O número 1.925 da Rua dos Andradas, em Santa Maria, nunca sairá da memória de muita gente. O endereço da boate Kiss, que incendiou em 27 de janeiro e matou 241 pessoas, ficará na lembrança das pessoas, mas precisa ter um novo encaminhamento. Passado o período de investigação da Polícia Civil, que precisava do local para a realização de perícias, e após a entrega da denúncia pela Promotoria, surge a pergunta: o que fazer com o local?
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As opiniões variam. Adriana Krum, coordenadora do plano emergencial de atenção psicossocial às vítimas da tragédia, é uma das que pensa que o prédio precisa ser preservado por mais algum tempo para que as pessoas possam prestar suas homenagens – a frente da boate é um verdadeiro local de peregrinação, tomada por faixas, cartazes e fotos das vítimas.
Também há quem considere que o endereço não pode se tornar em algo como o santuário às vítimas da boate Cromañon, em Buenos Aires. Lá, um varal com tênis com as solas derretidas lembra a luta dos anjos do rock pela vida.
A Associação dos Familiares das Vítimas e Sobreviventes da Tragédia em Santa Maria, que recebeu visita dos pais de jovens argentinos, quer lembrar a vida e não morte. Além disso, o grupo não quer referência ao nome Kiss, como no memorial ao incêndio da boate Cocoanut (leia quadro), em Boston (EUA), que traz a planta do local.
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– Para algumas pessoas, o nome Kiss causa repulsa – comenta o presidente da associação, Adherbal Ferreira.
A intenção, segundo o vice-presidente da entidade, Leo Becker, é fazer um espaço ecumênico, com monumento, flores e gramado. As mensagens recebidas de todas as partes do mundo devem ser projetadas em uma parede, e uma escadaria em caracol com 241 degraus deve homenagear às vítimas.
Os familiares também defendem que sede da entidade deva ser construída no local. Para projetar o memorial, a entidade terá a contribuição de um artesão nascido em Santa Maria e que mora há 20 anos nos Estados Unidos. Por enquanto, o nome é mantido sob sigilo por pedido do próprio artista.
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Nos Estados Unidos, associação levou nove anos para construir memorial
Do projeto à concretização, anos podem se passar. Na cidade norte-americana de West Warwick, local da tragédia da boate The Station em que cem pessoas morreram, a associação dos familiares de vítimas levou nove anos para conseguir que o proprietário liberasse o local para a construção do memorial.
Aqui, para que o memorial seja erguido onde ficava a Kiss, é necessário que ocorra a desapropriação do terreno, que pertence ao investidor do ramo imobiliário Luís Colussi, que já adiantou que só irá se manifestar sobre o assunto quando houver algo concreto. A Associação dos Famílias das Vítimas e a prefeitura de Santa Maria ainda não se reuniram para falar sobre o projeto ou a desapropriação, que só pode ser feito pelo gestor público.
Memoriais pelo mundo
Placa memorial depois de 50 anos
Local: Boston (Massachusetts, EUA)
Tragédia: O mais devastador incêndio em casa noturna do século passado aconteceu em 28 de novembro de 1942, em Boston. Naquela noite, um coqueiro falso, que fazia parte da decoração de um dos salões do Cocoanut Grove, pegou fogo. As chamas se espalharam rapidamente e provocaram a morte de 492 pessoas. A casa noturna estava com capacidade acima das mil pessoas e as portas de emergência não funcionaram adequadamente. Os sobreviventes foram alguns dos primeiros a serem tratados com penicilina
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Memorial: Em 1993, mais de 50 anos após o incêndio, a associação da vizinhança de Bay Village inaugurou uma placa memorial perto de onde ficava a boate. A placa foi desenhada pelos sobreviventes mais jovens da tragédia e traz uma réplica da planta baixa, com os desenhos dos coqueiros e o nome da casa noturna
Após nove anos, terreno para memorial
Local: West Warwick (Rhode Island, EUA)
Tragédia: O incêndio no dia 20 de fevereiro de 2003 na boate The Station, na cidade de West Warwick, iniciou-se pelo uso de pirotecnia no show da banda de hard rock Great White, que distribuiu vários ingressos gratuitos para a apresentação. As chamas se espalharam pela espuma de isolamento acústico nas paredes e tomaram conta do lugar em menos de cinco minutos, matando 100 pessoas. O local estava superlotado, não tinha sido fiscalizado e não tinha saídas de emergência adequadas. O advogado das vítimas, John Barylick, contou os detalhes da tragédia no livro The Killer Show (O Show Matador)
Memorial: Depois de nove anos de pressão pública, os ex-proprietários da The Station doaram o terreno para a associação das vítimas em janeiro de 2013. As obras do memorial, que remeterá à paz, devem começar em breve. Ao lado do local, cruzes foram colocadas por familiares
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Santuário em Buenos Aires
Local: Buenos Aires (Argentina)
Tragédia: O incêndio em 30 de dezembro de 2004, na boate Republica Cromañon, na periferia de Buenos Aires, causou a morte de 194 jovens e deixou mais de 1,4 mil feridos. Um dos integrantes da banda de rock Los Callejeros acendeu um sinalizador lançado contra o teto forrado com espuma de isolamento acústico. A boate não tinha plano de prevenção de incêndio, não tinha passado por fiscalização, não havia saídas de emergência, os extintores não funcionaram e o botão de alarme estava travado com um chiclete mascado
Memorial: No terreno ao lado de onde ficava a Cromañon, os familiares e sobreviventes ergueram de forma espontânea um santuário aos anjos do rock, como são conhecidas as vítimas. O santuário tem um varal com tênis das vítimas, alguns com as solas derretidas pelas chamas. Também há cruzes, sepulcros, fotos e escudos de times de futebol
Homenagem em formato de catedral
Local: Pern (Rússia)
Tragédia: Um show de fogos de artifício no aniversário da boate Lame Horse Club, em Pern, causou a explosão que obstruiu a única saída do local e provocou 154 mortes. Mais de 90 pessoas morreram na hora e as demais nos hospitais locais e de São Petersburgo
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Memorial: Exatamente dois anos após a tragédia, familiares e amigos inauguraram um memorial em formato de catedral perto de onde ficava a boate. A construção de cerca de 3metros traz a lista de vítimas e está cercada por um cubo de vidro