O pesquisador Mateus Ribas, doutorando em Farmácia na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), fez um registro único no Estado: ele encontrou o pássaro papa-lagarta-de-bico-preto (Coccyzus erythropthalmus), espécie migratória dificilmente encontrada no Brasil e ainda mais rara em Santa Catarina.

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Este é o primeiro registro da ave no Estado, o segundo no Sul do país, e apenas o quinto em todo o país. A espécie foi avistada no entorno da Lagoa da Conceição, no fim de novembro. O local é onde Mateus estuda o impacto de ações realizadas pelo homem.

Ele se deparou com a espécie durante um trabalho de campo, logo após um período de fortes chuvas no Estado. A captura de aves silvestres é realizada para a coleta de material biológico, tema mais direto da pesquisa de Mateus.

O estudo é feito no Parque Municipal Natural das Dunas da Lagoa da Conceição e também no Parque Estadual do Rio Vermelho, para avaliar se atividades humanas próximas à lagoa podem afetar a microbiota desses animais.

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O papa-lagarta-de-bico-preto, segundo o professor Guilherme Brito, do Departamento de Ecologia e Zoologia, é reconhecido por sua plumagem predominantemente marrom, com o ventre branco e uma listra vermelha ao redor dos olhos dos adultos. Apesar das raríssimas aparições no Brasil, não é um animal ameaçado.

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— Sua capacidade de se adaptar a diferentes ambientes e sua ampla distribuição contribuem para a sua relativa estabilidade populacional na América do Norte — comenta.

A ave é migratória, ou seja, estava viajando quando foi encontrada. Mateus comenta que uma equipe comandada pela pesquisadora Marina Somenzari em 2018 explicou que o animal constrói os ninhos no Canadá e nos Estados Unidos, passando o inverno na região noroeste e centro-oeste-central da América do Sul.

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Encontro “profetizado”

— A cada ida a campo, eu e a equipe brincávamos – ‘Se preparem que hoje vai cair na rede-de-neblina uma ave rara’ – Mas isso foi acontecer somente nos 45 minutos do segundo tempo — brinca o pesquisador. Esta foi a penúltima captura do projeto, e se soma a outras aparições especiais, como a do Tautó-Miúdo (Accipter striatus) e da espécie migratória Guararacava-de-crista-branca (Elaenia chilensis).

Ele conta que a ave apareceu por volta das 9h, em uma das últimas vistorias em rede-de-neblina (redes finas e feitas de material leve, como nylon).

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— De longe parecia um Sabiá-Poca, uma das aves mais comuns que capturávamos em campo. Quando íamos nos aproximando vimos que não era um sabiá, mas sim um Papa-Lagarta — relembra o pesquisador.

— Por algumas vezes, eu e o Dani Capella, membro da equipe de campo, tivemos conversas proféticas que em algum momento, um papa-lagarta cairia na rede. Claro que conversávamos sem imaginar que isso, de fato, poderia acontecer, eram apenas brincadeiras de campo. […] Posso dizer que o registro dessa ave foi como ganhar na loteria.

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Após a captura, Mateus e os colegas de campo fizeram todos os procedimentos padrões para retirar o animal da rede-de-neblina. Com ajuda do professor Guilherme Brito e do biólogo Guilherme Willrich, a ave foi identificada como sendo um indivíduo jovem de Papa-lagarta-de-bico-preto. Eles coletaram material biológico, anilharam o animal e o devolveram para a natureza.

Estudo avalia impactos no entorno da Lagoa da Conceição

Mateus estuda os impactos da ação humana no entorno da Lagoa da Conceição, avaliando bactérias resistentes aos antimicrobianos e micropoluentes na água e sedimento de diferentes pontos ao longo da Lagoa. Estas bactérias resistentes costumavam ser encontradas apenas em ambientes hospitalares.

— Com o avanço da urbanização, uso exagerado de antimicrobianos e vazamento de esgoto em ambientes naturais, hoje, estas bactérias acabam atingindo diversos ambientes, como a Lagoa da Conceição e seu entorno, os oceanos e aqueles que interagem com estes ambientes, sejam pessoas ou animais.

A consequência disso, de acordo com ele, é que as bactérias resistentes podem colonizar a microbiota humana e animal. Em casos de infecções, o tratamento pode ser mais difícil, mais caro e letal. A ideia de estudar as aves surgiu porque são animais que interagem muito com ambientes naturais e com ambientes urbanos.

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— As aves acabam se contaminando com bactérias de origem antrópica, e, devido a sua capacidade de voo e migração, no caso de aves migratórias, acabam levando estas bactérias para novas áreas e para novos hospedeiros. Por este motivo, estes animais são importantes sentinelas epidemiológicos da disseminação de bactérias resistentes aos antimicrobianos — pontua.

No caso do papa-lagarta-de-bico-preto, ele não identificou nenhuma bactéria resistente. Este registro, no entanto, pode render novas informações sobre o padrão de migração da espécie.

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