É aceitável que áreas sem concorrência se submetam a alguma forma de vigilância. O que não deve ser estimulado é a manipulação de instrumentos à disposição das autoridades para que os índices fiquem dentro das metas.
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Intensificou-se no Brasil, a partir da preocupação com a inflação, o debate sobre eventuais distorções no uso pelo governo dos mecanismos de regulação de preços. É uma discussão que interessa a todos e serve de alerta aos pretendentes ao principal cargo da República, nas eleições de outubro, para que sejam tornadas públicas as suas posições em relação ao livre mercado. A controvérsia originou-se em declaração do ministro-chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, segundo o qual o Executivo admite interferências pontuais para administrar os preços da energia e dos combustíveis, com o objetivo de segurar os índices inflacionários.
Logo depois, seu colega Guido Mantega, da Fazenda, afirmou que o Planalto não faz intervenções artificiais nas tarifas, admitindo apenas que o Executivo cumpre suas atribuições em relação aos preços administrados. O esclarecimento pode não ter sido suficiente para convencer economistas, empresários e, enfim, agentes econômicos das mais variadas áreas de que há, sim, a tentação de alguns setores pela interferência, sob o pretexto de que o mercado não é capaz de atuar sem regulações.
Para os brasileiros em geral, e não só para quem se dedica a alguma atividade empresarial, a inflação é o fantasma sempre presente, apesar de mantida em patamares considerados aceitáveis nos últimos anos. Nem mesmo o cenário mais recente, em que o índice oficial se mantém perigosamente próximo do teto da meta, pode justificar intervenções estatais no mercado, nos moldes das que se repetiram em experiências fracassadas. O que o país admite, e faz parte da política econômica, é a ingerência governamental nos chamados preços administrados – de energia, água, medicamentos, planos de saúde e outros -, desde que submetida às normais legais e à racionalidade. É enganoso pensar que tal procedimento, marcadamente de exceção, possa ser estendido a outras áreas. Também é diversionista qualquer tentativa de administrar tais preços, decisivos na composição do custo de vida, com mecanismos artificiais, como demonstram os indícios de interferência nas tarifas dos derivados de petróleo.
É aceitável que áreas sem concorrência, como a da energia, ou com forte componente social, como a dos medicamentos, se submetam a alguma forma de vigilância, desde que o governo leve em conta os custos reais de cada atividade. O que não deve ser estimulado, mesmo que crie a falsa impressão de controle da inflação, é a manipulação de instrumentos à disposição das autoridades, para que os índices fiquem dentro das metas estabelecidas.
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O livre mercado, com o acompanhamento excepcional de alguns setores, previsto em lei, não tem substituto, como comprovam os resultados desastrosos dos que desafiaram seus fundamentos com planos mirabolantes. A melhor receita para a oferta equilibrada de bens e serviços é o estímulo ao investimento e à produção.