Inaugurada há pouco mais de um ano e meio, a Penitenciária Industrial de Blumenau foi concebida como uma das ferramentas para minimizar os problemas no sistema prisional do Vale do Itajaí, quase como um sopro de esperança para a comunidade que sempre vivenciou situações graves nas unidades carcerárias – da classificação do Presídio Regional de Blumenau como o pior do Estado ao comando de ataques partindo de dentro das cadeias da cidade por facções criminosas.

Continua depois da publicidade

Hoje a penitenciária conta com 583 detentos. Apesar de contar com 599 vagas, o diretor da unidade Cleverson Henrique Drechsler explicou ao Santa em reportagem publicada em janeiro que mantém 15 vagas desocupadas para eventuais emergências e não recebe novos internos sem que haja transferência ou liberação de quem já está lá, seguindo uma determinação do Poder Judiciário. A unidade começou a funcionar no final de janeiro de 2016 sem scanners corporais, recebidos em abril deste ano, mas que ainda aguardam autorização do Conselho Nacional de Energia Nuclear (Cnen) para operar, ou bloqueadores de sinal de celular, dois dos equipamentos considerados essenciais para a proteção do local.

Projetada como um espaço moderno e de alta segurança, a penitenciária registrou duas fugas: uma em outubro do ano passado, dois meses depois da conclusão da transferência dos internos já condenados que estavam no presídio e que na época foi minimizada pelas autoridades por se tratar de um detento que foi recapturado e, posteriormente, teria se arrependido; e outra no início de fevereiro, quando oito presos de uma mesma cela fugiram por uma das torres de segurança que estava vazia por volta do meio-dia.

De acordo com os dados do Relatório Mensal do Cadastro Nacional de Inspeções nos Estabelecimentos Penais (Cniep), cujos dados estão disponíveis no sistema online Geopresídios, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), as condições da Penitenciária Industrial de Blumenau são consideradas regulares. A informação mais atual do sistema é de 8 de agosto e o relatório indica que durante a inspeção foram encontradas ¿armas de fogo ou instrumentos capazes de ofender a integridade física¿ e que foram apreendidos 46 ¿aparelhos de comunicação e/ou acessórios¿. Para tomar conta da estrutura, o relatório informa que trabalham no local 83 agentes penitenciários. Sobre a avaliação, o Departamento de Administração Prisional (Deap) respondeu via assessoria de imprensa que ¿as condições da unidade estão bastante adequadas à operacionalização segura da unidade. Todas as recomendações de melhoria que nos são apontadas, são atendidas pelo Estado dentro das possibilidades financeiras e estruturais¿.

Mesmo com estas questões, o promotor de Justiça Flávio Duarte de Souza – que responde interinamente pela área de Execuções Penais – destaca que a construção da penitenciária representou um avanço intenso no sistema prisional do Vale. Ele afirma que não é possível fazer uma comparação com o presídio, já que se tratam de estruturas físicas completamente diferentes, e também não se pode esperar o mesmo resultado das duas unidades:

Continua depois da publicidade

– Uma foi construída sob um padrão moderno, fazendo com que não haja muito contato entre os agentes e os presos, enquanto outra tem uma estrutura muito antiga, com galerias que têm 30 anos. Então a própria forma de administrar tem que ser diferente, e é claro que a segurança vai ser distinta. Em um local mais novo, a segurança vai ser muito maior do que em um local mais velho, onde a atividade do dia a dia acaba fragilizando o ambiente.

Modelo é o da lei, mas penitenciária ainda não segue

Apesar de ser uma das mais novas unidades do sistema carcerário catarinense, a Penitenciária Industrial de Blumenau, na prática, não pode ser considerada um modelo. Na opinião do coordenador da comissão de Segurança Pública da OAB Blumenau, Rodrigo Novelli, para isso a instituição deveria seguir todas as determinações da Lei de Execuções Penais, como proporcionar vagas de trabalho e estudo para todos os internos, o que atualmente não acontece.

– Com a penitenciária a lei começou a ser cumprida, pois os presos em regime fechado foram alocados no local que a lei determina. Houve avanços, mas ainda não está completo – avalia.

A presidente do Conselho da Comunidade e coordenadora da comissão de Direitos Humanos da OAB Blumenau, Marilu Ribas, concorda que houve um progresso com a instalação da penitenciária, mas também destaca que falta contemplar uma série de aspectos para que o processo de ressocialização seja efetivo. Diz que para isto acontecer é necessário que cada pessoa dentro do sistema atravesse quatro etapas: assistência religiosa, condições ideais de trabalho e estudo, assistência de saúde e acompanhamento da reintegração à sociedade, o que dificilmente acontece. Ela ainda destaca outros fatores que prejudicam a ressocialização, como o baixo efetivo de profissionais e a divisão dos detentos dentro das unidades:

Continua depois da publicidade

– Os agentes têm que tirar os apenados das celas e levar para o local de trabalho ou estudo e aí eles saem com 10, 15 apenados e só dois agentes. Eles não podem colocar a segurança deles em risco, e nem se pode pedir isso a eles. Outra coisa é a questão da separação para o trabalho e o estudo, pois não dá para colocar no mesmo espaço presos que são do ¿seguro¿ (condenados por crimes sexuais), os que são do ¿convívio¿ e os que pertencem a facções diferentes. São questões que dificultam.

Futuro do Complexo Penitenciário de Blumenau é incerto

A Penitenciária Industrial de Blumenau foi o primeiro prédio do futuro Complexo Penitenciário de Blumenau a ser construído e entregue. Quando foi anunciado, o novo centro do sistema carcerário de Santa Catarina teria três unidades: a penitenciária, um novo presídio e uma unidade para o regime semiaberto, que seriam construídas nesta ordem.

A primeira obra só deslanchou depois da fuga de 28 detentos do Presídio Regional de Blumenau por um túnel em janeiro de 2015. Um processo burocrático que se arrastava foi concluído e seis dias depois da evasão as máquinas começaram a trabalhar no terreno da Ponta Aguda. O prédio foi entregue um ano depois e na cerimônia de inauguração o governador Raimundo Colombo declarou que o dinheiro para a continuidade das obras estava garantido:

– Sim, esses recursos estão programados através do Pacto (programa de investimentos do governo) e os contratos estão firmados e disponíveis para a execução das outras etapas – disse Colombo à reportagem do Santa em 27 de janeiro de 2016.

Continua depois da publicidade

O plano inicial era concluir o projeto até 2018 e finalizar a questão com a desativação do Presídio Regional de Blumenau e a entrega do espaço ao município. Mas a realidade já não é esta.

A Secretaria de Estado da Justiça e Cidadania informou através da assessoria de imprensa que a construção das duas unidades segue no planejamento de novas vagas do sistema prisional catarinense, porém, não há previsão para que os recursos sejam disponibilizados. Os projetos já estão prontos. O novo presídio terá 350 novas vagas e o investimento será de aproximadamente R$ 27 milhões. Já a unidade de semiaberto vai contar com 240 vagas e a obra deve custar cerca de R$ 18 milhões.