O homem que abriu a tiros de revólver Smith & Wesson calibre 45 a maior crise da história brasileira, levou o presidente Getúlio Vargas ao suicídio e mudou o rumo da política nacional, seis décadas atrás, agora quer entrar para a política.

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Aos 90 anos, Alcino João do Nascimento disputa pelo PT uma das nove vagas da Câmara de Mantenópolis, cidade de 13,6 mil habitantes que vive da plantação de café e da criação de gado no noroeste do Espírito Santo, na divisa com Minas Gerais.

Nascido em Itaperuna (RJ), filho de lavradores, caçula de uma prole de 12 irmãos, ex-garimpeiro, ex-bolicheiro, ex-mestre de obras e ex-tropeiro que comeu pó e amassou barro no lombo de burros pelo interior mineiro e capixaba, Alcino foi operário da prefeitura de Belo Horizonte quando o prefeito era Juscelino Kubitschek, mas ganhou fama como pistoleiro da guarda pessoal de Vargas, chefiada pelo temido Gregório Fortunato.

É o protagonista central, e único personagem vivo, do atentado da Rua Tonelero, crime que precipitou o trágico agosto de 1954, ao deixar ferido o principal desafeto de Vargas, o jornalista Carlos Lacerda, e causar a morte do major da Aeronáutica Rubens Florentino Vaz, 33 anos, segurança de Lacerda.

Apesar de sempre dizer que puxou o revólver para se defender e que tinha ordens de Gregório para apenas seguir Lacerda, Alcino acabou condenado a 33 anos de prisão. Cumpriu atrás das grades 21 anos e oito meses na Penitenciária Lemos de Brito, onde escapou de duas tentativas de execução. Deixou a cadeia em abril de 1975 em liberdade condicional.

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Alcino pensou em montar um negócio: uma banca do bicho

Até meados de 2010, viveu como um simples operário aposentado no subúrbio de Nova Iguaçu, na baixada fluminense. Longe dos sete filhos, separado de Elisa, a segunda mulher, 23 anos mais jovem, Alcino voltou a Mantenópolis há cerca de dois anos. É um dos lugares onde passou em 1945, e diz ter trabalhado em favor do crescimento da cidadezinha, abrindo ruas e construindo casas.

O ex-pistoleiro chegou de mansinho. Alugou umas peças de um conhecido, na zona rural. Logo que chegou, tentou seguir “seu projeto desenvolvimentista para Mantenópolis”. Queria instalar um novo negócio, típico do cotidiano carioca: uma banca de jogo do bicho. Pediu autorização na prefeitura, na conversa mesmo, mas não levou.

– Ele me dizia: “Mas no Rio pode”. Falei que era contravenção. Voltou no dia seguinte, insistindo, propondo repartir o lucro pela metade, mas o convenci que era ilegal – recorda Eduardo Alves Carneiro, ex-prefeito pelo PT.

Tempos depois, Alcino procurou o diretório do partido decidido a se filiar e concorrer a vereador. Em julho, vestiu terno e gravata, alinhou os cabelos brancos, tirou foto e encaminhou a candidatura. Mas surgiu um contratempo de última hora. Não tinha comprovante de alfabetização e precisou se submeter a um teste.

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– Por causa da idade, seria muito difícil ele conseguir cópia do comprovante. Fiz um ditado. Ele tinha de montar uma frase, escrevendo que não era analfabeto, e foi bem – conta Renato Meneguelli Pechinho, chefe do Cartório da 29ª Zona Eleitoral do Espírito Santo.

Entrevista: Alcino João do Nascimento

“Quero fazer alguma coisa pelo povo”

Por telefone, Alcino João do Nascimento falou com Zero Hora.

ZH – Por que resolveu se candidatar?

Alcino – Quero fazer alguma coisa pelo povo, né? Em 1945, passei férias de seis meses aqui, meu sogro morava na cidade. Fiz uma olaria, medi 3 mil lotes de terra, construí 1,3 mil casas.

ZH – Por que o PT?

Alcino – Escolhi o PT para seguir aquela dupla Juscelino e Getúlio, a mesma coisa agora, com Lula e Dilma. São os presidentes que mais fizeram pelo povo.

ZH – Suas propostas são inusitadas: hospital cirúrgico e corte de cabelo de graça.

Alcino – Vou pedir verba e encaminhar ao prefeito. Tenho um projeto de construir 200 casas para alugar e tirar o dinheiro para sustentar o hospital. Se engavetarem, tenho conhecimento com a Dilma. Vou falar com ela.

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ZH – Como está a campanha?

Alcino – Muito boa. Não ando 50 metros sem encontrar três ou quatro pessoas que param para falar comigo.

ZH – O senhor ainda guarda segredos daquele agosto de 1954?

Alcino – Fui processado, condenado, paguei a pena e acabou. Não tenho mais nada para falar. Tá tudo escrito em um livro.