*Por Jane E. Brody
As paralisações e os temores provocados pela pandemia de Covid-19 atrapalharam muitos aspectos da assistência médica de rotina, especialmente para pessoas mais velhas, justificadamente preocupadas com a exposição ao vírus em um ambiente médico. Embora muitas instalações tenham agora criado “espaços seguros” para a retomada dos serviços presenciais, o adiamento de exames de rotina pode ter um grande impacto na gravidade de uma doença não detectada ou não tratada, e às vezes até mesmo nas chances de sobrevivência.
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Um deles é a mamografia, especialmente para mulheres com 75 anos ou mais, grupo ao qual pertenço e que há anos tem recebido conselhos conflitantes sobre a necessidade e a frequência ideal do exame.
Por um lado, não há como negar que o câncer de mama se torna cada vez mais comum à medida que as mulheres envelhecem, e que detectar esse câncer em seus estágios iniciais normalmente resulta em um tratamento mais simples e eficaz.
Por outro lado, pode ser melhor para algumas mulheres mais velhas não saber que têm câncer de mama, porque é possível que morram de outra causa muito antes de um câncer de mama não diagnosticado e não tratado ameaçar sua vida. No entanto, uma vez que são informadas da existência da doença depois de uma mamografia de rotina, é preciso enfrentar uma decisão em relação ao tratamento, que pode ter um impacto negativo em seu bem-estar emocional e físico.
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Complicando ainda mais as coisas, temos a atual incapacidade dos especialistas de dizer com certeza quais tipos de câncer de mama podem não necessitar de nenhum tratamento, pois são muito lentos e pouco fatais, e até mesmo ter o potencial de desaparecer por conta própria. Um estudo norueguês publicado em 2008 encontrou menos câncer de mama invasivo entre as mulheres examinadas apenas uma vez em seis anos do que entre um grupo comparável que fazia exames bianualmente por seis anos, sugerindo que certos cânceres detectados por mamografia nesse último grupo teriam regredido espontaneamente.
Embora a incidência e a mortalidade associadas ao câncer de mama aumentem com a idade, há algumas evidências que sugerem que, em geral, a doença em mulheres mais velhas tende a ser menos agressiva e mais propensa a ter um prognóstico favorável. Agora, é possível obter um teste genético chamado Oncotype DX, que prevê o risco de uma recidiva e a provável resposta da doença à quimioterapia.
Dadas as muitas diretrizes conflitantes e as estatísticas confusas, tomar uma decisão racional sobre o exame pode ser bastante desafiador, especialmente para quem conhece outras pessoas que descobriram ter um câncer curável em seus últimos anos. Três de minhas amigas com mais de 70 anos receberam o diagnóstico de câncer de mama pouco antes da pandemia ou durante o confinamento, deixando-me – uma sobrevivente de câncer de mama de 79 anos – desconfortável por faltar ao meu exame anual, que agora marquei para setembro.
As diretrizes da Sociedade Americana do Câncer para mulheres com risco médio de desenvolver câncer de mama aconselham mamografias anuais a partir dos 45 anos (ou 40 anos, se a mulher preferir), mudando para cada dois anos (ou todos os anos, se preferir) aos 55 anos e continuando a cada ano ou dois, enquanto permanecerem saudáveis o suficiente para ter uma expectativa de vida de dez anos ou mais.
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A Força-Tarefa de Serviços Preventivos dos EUA, porém, recomenda interromper as mamografias de rotina aos 75 anos, independentemente da expectativa de vida da mulher. No entanto, existem outras diretrizes profissionais que recomendam exames contínuos para mulheres com boa saúde e uma expectativa de vida de pelo menos cinco anos.

Há também dados de uma análise de 763.256 mamografias realizadas entre 2007 e 2017 que encontraram câncer em 3.944 mulheres, sendo que dez por cento delas tinham mais de 75 anos. A autora do estudo, dra. Stamatia Destounis, radiologista do Elizabeth Wende Breast Care, de Rochester, em Nova York, relatou que a maioria dos cânceres em mulheres mais velhas eram invasivos e deveriam ser tratados. Quase dois terços tinham potencial para se espalhar e crescer rapidamente.
Destounis disse à “Healthline”: “Há benefícios na triagem anual depois dos 75 anos. A mamografia continua detectando cânceres invasivos nessa população, sem nódulos e de baixo estágio, permitindo que essas mulheres sejam submetidas a tratamento menos invasivo. A idade para interromper a triagem deve ser baseada no estado de saúde de cada mulher, e não ser definida por sua idade.”
Ao mesmo tempo, as mulheres estão vivendo mais e passando a maior parte desses anos extras de forma produtiva e com saúde razoavelmente boa. Destounis afirmou que encontrar um câncer invasivo precoce que pode ser tratado com cirurgia mínima e terapia pós-operatória pode significar muito, não só para essas pacientes, mas também para sua família e sua comunidade.
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Ainda assim, há um fato que todas as mulheres mais velhas devem saber: de acordo com Diana Miglioretti, bioestatística da Universidade da Califórnia, em Davis, “não há provas de ensaios controlados randomizados sobre se o exame em mulheres com 75 anos ou mais reduz a mortalidade por câncer de mama. As provas sugerem que os benefícios da mamografia só são vistos dez anos depois”. Ela afirma que também há o risco de exagero no diagnóstico, algo que aumenta com a idade – encontrar um câncer que não prejudicaria a vida da paciente.
Em uma entrevista, a dra. Mara A. Schonberg, do Beth Israel Deaconess Medical Center, em Boston, expressou as mesmas preocupações de Miglioretti: “O diagnóstico exagerado em mulheres mais velhas é um problema, e mesmo encontrar câncer de mama nem sempre é bom. São necessários pelo menos dez anos de mamografias de mil mulheres de 50 a 74 anos para evitar uma morte por câncer de mama, e provavelmente ainda mais em mulheres com mais de 75 anos, para as quais a doença tende a ser mais lenta. Não está claro se o tratamento agressivo que as idosas recebem é necessário.”
Além disso, entre mil mulheres de 75 a 84 anos que continuam fazendo mamografia por cinco anos, cem terão um alarme falso, criando ansiedade e iniciando uma série de exames que não comprovam o câncer. Com a mamografia continuada, depois de cinco anos três mulheres mais velhas em mil morrerão de câncer de mama, contra quatro que não fazem mamografia, informou Schonberg. Ela também observou que, entre as idosas de 75 a 84 anos que morrerem nos próximos cinco anos, 12 vezes mais vão sucumbir a doenças cardíacas do que ao câncer de mama.
Para ajudar a decidir se é melhor continuar a fazer mamografias regulares depois dos 75 anos, Schonberg e seus colegas criaram uma ferramenta de auxílio, disponível em inglês e espanhol.
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São dez perguntas sobre idade e estado de saúde, incluindo peso, capacidade física, tabagismo e condições pré-existentes como diabetes. Quanto menor o risco de saúde da mulher, menor a pontuação e maior a probabilidade de uma mamografia ajudá-la a viver mais.
Schonberg disse que espera que, antes de prescrever uma mamografia às pacientes mais velhas, os médicos primeiro as façam completar o questionário de auxílio à decisão.
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