O presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson Braga, mexeu num vespeiro ao defender “medidas duras” em relação a leis trabalhistas durante entrevista coletiva concedida nesta sexta-feira. Ao mencionar que no Brasil a carga é de 44 horas de trabalho por semana, citou o caso da França, que teria, na avaliação dele, perdido competitividade em relação a outros países da Europa em função da jornada reduzida – 36 horas semanais.

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O dirigente deu uma derrapada ao dizer que os franceses estudam ampliar a carga de trabalho de 36 para 80 horas por semana (na verdade são 60), acrescentando que “a gente tem que estar aberto para fazer essas mudanças”. Vários portais noticiaram logo em seguida que a CNI “sugere” ou “defende” aumentar a jornada de trabalho no país para 80 horas semanais, despertando a ira de centrais sindicais, que lutam justamente pelo oposto – redução das atuais 44 horas para 40.

A entidade reagiu. Encaminhou nota oficial no início da tarde alegando que Braga “jamais defendeu o aumento da jornada de trabalho”, que é limitada pela Constituição. De fato ele não falou com todas as letras. Mas nas entrelinhas foi isso que ficou entendido.

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Braga deu a declaração logo depois de ter se reunido por duas horas com Michel Temer. O presidente interino já não goza de muita popularidade. Promover qualquer mudança num aspecto tão delicado só aumentaria a antipatia ao seu governo – por isso é improvável que qualquer medida trabalhista mais restritiva seja posta em prática neste momento.

Mesmo que haja um aumento, talvez não tão grande ao ponto de chegar a 80 horas semanais, elevar a carga de trabalho não é garantia de estímulo à economia. Vários estudos – e quem vive isso na prática sente na pele – já mostram que profissionais que encaram jornadas mais longas sofrem mais com a fadiga, a sonolência e a desatenção. São fatores que favorecem erros e também acabam comprometendo o ânimo do trabalhador, que se desmotiva e produz menos.

O ponto chave da questão é a produtividade. Pesquisas apontam que um americano produz o mesmo que quatro brasileiros. Não é uma mera questão cultural de trabalho. É claro que o comportamento individual de cada um conta muito, mas a produtividade também está fortemente ligada ao nível de escolarização do profissional e do acesso que ele tem a novas tecnologias. Quanto maior a capacitação e melhor a estrutura disponível, mais produtiva será a mão de obra. São esses os desafios a serem vencidos. Aumentar a carga horária é não atacar a raiz do problema.