A procuradora do Ministério Público Federal Analúcia Hartmann defende que Florianópolis não pode correr o risco de aprovar uma colcha de retalhos que leve à discussões jurídicas sobre a cidade. Para Analúcia, a prefeitura não deveria tentar reverter a liminar obtida na noite de segunda-feira, pois se a lei for aprovada e o processo julgado, todo o procedimento de votação será anulado.
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A votação do projeto do Plano Diretor foi suspensa nesta segunda-feira. A Justiça acatou o pedido do Ministério Público Federal que questiona alguns pontos do trâmite na elaboração do projeto.
Sete anos de discussões sobre o Plano Diretor. A senhora não acha que essa decisão atrasará ainda mais a aprovação do plano?
Analúcia Hartmann – Não. Corremos o risco de aprovar uma colcha de retalhos, que pode gerar inúmeros impasses jurídicos. Muita gente não sabe o que está sendo proposto. Dá até medo.
A senhora sabe que o Plano Diretor lida também com interesses particulares. Não teve receio de que essas críticas estivessem ligadas a esses interesses, que não são do coletivo?
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Analúcia – Nós recebemos reclamações de membros do Núcleo Gestor, de sete distritos, mais da metade dos distritos de Florianópolis, do CREA, OAB e outras entidades. Parece que por meio delas a sociedade nos informou que não foi ouvida. Ainda, a administração se negou a fazer as 13 audiências públicas de verdade, nos distritos, que o Núcleo Gestor aprovou em reunião que teve a presença do Dalmo (Vieira Filho, superintendente do Ipuf).
Acha que o juiz irá acatar recurso proposto pela prefeitura?
Analúcia – Acho que não vale a pena a prefeitura recorrer. Mesmo que consiga liminar na justiça para derrubar a liminar que conseguimos na noite de segunda-feira, depois essa ação pode ser julgada no mérito e todo o processo de tramitação ser anulado. Seria melhor retomar as audiências como diz a decisão.
>>> “Toda a documentação está disponível”, afirma secretário Dalmo Vieira Filho sobre Plano Diretor
Os cinco pontos questionados pelo Ministério Público
Audiências Públicas
Segundo Analúcia Hartmann, procuradora da República, nos sete anos em que o Plano Diretor foi discutido houve participação popular. Mas quando o projeto já estava consolidado e deveria ir para discussão final, esse processo foi interrompido.
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Para ela, foi realizada apenas uma audiência pública, o restante foram reuniões. Não houve participação efetiva da população. A procuradora diz que teve acesso a registros das reuniões e em algumas os funcionários do Ipuf não sabiam responder os questionamentos da comunidade. Em outra, não teve quórum. Além disso, de acordo com ela, a única audiência pública que ocorreu não teve aviso com 15 dias de antecedência e ampla divulgação na mídia, como manda o Ministério das Cidades.
Tramitação na Câmara
A procuradora da república alega que a tramitação foi muito rápida na Câmara. Analúcia recebeu a informação de que o procurador da Câmara teve que emitir parecer sobre o projeto de lei em um dia e acredita que o número de emendas indica que alguma coisa estava errada.
Ela afirma que tem gravações da audiência pública proposta pela Câmara em que o secretário Dalmo diz que é para que a pessoa encaminhe a documentação que ele vai incorporar ao projeto. De acordo com ela, isso deveria ser feito quando o anteprojeto estava no executivo e não transformando as sugestões em emenda.
Dissolução do Núcleo Gestor
O Núcleo Gestor, conforme Analúcia, foi dissolvido depois de uma reunião antes da entrega do projeto de lei à Câmara de Vereadores. Na reunião, em que o secretário Dalmo estava presente, os membros do núcleo votaram pela realização de 13 audiências públicas nos distritos. A procuradora afirma que o secretário não concordou com o posicionamento. Logo após, um decreto revogou o Núcleo Gestor, que havia sido legalmente formado no início do mandato do prefeito Cesar Souza Júnior para contribuir com as discussões do Plano Diretor. O rompimento com o Núcleo Gestor, de acordo com ela, foi unilateral.
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Falta de parceria com Ministério das Cidades
O secretário Dalmo, segundo Analúcia, disse que pediu orientações para o Ministério das Cidades para elaboração do Plano Diretor. No entanto, ela disse que entrou em contato com a Advocacia Geral da União, mas que eles informaram que nunca prestaram esclarecimentos à prefeitura. O Ministério das Cidades também foi criticado pelo MPF porque não fiscalizou as discussões do Plano Diretor em Florianópolis.
Transparência com o projeto
Conforme a ação civil pública movida pelo MPF, não teriam sido disponibilizados o anteprojeto, os mapas e as plantas do Plano Diretor em local que a população pudesse ter acesso para poder questionar nas supostas audiências públicas. Analúcia diz que tentou encontrar documentações no site da prefeitura, mas não obteve acesso. A procuradora ainda argumenta que os vereadores receberam as plantas do Plano depois que ele entrou em tramitação. Para ela, isso significa que não estavam prontas e não puderam ser avaliadas pela população.
Um terço dos entrevistados diz desconhecer o projeto
Cerca de um terço (35%) dos entrevistados em uma pesquisa do Instituto Mapa declarou não ter conhecimento do que seja o Plano Diretor, mas 79% dizem acreditar que está de acordo com o que almejam para a cidade. A maioria (75%) também demonstra incredulidade no cumprimento das ações. Temas que envolvem a revitalização da Baía Sul e do Centro e as diretrizes para novas construções são os principais pontos de discordância, segundo a pesquisa. Do documento de mais de 100 páginas da prefeitura, composto por 329 artigos, o Mapa selecionou 36 temas considerados os mais discutidos publicamente.