Alan acorda cedo, toma café, liga o carro e sai de casa na Itoupava Norte a caminho do trabalho, na Vila Nova. Antes de chegar ao escritório, o advogado de 44 anos dá carona para a filha até a universidade, que fica poucas quadras antes do destino final das manhãs de segunda a sexta-feira. Na hora do almoço ele percorre o sentido inverso.
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— Na volta, descobri um novo caminho recentemente. Pego a Rua Martin Luther ao invés de seguir pela Rua São Paulo e pego a Ponte do Tamarindo. Isso me facilitou bastante. Era mais complicado, eu ia pela Rua São Paulo e pegava o rush na Rua 2 de Setembro, além de sinaleiras e filas. Acho que fico mais ou menos 50 minutos no trânsito. O meu trajeto é curto, mas de qualquer maneira tive um benefício. Cinco, oito minutos a mais em um trajeto curto é uma porcentagem alta. Acabei sem querer usando esse novo caminho, dei uma carona. Ele estava disponível, mas eu não usava — comenta Alan Rafael Moser.
O advogado representa a maioria dos blumenauenses que passa entre 45 minutos e uma hora e meia de segunda a sexta-feira no trânsito, segundo pesquisa desenvolvida pelo projeto de extensão Focus dos cursos de Publicidade e Propaganda, Jornalismo e Matemática da Universidade Regional de Blumenau (Furb). Esse tempo médio, no entanto, pode triplicar nos próximos 20 anos, por conta dos congestionamentos: a projeção é do Plano de Mobilidade Urbana, que prevê cenários e mudanças para o trânsito local nas décadas que estão se aproximando.
O dado tem como base a evolução da população da cidade e a capacidade das ruas em relação ao crescimento do número de veículos, algo que se continuar na mesma média atual vai atingir um colapso nas vias blumenauenses. Por isso, a prefeitura traça metas para que a cidade mude estruturas e comportamentos e, assim, evite o prognóstico de mais trânsito, mais poluição e mais tempo perdido.
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Entre uma série de análises e estudos publicados em mais de 200 páginas, o plano chega a três itens considerados indispensáveis para alterar os rumos da mobilidade: incentivar o uso do transporte coletivo com uma proposta ambiciosa, reduzir e desincentivar o uso de automóveis e criar alternativas novas para os trajetos médios e longos dentro da cidade.
O plano visa um futuro que boa parte da população sabe ser necessário, mas ainda não vê meios de colocar em prática. Segundo a pesquisa Focus, quando questionados sobre o motivo de não aderirem às formas alternativas de transporte para promover a mobilidade urbana, 34% dos 550 entrevistados apontam o comodismo como principal desculpa para não mudar o hábito. Na sequência a falta de estrutura na cidade para adotar outros meios de transporte (28,7%) e o transporte coletivo ruim (25,8%) são citados como os principais desmotivadores (confira abaixo detalhes da pesquisa).
— A resposta a gente já conhece há muito tempo. Evidentemente que a utilização do transporte público seria ideal para que houvesse uma mudança no nosso trânsito, melhorasse a fluidez. Mas para isso precisamos ter transporte em condições, de conforto, de opções, e isso depende muito das prefeituras. Elas forçarem uma mudança de cultura, destas empresas de transporte, mas lamentavelmente nós não vemos uma força moral, dos municípios para determinar essa transformação de comportamento — avalia o presidente do Movimento Nacional de Educação no Trânsito (Monatran) Roberto Alvarez Bentes de Sá.
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Plano para o transporte coletivo já tem ações em andamento
O desafio apontado pelo plano tem a ver com os três eixos citados e trabalha com o percentual que a cidade precisa buscar: distribuir a mobilidade em 38% de usuários de carros e motos, 31% de transporte coletivo e 31% de ciclistas e pedestres. Números que a prefeitura compara com os de 2001 e que são bem diferentes dos atuais 65,3% usuários de transporte privado, 26,4% de transporte coletivo e 8,4% de outros modais – segundo os números da pesquisa Focus.
A proposta que Blumenau busca para o transporte coletivo já tem ações em andamento, como a construção de dois terminais (Itoupava Central e Água Verde), mas precisa ir além com a implantação de novos quilômetros de faixas exclusivas ou preferenciais de ônibus em ruas como Humberto de Campos, Gustavo Zimmermann, Pedro Zimmermann e nas regiões do Garcia e da Velha, ações previstas no plano de mobilidade sustentável. Segundo a pesquisa, 77% dos entrevistados são a favor da ampliação das faixas de ônibus, mesmo que elas reduzam o espaço para carros ou estacionamento.
Incentivo ao uso da bicicleta
Embora nos ônibus atuais de Blumenau o acesso com bicicletas seja inviável, a prefeitura prevê incentivar mais o uso das bikes nos próximos anos, e o caminho apontado é o das ciclovias – algo que 50% dos entrevistados pela pesquisa concordam. Segundo o plano de mobilidade, cerca de 70% dos blumenauenses moram atualmente a menos de 500 metros de uma ciclovia ou ciclofaixa, algo que a cidade pretende mudar com a criação de 155 novos quilômetros de áreas para ciclistas e elevar o percentual para 87% da população.
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Convencer motorista a deixar carro em casa é o desafio maior
Novos espaços para bicicletas e um transporte coletivo melhor podem incentivar alguns motoristas a deixar o automóvel na garagem, mas reduzir efetivamente o número de carros nas ruas de Blumenau demanda, segundo a prefeitura, medidas mais drásticas. A principal é restringir o acesso nas ruas do Centro, como a XV de Novembro, e transformá-la em calçadão. Obras como as pontes Norte-Sul e do Centro também fazem parte do plano, melhorando os trajetos entre os bairros sem que os motoristas circulem pela área central.
— Em relação ao transporte de massa, precisamos compreender que no Brasil e em particular em nossa Blumenau é possível perceber uma infraestrutura deficitária. Acredito que quando o gestor de trânsito e mobilidade das cidades tiver o interesse de implantar um transporte de massa como prioridade, teremos uma mudança de hábitos e deixaremos os automóveis como última opção — assegura o especialista em Administração e Segurança no Trânsito Fábio Campos da Silva.
O blumenauense Alan Rafael Moser reforça que tem carro há bastante tempo e só quando mais novo usava o transporte coletivo, mas admite que cogitaria alterar a rotina para passar menos tempo no trânsito se o serviço ofertado fosse mais ágil. Por enquanto, não foge do script nem mesmo aos fins de semana, quando também usa o carro como meio de transporte:
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— Tenho consciência de que o ônibus é melhor para o trânsito, mas existem pontos cegos que a pessoa precisa pegar dois, três ônibus, para fazer o trajeto. Ainda é mais prático usar o carro — diz.
>> CONFIRA OS DETALHES DA PESQUISA SOBRE A MOBILIDADE URBANA DE BLUMENAU