Há mais de duas semanas, Maria Rosália Corsani não vê a própria casa. Depois daquela madrugada de terror, quando acordou com a água batendo no colchão, a única notícia que teve da propriedade era de que apenas o telhado não ficara submerso. É hora de voltar e recomeçar. O jardim tratado com esmero, as roseiras delicadas, a grama verde aparada com cuidado, cenário das fotos no álbum de família, deram lugar a troncos, corpos de animais e lodo.
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Achava que lá estaria segura, pois o terreno, na região do Poço Grande, em Gaspar, estaria fora da enchente. Mas o que viu foi o lar conquistado com suor do trabalho de professora e do marido, agricultor, ser consumido pela correnteza do Itajaí-Açu. Lembranças, roupas e tudo que havia na casa, se não foi embora, está embebido numa mistura fétida. Da casa mista, apenas a cozinha, feita de tijolos, pôde ser aproveitada. Mas o mais importante estava preservado.
Maria Rosália chegou a pensar que o fim estava próximo. Quando foi expulsa de casa pela água barrenta, ela e os três filhos pequenos pegaram carona com um vizinho numa bateira até a casa do pai, idoso, e do irmão. No imóvel de dois andares, estaria segura com parentes e outra família que lá foi buscar refúgio. Enganou-se. A água, que parecia persegui-la, entrou na casa com o cair da noite, empurrando-os para o segundo andar. A correnteza levava tudo o que encontrava.
Ao amanhecer, o irmão de Maria Rosália, tomou a decisão de enfrentar o Itajaí-Açu. Com a bateira que naquela noite ficou ancorada na sala, saiu em busca de abrigo. Diante do que via, ela acreditou que o irmão não voltaria. Mas foi só quando ele retornou e ela própria precisou enfrentar o medo da água, de olhos fechados e abraçada aos três filhos na bateira, que teve certeza que sobreviveria para encarar outras batalhas que aquela enchente iria lhe impor.
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