorias foram feitas. Eles farão um documento com as percepções que tiveram e poderão, inclusive, recomendar melhorias para o TRE, que pode ou não acatar as sugestões.

Os observadores pertencem à Conferencia Americana de Organismos Electorales Subnacionales por la Transparencia Electoral (Caoeste), presidida pelo brasileiro Marcelo Peregrino. A organização tem dois anos, mas as observações são velhas conhecidas da democracia mundial. Peregrino explica que o interesse em vir a Petrolândia aconteceu por conta da cidade estar em Santa Catarina, Estado conhecido pela boa organização nos pleitos e pela criação das urnas eletrônicas.
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Sistema seguro
Se no município há quem sustente os boatos sobre as urnas, assim como tantos outros brasileiros, quem é de fora tem uma opinião (e até admiração) totalmente oposta. Antes mesmo da votação começar, uma das observadoras, a norte-americana Ann Miller, declarou, em um português carregado de sotaque, a visão que tem do sistema brasileiro:
— É um sistema muito seguro. O Brasil é melhor que os Estados Unidos neste aspecto. Se eu pudesse escolher, escolheria a urna eletrônica — afirmou.
— O mundo inteiro tenta copiar o modelo brasileiro — resumiu Peregrino.
Angela Adriana Krindges da Mota (MDB), que recebeu apenas 16 votos a menos que o primeiro colocado, disse momentos antes de saber o resultado que confiaria na escolha da população.
— Nós temos que acreditar nas urnas, principalmente com os observadores internacionais aqui — pontuou.
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Petrolândia deixou o recado: Duvidar das urnas é discurso de mau perdedor.