A oposição ucraniana ameaçou o presidente Viktor Yanukovytch com uma nova ofensiva, caso não sejam feitas concessões, após vários dias de uma onda de violência que matou cinco pessoas no centro de Kiev.
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Manifestantes e policiais só se se mantiveram separados nesta queinta-feira por uma barricada de pneus em chamas. Mas o clima continua muito tenso e os líderes da oposição lançaram um ultimato ao poder.
O opositor ucraniano Vitali Klitschko fez um apelo nesta quinta-feira aos policiais e manifestantes reunidos na rua Grouchevski, palco de violentos confrontos desde domingo, por uma trégua até às 18h GMT (16h, no horário de Brasília), à espera do resultado das negociações com o governo.
– Voltarei aqui às 20H00 (locais) para informar o resultado das negociações – declarou o ex-pugilista, citado pela agência de notícias Interfax. Um fotógrafo da AFP confirmou sua presença no local.
– Há duas soluções: (a primeira é) parar o derramamento de sangue e manter vivos todos os que estão em Maidan – outro nome dado à Praça da Independência, declarou na quarta-feira Arseny Yatsenyuk, líder do partido da opositora Yulia Tymoshenko.
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– Se este não for o caminho escolhido, eu digo a mim mesmo: eu não vou viver na vergonha. Nós todos vamos avançar juntos, mesmo que o resultado seja uma bala na testa – acrescentou diante de dezenas de milhares de pessoas.
– Se Yanukovytch não fizer concessões, amanhã (quinta-feira) nós partiremos para a ofensiva – declarou, por sua vez, Vitali Klitschko, exigindo a convocação de eleições antecipadas.
Os representantes da oposição devem se reunir com o chefe de Estado ainda nesta quinta-feira, após as primeiras negociações de quarta-feira, que não resultaram em nada.
O movimento de contestação, lançado há dois meses em resposta à recusa do governo em assinar um acordo com a União Europeia em favor de uma aproximação com a Rússia, ganhou impulso desde a adoção de uma lei reforçando significativamente as punições contra os manifestantes, em vigor desde quarta-feira.
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Desde domingo, a mobilização ganhou ares de guerrilha urbana, dando lugar a confrontos de uma violência sem precedentes nesta ex-república soviética.
Os confrontos se intensificaram na quarta-feira com vários ataques da polícia de choque, apoiada por um veículo blindado, contra as barricadas erguidas pelos manifestantes na rua Grouchevski, a algumas centenas de metros da Praça da Independência.
Os ataques foram acompanhados por disparos de bombas de gás lacrimogêneo e de efeito moral pela polícia, equipada com canhões de água, apesar de uma temperatura de -10º C. Os manifestantes responderam com coquetéis Molotov.
O coordenador do centro médico da oposição, Oleg Musiy, indicou quarta-feira ter contado cinco mortos e cerca de 300 feridos.
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De acordo com o site Ukrainska Pravda, quatro das cinco pessoas mortas tinham ferimentos de bala.
Moscou não irá intervir
Dezenas de manifestantes, alguns deles utilizando capacetes de obras ou de motos, voltaram a se reunir na manhã desta quinta-feira na rua Grushevski, atrás da cortina de chamas e fumaça, e lançavam esporadicamente pedras e coquetéis molotov.
Também eram ouvidas explosões ocasionais, aparentemente devido ao lançamento de bombas de efeito moral ou de gás lacrimogêneo por parte das forças de segurança.
Apesar da tensão latente, a situação está relativamente calma em vista dos combates dos dias anteriores, condenados pelos países ocidentais.
A União Europeia advertiu que “estudará possíveis ações e as consequências” para suas relações com a Ucrânia, enquanto Washington anunciou as primeiras sanções.
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A Rússia, por sua vez, garantiu que não irá intervir na situação da Ucrânia, dizendo que “está convencida de que as autoridades ucranianas “sabem o que precisa ser feito e encontrarão a melhor solução para voltar à normalidade e restabelecer a paz”.
– Nós não conseguimos entender os embaixadores de países estrangeiros que trabalham em Kiev, que dizem o que as autoridades da Ucrânia devem fazer, e de onde devem retirar suas tropas e a polícia – afirmou o porta-voz do presidente russo Vladimir Putin, Dmitri Peskov, em uma entrevista ao jornal Komsomolska¯a Pravda.
Desde domingo, mais de 1,7 mil pessoas ficaram feridas em Kiev nos confrontos entre manifestantes e a polícia, segundo a oposição.
As autoridades anunciaram a prisão de ao menos 70 pessoas.
As forças de segurança mobilizaram pela primeira vez nesta quarta-feira um tanque na direção dos manifestantes, muitos dos quais foram presos.
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O veículo de transporte de tropas blindadas avançou pela rua Grushevski, atravessando o que até esta manhã eram as barricadas dos manifestantes, segundo imagens da televisão.
Confira a galeria de fotos:
Abatidos a tiros
Este ataque coincide com o anúncio na manhã desta quarta-feira das primeiras duas vítimas diretas dos confrontos entre a polícia e os manifestantes.
A procuradoria geral indicou que o corpo de um homem com tiros na cabeça e no peito foi encontrado nesta quarta-feira em uma biblioteca, utilizada pelos manifestantes como enfermaria.
Pouco depois, o corpo de outro homem ferido por bala foi encontrado, acrescentou a mesma fonte.
Membros do serviço médico improvisado da oposição haviam anunciado pouco antes a morte de um manifestante, afirmando que foi abatido pelas forças de ordem.
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No entanto, nem o ministério do Interior, nem a procuradoria indicaram quem eram os responsáveis pela morte destas duas pessoas.
Já a oposição afirmou que um terceiro manifestante morreu na véspera depois de ter caído no domingo de uma altura de mais de dez metros de um edifício próximo ao local dos confrontos. Segundo a oposição, o jovem morreu quando a polícia subiu até o telhado do imóvel, a partir do qual os manifestantes lançavam coquetéis molotov e atiravam.
Esta informação não foi confirmada por fontes oficiais.
Desde domingo, a situação é muito tensa em Kiev, onde os manifestantes e a polícia se enfrentam sem interrupção com coquetéis molotov, balas de borracha e bombas de efeito moral.
Segundo o ministério do Interior, antes do ataque desta quarta-feira ao menos 200 pessoas haviam ficado feridas.
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Fontes médicas informaram que a mão de um ferido foi amputada e que vários outros ficaram cegos.
Um ativista e blogueiro da oposição, Igor Lutsenko, disse ter sido sequestrado por desconhecidos que o mantiveram cativo por 15 horas, antes de libertá-lo em uma floresta.
Reações internacionais
Em resposta ao uso da força contra os manifestantes em Kiev, os Estados Unidos decidiram revogar os vistos de vários ucranianos, indicou nesta quarta-feira a embaixada americana.
– Estamos contemplando outras medidas contra os responsáveis pela violência atual – indicou a embaixada em um comunicado, sem informar a identidade ou os cargos destas pessoas.
Já a chefe da diplomacia europeia, Catherine Ashton, “condenou com a maior firmeza a escalada violenta dos acontecimentos em Kiev” e pediu “o fim imediato de todos os atos de violência”.
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Os Estados Unidos e a União Europeia acusam o governo da Ucrânia de ter provocado a escalada da violência ao adotar leis repressivas.
Pelo contrário, as autoridades ucranianas receberam o apoio de Moscou, que denunciou as ingerências estrangeiras nos assuntos da Ucrânia e tachou a oposição de extremista porque viola a Constituição.
– O poder legítimo na Ucrânia tem que enfrentar ingerências estrangeiras. A parte extremista da oposição viola descaradamente a Constituição do país – declarou o vice-ministro das Relações Exteriores, Grigori Karasin, citado pela agência Interfax.
Os protestos começaram na Ucrânia quando o presidente Viktor Yanukovytch se negou a assinar um acordo de associação com a União Europeia e optou por uma aproximação com a Rússia.
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Yanukovych, que se reuniu nesta quarta-feira com três líderes opositores, promulgou na sexta-feira as controversas leis que estabelecem novas sanções contra os manifestantes, apesar das advertências ocidentais e das ameaças de sanções.
Os textos aprovados pelo Parlamento ucraniano preveem penas de prisão de 15 dias pela instalação não autorizada de barracas em locais públicos, e de até cinco anos de prisão para as pessoas que bloquearem os edifícios oficiais.
Outro texto obriga as ONGs que têm financiamento ocidental a se registrarem oficialmente como “agentes do estrangeiro”, uma denominação estabelecida na legislação russa em 2012 após uma onda de protestos contra o presidente Vladimir Putin.