Em 2015, o pagamento de pensão vitalícia a filhas solteiras de funcionários públicos falecidos custou R$ 2,4 bilhões aos cofres da União. Sem desconsiderar a necessidade de controle dos gastos públicos, em especial em tempos de ajuste fiscal e discussões sobre a reforma da Previdência, o assunto vale algumas análises jurídicas.

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O benefício foi instituído por lei em 1958 e alterado em 1990, com a extinção da pensão para filhos maiores de 21 anos, removendo a exceção às filhas solteiras. Contudo, as que já eram beneficiárias antes têm direito adquirido, sendo suspenso apenas em caso de casamento ou posse em cargo público permanente.

Apesar da clareza do dispositivo, o Tribunal de Contas da União, no acórdão 892/2012, entendeu que dependência econômica do servidor falecido era requisito essencial para a concessão e manutenção das pensões por morte, mesmo as aplicadas sob o regime anterior.

Com isso, foi realizado um pente fino nas pensões da União, para averiguar possíveis irregularidades. Nessa ação, foram identificados 19.520 benefícios supostamente irregulares e, a partir daí, em 2016, todos os órgãos da administração tiveram seus processos de pensão revisados.

Embora a cassação dos benefícios possa contribuir para o corte dos gastos públicos e tenha o apoio de parte da opinião pública, a posição adotada pelo TCU é ilegal. Isto porque a lei vigente na época não exigia a dependência econômica.

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No direito, há a máxima de que não cabe ao intérprete restringir quando a lei não restringe. Portanto, o Tribunal inovou criando requisito que não consta na lei, violando, também, o princípio da legalidade. E, mesmo que o posicionamento do TCU fosse legal, não poderia atingir as pensões já existentes, já que é vedada a aplicação retroativa de nova interpretação.

A decisão do TCU, portanto, não é legal, e o entendimento deve ser revisado, como inclusive já sinalizou o STF em decisão liminar. Apesar da falta de recurso do Estado, não é possível cortar gastos ao arrepio da lei.

*Ivan Pereira Remor é advogado

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