Com seus ataques ao regime de Bashar al-Assad, Estados Unidos, França e Reino Unido não têm a intenção de “salvar os sírios da brutalidade”, mas “recuperar parte de seu prestígio”, afirmou em entrevista à AFP Yassin al-Haj Saleh, um proeminente opositor sírio.

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No último fim de semana, essas três potências ocidentais atingiram alvos militares do governo sírio em resposta ao suposto ataque químico que este teria executado em 7 de abril na localidade de Duma, situada perto de Damasco e então sob controle rebelde. Lá, morreram mais de 40 pessoas, de acordo com ONGs médicas.

O próprio presidente francês, Emmanuel Macron, reconheceu na terça-feira que os ataques aéreos contra instalações de armas químicas “não solucionaram nada” do conflito, que já dura sete anos e deixou mais de 350 mil mortos e milhões de deslocados e refugiados. E acrescentou que realizaram pela “honra da comunidade internacional”.

Em sua passagem por Madri para promover seu último livro, Yassin al-Haj Saleh se mostrou extremamente crítico. Afirmou que as três potências ocidentais não pretendem “proteger nossas vidas e salvar os sírios da brutalidade”, mas “recuperar parte de seu prestígio e expressar seu incômodo com os russos e, sobretudo, com os iranianos”, os grandes apoios exteriores do governo de Damasco, por tolerar o uso de armas químicas.

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Segundo este intelectual, de 57 anos, a mensagem que enviam a Assad é a seguinte: “Seja educado, não cruze nossas linhas vermelhas e continuará no poder. Não temos problemas com você, temos problemas por você usar armas químicas, mas continue matando com barris explosivos, torturas e de outras maneiras”.

Yassin al-Haj Saleh esteve na prisão de 1980 a 1996 por sua oposição ao então presidente Hafez al-Assad, pai de Bashar. Conseguiu sair da Síria no final de 2013 e atualmente colabora como pesquisador com o Instituto de Estudos Avançados de Berlim, onde redige um trabalho comparativo sobre crimes de massa.

Também escreve para jornais em árabe como Al-Hayat, Al-Quds al-Arabi e Al-Jumhuriya.

Em espanhol acaba de publicar o livro “Síria, a revolução impossível”, uma compilação de textos escritos desde o início do conflito sírio, em 2011, e nos quais analisa as múltiplas vertentes do mesmo.

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– Síria ‘sob ocupação russa e iraniana’ –

Segundo ele, a influência de Teerã e Moscou em seu apoio a Assad é tal, que o país se encontra “sob ocupação russa e iraniana”, e afirma ter a impressão de que as potências ocidentais deixaram o caminho livre à Rússia “para administrar a situação na Síria”.

Mas o que mais o inquieta é que “temos um regime genocida na Síria, que tem sido tolerado há sete anos” e inclusive poderia logo se ver “reabilitado pelas superpotências do mundo”.

Yassin al-Haj Saleh afirma não ter “nenhuma esperança na administração americana ou na presidência de Macron” ao exigirem responsabilidades ao regime sírio pelas muitas atrocidades que lhe atribuem.

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A “Síria é um símbolo global de injustiça e aniquilação, e o regime continua imune, sem que haja perspectivas de que lhe peçam para prestar contas”, continua.

O dissidente e escritor analisa a possibilidade de permanecer na Alemanha, embora ainda não saiba. Nesse país chegaram em 2015 cerca de um milhão de refugiados, boa parte deles compatriotas sírios.

Yassin al-Haj Saleh lamenta que a repentina chegada de refugiados tenha sido “explorada pelo Alternativa para Alemanha”, partido de ultradireita que entrou no Parlamento nas eleições de setembro.

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Embora, para ele, o problema não esteja tanto nas formações abertamente ultradireitistas, mas sim nos políticos dos partidos tradicionais que se deixam levar pelas ideias daqueles.

“São oportunistas (…) e não são firmes no momento de lutar pela igualdade, justiça e pelos direitos das pessoas. Me dá a impressão de que os políticos da direita (tradicional) estão entre a cruz e a espada, e isso não é bom nem para eles nem para o futuro da Europa”.

* AFP