A pesca da tainha precisa de limites. A constatação faz parte de um estudo produzido pela organização internacional Oceana, que envolveu alguns dos maiores especialistas em pesca no país e concluiu que há um excesso de capturas no Sul e Sudeste. A ONG prepara um dossiê para o Ministério da Agricultura em que sugere estabelecer cotas de captura – uma maneira de proteger as populações de tainha e as mais de 10 mil pessoas que têm na pesca dos cardumes uma fonte de sustento e renda.
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A recomendação é que o limite fique em 4,3 mil toneladas anuais no Sul e Sudeste do país para todas as modalidades de pesca de tainha. É pouco mais do que as 3,5 mil toneladas capturadas somente pela pesca artesanal de Santa Catarina neste ano.
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Para se ter uma ideia do que isso significa, de 2000 a 2015 – o período analisado pelo estudo – em apenas cinco safras o volume de captura ficou abaixo de 4,3 mil toneladas. É menos de um terço do que foi capturado em 2007, por exemplo, ano em que ocorreu uma supersafra com mais de 13 mil toneladas de tainhas pescadas.
A delimitação levou em conta dados de sete modalidades de pesca diferentes, entre industriais e artesanais. Há lacunas, já que as iinformações não são completas – em Santa Catarina, por exemplo, não há informações sobre a captura industrial entre 2012 e 2014.
O que motivou a Oceana a fazer o acompanhamento dos desembarques em 2015, para que houvesse mais consistência na apuração.
Cruzadas as informações que vieram de instituições como o Instituto de Pesca de São Paulo, a Universidade Federal do Rio Grande (FURGS) e o Grupo de Estudos Pesqueiros da Univali, em Itajaí (GEP), os pesquisadores chegaram à conclusão de que a biomassa de tainhas, que corresponde ao peso dos cardumes, reduziu 22% em 15 anos.
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– Os resultados mostram que a população de tainhas nesta região já sofre uma redução considerável, e que a pressão de pesca está relativamente alta. Quando integramos estes resultados com o fato de que a pesca da tainha acontece na época da desova, quando cardumes enormes se formam para a migração reprodutiva anual, vemos que a única forma de manter esta pesca ativa e sustentável por longo prazo é estabelecermos uma cota razoável e baseada em resultados científicos – diz Luiz Barbieri, pesquisador do Fish and Wildlife Research Institute (FWRI).
“Um esforço de pesca maior do que a tainha aguenta”
Mônica Perez, diretora da Oceana no Brasil, usa uma analogia para falar da relação entre estoques de tainha e captura:
– É como ter uma caderneta de poupança e gastar além dos juros, consumir o dinheiro que se tem guardado. O estoque está abaixo do necessário para render o máximo. E ainda assim, estamos com um esforço de pesca maior do que a tainha aguenta – avalia.
O cálculo feito pelos pesquisadores, que resultou na delimitação da cota, aponta o quanto é possível pescar sem comprometer a capacidade biológica da população de tainhas a longo prazo, o que eles chamam de Rendimento Máximo Sustentável (RMS). Para manter a pesca com segurança, ou seja, sem ameaçar a tainha, é preciso limitar a captura de forma que o peixe consiga voltar a ocupar seu espaço gradativamente – algo que as atuais medidas de redução de esforço (menos barcos pescando) podem não ser capazes de fazer sozinhas.
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A proposta será apresentada ao governo na próxima semana, quando o Comitê Permanente de Gestão (CPG) de pelágicos – grupo de peixes que inclui a tainha – se reunirá na sede do Ministério da Agricultura em Brasília.
*A jornalista viajou a Brasília a convite da Oceana