Em 1997 o empresário Paulo Cesar Lopes visitava uma feira do setor de supermercados quando recebeu uma oferta de um fornecedor de açúcar: comprar uma carreta do produto a um preço mais competitivo. Como não tinha condições de arcar com o investimento sozinho, ele se juntou a outros empreendedores do ramo para fechar negócio.

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:: Leia mais informações de Pedro Machado

Nascia ali um grupo associativista que já vislumbrava na compra conjunta uma estratégia para barganhar preços e, com isso, competir em melhores condições com as grandes redes varejistas que começavam a ganhar corpo no país. Hoje consolidada, a rede de supermercados TOP, formada por sete sócios, tem 30 lojas em 17 cidades de SC.

– Eu diria, sem medo de errar, que o nosso grupo é um dos mais organizados do gênero no país – destaca o executivo.

Ex-presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL) de Blumenau, Lopes assumiu recentemente o comando da Associação Catarinense de Supermercados (Acats), entidade que representa um segmento que fatura R$ 14 bilhões e gera 75 mil empregos diretos no Estado. À coluna, o empresário falou dos desafios do setor e de mudanças nos hábitos de consumo das pessoas.

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Qual o desafio à frente da entidade?

A Acats é bastante atuante. São 800 associados espalhados pelo Estado em 10 regionais. Segundo o (instituto de pesquisa) Nielsen, temos 2,2 mil lojas em SC, sendo que 78% delas têm menos de 10 checkouts (caixas). É um setor formado por pequenas empresas. O mais difícil é mobilizar tanta gente. Às vezes o supermercadista pequeno é o comprador, gerente, conferente, faz tudo na loja e não tem muito tempo para discutir seus problemas com seus pares. Somos concorrentes no ponto de venda, mas fora dele somos parceiros. Infelizmente nem todo mundo pensa assim. Muita gente acha que associação é só para grandes empresas, mas não é. As grandes têm as suas estruturas. Quem realmente mais precisa da entidade são os pequenos. Mas de uma maneira geral os supermercados catarinenses estão fortalecidos e a gente quer dar continuidade ao trabalho que vem sendo feito. No ano passado treinamos 10,5 mil pessoas em palestras e cursos.

Como está o setor hoje?

A concorrência é grande. Há o canal farma, o atacarejo, os hipermercados, minimercados, as lojas de vizinhança. O leque para o consumidor é enorme, por isso é preciso sempre melhorar para atendê-lo bem e conquistá-lo. As pesquisas mostram que o cliente está cada vez mais infiel. Como existem muitas opções, ele vai experimentar todas e fazer a compra onde for melhor para ele em preço, atendimento e mobilidade. O grande desafio é cativar e atrair esse cliente.

Os supermercados pequenos estão ameaçados pelas grandes redes?

Nas grandes cidades é mais difícil para os pequenos por causa desses grandes players que trazem lojas com mais conforto, ar-condicionado, estacionamento coberto. Mas se analisar o Estado como um todo, temos vários municípios muito pequenos, onde as redes maiores, pelo seu porte, não conseguem se instalar. Então, dependendo do local, eles não estão ameaçados. A ameaça se deve pela concorrência. Se a loja não for boa, outra abre do lado e leva os clientes. Por isso todo mundo se preocupa em melhorar. Em 2015 e 2016 não houve muitas inaugurações (de lojas), mas houve muitas reformas, pequenos mercados comprando balcões, melhorando fachadas, pensando em como sobreviver.

Nessas cidades maiores, o que os pequenos mercados precisam fazer então para serem mais competitivos?

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As lojas grandes têm uma limitação. Então sempre vai ter espaço para as menores, até porque as pessoas já não querem ir muito longe para fazer compras. Elas pegaram o hábito de ir ao mercado quase todos os dias e vão nas lojas menores, mais próximas de casa. A loja pode ser pequena, mas se for arrumada, limpa e tiver um ar-condicionado, ajuda muito. A loja de vizinhança tem o diferencial de os donos e funcionários conhecerem a pessoa pelo nome, saber dos seus hábitos de consumo. O açougueiro sabe qual tipo de corte que o cliente gosta, por exemplo. Isso agrada o cliente.

Como estão as vendas dos supermercados neste ano?

De janeiro a maio tivemos no Estado uma retração de 0,3%. No Brasil, a queda foi de 0,23%. Pela primeira vez Santa Catarina perdeu um pouco em nível de país. No ano passado decrescemos 0,5%, enquanto o Brasil caiu 1,9%. No segundo semestre a tendência é melhorar um pouco. Talvez a gente fique no zero a zero ou talvez haja um crescimento ou perda pequenos.

A que se deve essa queda?

O desemprego está atingindo com mais força Santa Catarina. Essa é a grande preocupação de todo mundo e isso obviamente ocasiona a diminuição da venda. Imagino que superando a crise política a curva deve melhorar. Tudo vem das incertezas. O empresário não investe porque fica temeroso, não sabe o que vai acontecer. Enquanto ele não se decidir e não houver regras mais claras, vai continuar como está.

Quando a situação aperta, qual a primeira coisa que o consumidor corta?

Os produtos mais supérfluos, aquilo que ele realmente não tem necessidade de consumir. Não dá para apontar um item em específico. Há também a substituição de marcas. O cliente acaba levando um produto mais barato ou de embalagens mais econômicas, menores. As pessoas não deixam de comer, mas economizam e consomem menos. Uma coisa que a gente percebe é que o brasileiro desperdiça muito e as pessoas estão mais atentas a isso, a não desperdiçar. Isso faz com que as compras sejam menores.

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Quais são as tendências do setor?

Fui para o maior congresso de varejo do mundo, em Nova York, pela primeira vez em janeiro de 2010. Eram centenas de palestras e só se falava em e-commerce. Voltei com a sensação de que as lojas físicas iam se acabar em todos os segmentos. Quando eu voltei em 2012, a história ja era outra. Falava-se em combinação de loja física com loja eletrônica. E é o que vem acontecendo. Inclusive há cases de lojas que surgiram apenas como e-commerce e depois montaram pontos presenciais. O cliente gosta de ter a experiência de compra, ver as coisas. No nosso segmento isso talvez seja ainda mais evidenciado. A tecnologia também está cada vez mais presente. Hoje você já consegue interagir com o cliente quando ele entra na loja. Já existem aplicativos que avisam que o produto que ele quer chegou ou está em promoção. Essa interação vai acontecer cada vez mais. Acredito que a loja física não vai deixar de existir.