O papa Francisco começa a ir bem além do discurso.

Em um tom contundente, ele criticou os integrantes da Cúria Romana e definiu a cúpula do clero como “a lepra do papado”, em entrevista ao jornal italiano “La Repubblica”.

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Também nesta terça-feira, ele se reuniu pela primeira vez com os oito conselheiros cardeais visando uma reforma da Igreja, que ele deseja mais engajada socialmente, que dialogue com os não-crentes e livre da corrupção. Seu objetivo é modificar radicalmente a Cúria.

Pode ser a maior mudança já ocorrida na estrutura da Igreja Católica em 25 anos.

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– É o início de uma Igreja concebida como uma organização não somente vertical, mas também horizontal – explicou Francisco ao La Repubblica.

Na mesma ocasião, ele lamentou uma “visão muito vaticano-centrada que ignora o mundo ao seu redor”, anunciando que fará o possível para mudar isso.

Foi em sua biblioteca particular que Jorge Mario Bergoglio deu início a reunião de três dias com os oito cardeais. Conselheiros, que “não são cortesões, mas sábios”. Sinal de que a colegialidade está na ordem do dia, os oito prelados devem analisar 80 documentos que resumem várias propostas.

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Outro sinal de abertura, entre tantos: pela primeira vez em sua história, o Instituto para as Obras de Religião (IOR), o “banco do Papa”, publicou, igualmente nesta terça-feira, suas contas para 2012, em seu novo site. Trata-se de uma transparência sem precedentes. De acordo com o jornal Corriere della Sera, o banco decidiu fechar cerca de 900 contas, incluindo as de três embaixadas (Irã, Indonésia e Iraque), em razão de “suspeitas de lavagem de dinheiro e financiamento terrorista”.

Procurado pela agência de notícias France Presse (AFP), um porta-voz do IOR não confirmou, mas também não negou esse número. Indicou que o fechamento de contas não está ligado, necessariamente, a uma suspeita de atividade ilícita.

A própria entrevista em que o Papa fez essas declarações é tida, por si só, como revolucionária. Francisco recebeu recebeu na semana passada, na residência Santa Marta, o fundador ateu do jornal de orientação esquerdista, Eugenio Scalfari, com quem já havia dialogado em colunas interpostas no La Repubblica, em setembro. Na entrevista, o Papa e o jornalista discutiram a fé e a descrença, os valores éticos, do clericalismo e do espírito, o marxismo, com espantosa liberdade de tom.

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O Concílio Vaticano II (1962-1965), lembrou o Papa, “decidiu olhar para o futuro com um espírito moderno. Os padres conciliares sabiam que a abertura à cultura moderna significava o ecumenismo religioso e o diálogo com os não crentes”.

– Desde então, pouco foi feito nesse sentido. Eu tenho a humildade e ambição de querer fazer – disse.

Jorge Bergoglio ainda citou o cardeal jesuíta italiano Carlo Maria Martini, à frente dos reformistas e falecido em 2012, que havia acusado a Igreja de “ter 200 anos de atraso”. Outras passagens marcantes dessa entrevista são a crítica virulenta aos “cortesões da Igreja”, e a denúncia do “liberalismo social”.

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– Os maiores males que afligem o mundo são o desemprego dos jovens e a solidão em que os idosos são deixados – disse Francisco, incorporando questões sociais que são queridas para ele.

O “liberalismo selvagem” resulta em “tornar o forte mais forte, os fracos mais fracos e os excluídos mais excluídos”, denunciou.

Ainda que nunca tenha sido convencido pelo marxismo, ele afirmou ter encontrado alguns “aspectos” marxistas na doutrina social da Igreja. O pontífice ainda pediu à Igreja que se comprometa mais com o mundo moderno e afirmou que “os chefes da Igreja geralmente têm sido narcisistas, amantes da adulação e excitados de forma negativa por seus cortesões”.

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