As cordas do balanço sem movimento e o silêncio ensurdecedor entregam que a creche Cantinho Bom Pastor, em Blumenau, está vazia. O que antes era um ambiente alegre, agora se transforma em dor, que enche de lágrimas os olhos das famílias que entram e saem da unidade para pegar as mochilas dos filhos que escaparam do ataque à unidade.
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Os materiais estão colocados no corredor de entrada da instituição, ao lado do parquinho onde brincavam as crianças. As famílias chegam devagar, passo a passo se aproximam da porta de entrada, e só alguns minutos depois tomam coragem de tocar a campainha.
Mas tocam.
Uma pessoa, então, abre o portão de ferro e os pais, sem nem sequer erguer o olhar, se direcionam para o gancho que segura o pertence dos pequenos. O movimento se repete a cada vez que uma nova família chega no local.
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Ursinhos de pelúcia, flores, velas e cartas foram colocadas ao longo da noite no piso em frente à escola, pintado em tinta colorida. A amarelinha desenhada embaixo de todas as homenagens está sem cor, do dia pra noite parece ter ficado desbotada. É nesse pequeno espaço que a emoção toma conta de cada pai que precisa entrar na escola.
— Estou me segurando para não cair aqui, é muito triste. Não tenho palavras para esse momento, e nem para o que foi para mim entrar ali — diz uma das mães ao sair da creche com duas mochilas rosas penduradas nas costas.
As filhas, que estudavam no Cantinho Bom Pastor, aguardavam por ela no carro. Assim como tantos outros pais que vieram com os filhos em um movimento rápido de entrar e sair da creche apenas para pegar os materiais.
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“Saí correndo do hospital, gritando”
Uma família que não quis se identificar tentou pegar a mochila logo no início da manhã desta quarta-feira, mas ninguém os atendeu. O filho, de 5 anos, era da mesma turma das vítimas do ataque e estava com os amigos no parquinho brincando quando a tragédia aconteceu. Ele costuma ficar apenas meio período à tarde na instituição, mas na manhã de terça-feira por uma urgência da família, precisou entrar pela manhã na creche.
— Eu tinha feito cirurgia e ia ganhar alta, quando eu vi que isso tinha acontecido onde ele estuda, sai correndo do hospital, gritando. Ainda estou em choque, vim pedindo para que nada acontecesse com ele, porque se não eu ia querer ir junto. Nem lembrei da mochila, ele que falou quando chegou em casa: “Minha mochila, papai” — relata.
Os bancos coloridos no interior da creche foram colocados para o lado de fora. Ali, pessoas que passam se sentam e deixam a emoção tomar conta. Não podia ser diferente. O sentimento de angústia se mistura com a revolta pelos amigos dos filhos que perderam a vida.
— Não dá para acreditar, olha o que esse homem fez aqui. Que dia triste — desabafa um pai que apesar de não ter filhos estudando na creche, estava em processo de matrícula no local.
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O homem que abre a porta a cada vez que a campainha toca também não quis se identificar. Cabisbaixo, ele afirma estar “juntando os cacos” para conseguir estar ali.
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Enquanto isso, moradores de toda a cidade passam, e em um momento de oração deixam suas condolências aos envolvidos no ataque.
— Moro no Água Verde, mas não tinha como não vir aqui. Eu vou ir na capela rezar ainda, mas tinha que passar aqui, é realmente muito triste isso, essas crianças tão inocentes brincando — fala dona Maria, que chegou de ônibus no local.
Nesta quarta-feira (5), quatro crianças morreram quando um homem invadiu o cantinho Bom Pastor com uma machadinha, no meio da manhã. Todas brincavam no parquinho com as professoras. Outras cinco ficaram feridas e passam bem. Todas tiveram alta.
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Exatas 24 horas depois, o movimento na creche se mantém. Carros, pessoas a pé, há ainda quem chegue, pare na entrada e não continue o caminho quando o choro chega.
— O dia mais triste da minha vida — conta o pedreiro Orgacir, que trabalhava ao lado da creche quando a tragédia aconteceu.
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