Em uma corrida contra o tempo, a oposição venezuelana começa, nesta quarta-feira, seu trabalho à frente do Parlamento com a meta de definir em no máximo seis meses um caminho para tirar do poder o presidente Nicolás Maduro, que conta, no entanto, com blindagens legais para complicar este objetivo.
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O novo presidente da Assembleia, Henry Ramos Allup, convocou sessões ordinárias para eleger as comissões que avaliarão uma agenda crucial para o país: de medidas econômicas aos mecanismos que a oposição terá em busca de uma saída antecipada do chefe de Estado.
Eleito em abril de 2013 por seis anos, Maduro tomou nota do desafio lançado na terça-feira pela Mesa da Unidade Democrática (MUD) na conturbada sessão em que assumiu o controle do Parlamento, após 17 anos de hegemonia chavista. “Será o povo que decidirá com a Constituição na mão”, advertiu.
Ao proclamar o início da “mudança”, Ramos Allup lembrou o prazo de “seis meses” fixado pela MUD a partir da instalação do Parlamento para oferecer “um sistema para mudar o governo pela via constitucional”: um referendo revogatório quando Maduro completar, em abril, a metade do mandato, uma reforma constitucional ou uma Assembleia Constituinte.
Mas os analistas advertem para o complexo emaranhado legal em cada uma destas saídas e o fato de que será o Tribunal Supremo de Justiça (TSJ), acusado pela oposição de servir ao chavismo, que decidirá as disputas no Parlamento.
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Desafios de mudança
Apesar de a oposição ganhar uma superpoderosa maioria de dois terços (112 dos 167 assentos), a nova legislatura ficou temporariamente com 109 deputados da MUD e 54 da situação. Quatro opositores e um chavista não conseguiram prestar juramento porque sua eleição está impugnada no TSJ.
Enquanto o máximo tribunal decide se anula a eleição destes deputados, a oposição terá a maioria qualificada de três quintos, que a habilita a censurar e destituir funcionários para não encurtar o mandato presidencial.
Assim, está aberto o debate em torno de se os dois terços devem ser calculados com base nos 167 assentos ou nos 163 instalados, explicou à AFP o constitucionalista Juan Manuel Rafalli.
“A base fundamental da estratégia está no TSJ (…) Se o governo usar seu controle institucional focadamente, tem chances de êxito a curto prazo”, avaliou o analista Luis Vicente León.
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Eugenio Martínez, especialista em temas eleitorais, explicou que para convocar um referendo revogatório são necessárias as assinaturas de 20% (3,9 milhões) do colégio eleitoral, coletadas em três dias e acompanhadas das impressões digitais; e para remover Maduro, o apoio de mais dos 7,5 milhões que o elegeram em 2013.
A Constituinte e a emenda constitucional devem ser aprovadas mediante referendo convocado pelo Conselho Nacional Eleitoral (CNE), também acusado pelos opositores de aliado do chavismo.
“Nenhuma mudança de governo é fácil. Independentemente das complexidades, tudo dependerá da situação do país dentro de alguns meses. Vejo uma grande conflitividade social e uma pressão enorme para que haja uma mudança”, avaliou Rafalli.
León destacou que a MUD também tem o desafio de vencer suas divisões: a ala radical, encabeçada pelo detido Leopoldo López, tenta tirar Maduro; a ala moderada, liderada pelo ex-candidato presidencial Henrique Capriles, prioriza a crise econômica.
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O primeiro ponto da agenda opositora tampouco passará sem a participação da situação. Maduro anunciou que vetará a anistia que a MUD aprovará para 75 opositores presos, entre eles López, condenado a quase 14 anos pelos protestos violentos que exigiam, em 2014, a renúncia do presidente.
Crise e ingovernabilidade
Para encarar o que chama de uma “nova etapa da revolução” com o Legislativo contra si, o chefe de Estado prevê nomear nesta quarta-feira seu novo gabinete e detalhar um plano de recuperação econômica que apresentará à Assembleia.
Venezuela, com as maiores reservas petrolíferas do mundo, sofre com uma queda vertiginosa dos preços do petróleo – fonte de 96% de suas divisas -, um déficit fiscal de 20% do PIB, 200% de inflação, escassez severa e uma contração econômica de 6% em 2015, segundo cálculos privados.
“Enquanto o debate político inunda o discurso chavista e opositor, as pessoas sentirão um enorme vazio de soluções para seus problemas-chave”, alertou León, ao lembrar que a oposição venceu as legislativas de 6 de dezembro, devido ao voto contrário ao governo devido à crise econômica.
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A retirada das imagens de Chávez no Parlamento fala por si. Analistas coincidem em prever um duro choque de poderes que pioraria a situação econômica.
* AFP