O diálogo para superar a crise política venezuelana foi congelado: a oposição anunciou que voltará à mesa de negociações apenas quando o governo aceitar adotar uma saída eleitoral para o conflito – uma possibilidade remota – e libertar os “presos políticos”.
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As conversas ficam estancadas, às vésperas da terceira reunião do processo iniciado em 30 de outubro sob a mediação do papa Francisco e da União de Nações Sul-Americanas (Unasul).
“Continuamos no mecanismo de diálogo, mas não vamos participar”, declarou o secretário-executivo da coalizão Mesa da Unidade Democrática (MUD), Jesús Torrealba, referindo-se ao encontro com o governo nesta terça-feira (6).
Segundo ele, a oposição manterá contato “unicamente” com os facilitadores, em especial com os representantes do Vaticano.
Nesta terça, dois delegados da MUD se reuniam com o monsenhor Claudio María Celli, enviado do papa Francisco, para conversar sobre os “presos políticos”, especialmente um grupo de 14 pessoas que se declarou em greve de fome no domingo (4).
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A MUD já havia antecipado que deixaria a mesa, se o governo Nicolás Maduro se negasse a cumprir o que foi acertado. Essa lista de demandas inclui uma saída eleitoral para a crise, seja pela reativação do processo para um referendo revogatório contra Maduro – suspenso em 20 de outubro -, seja pela antecipação das eleições previstas para 2018.
O presidente Maduro descarta que esse tema e a libertação dos opositores presos – outra exigência prioritária – entrem na agenda de discussões.
“Não vejo que o governo esteja disposto a ceder nos pedidos essenciais da MUD (…), porque perderia em todos os cenários”, disse à AFP a cientista política Francine Jácome, para quem o diálogo nessas condições é “inviável”.
Choque com Vaticano
A MUD também quer que o governo aceite doações internacionais de alimentos e de remédios e que a Justiça suspenda a medida de “desacato” ditada contra o Parlamento, de maioria opositora.
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“Seria negador do que é uma negociação permanecermos sentados ali como se não estivesse acontecendo nada. O governo não apenas descumpre, como nega todos os acordos”, afirmou Torrealba, em seu programa de rádio.
Maduro também acusa a MUD de descumprir seus compromissos, em particular os que permitiriam que o Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) revogasse a medida de “desacato” contra o Poder Legislativo.
Acusada pela oposição de servir ao chavismo, a corte inabilitou a Assembleia de empossar três deputados, cuja eleição foi suspensa por suspeita de fraude. Apesar de terem pedido sua desvinculação em 15 de novembro, o TSJ exige que sejam afastados mediante um ato parlamentar.
Enquanto isso, o governo vem reiterando que não vai abandonar o diálogo.
“Nós não vamos sair daqui”, declarou na segunda-feira (5) o número dois do chavismo, Diosdado Cabello, ao criticar em duros termos o secretário de Estado do Vaticano, Pietro Parolin, por uma carta enviada pelo religioso a Maduro.
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Em alusão indireta à carta, o presidente denunciou uma trama para “implodir” o diálogo por parte da oposição.
Fontes da MUD disseram à AFP que o governo poderá, ainda hoje, entregar propostas à coalizão, com o objetivo de desbloquear o processo.
Chavismo acusa
Analistas como John Magdaleno consideram que o governo já atingiu seu objetivo de “ganhar tempo”, pois desmobilizou os protestos – em escalada, antes do diálogo – para exigir a realização do referendo.
Isso permitiria a Maduro chegar a 10 de janeiro de 2017. A partir dessa data, mesmo que seu mandato seja revogado, a Constituição prevê que seu substituto seja o vice-presidente. Com isso, o chavismo poderá continuar no poder até 2019 pelo menos.
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Segundo Jácome, o governo também conseguiu “dividir a oposição”, já que alguns partidos nunca participaram da mesa de diálogo. A MUD se propôs a conversar sem renunciar à estratégia de ocupar as ruas, mas não voltou a convocar passeatas.
Dirigentes como o presidente do Parlamento, Henry Ramos Allup, não descartam que o governo solte alguns membros da oposição para dar novo fôlego à mesa de diálogo, mas adverte que a oposição continuará nela apenas se as demais exigências forem atendidas.
Seis opositores foram libertados desde o início das negociações, o que a oposição apresentou como uma vitória.
avs-axm/ja/tt