É tarefa da CPI esclarecer por que a Petrobras fez um negócio cujas condições foram camufladas por seus dirigentes.
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O depoimento do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró à Câmara dos Deputados acentua um absurdo cometido na compra da refinaria de Pasadena. Disse o ex-executivo que o resumo do contrato apresentado ao conselho de administração em 2006 não continha as cláusulas “put option” e “Marlim”, que acabaram sendo decisivas no mau negócio. E acrescentou que não eram relevantes. Ora, isso é inadmissível. As duas cláusulas talvez fossem as mais relevantes do contrato.
Mesmo que pareça uma formalidade incompreensível ao grande público, o mecanismo da put option pode ser facilmente traduzido. Essa ressalva, que está no contrato, permitia que a sócia belga Astra Oil abandonasse o negócio, obrigando a parceira – no caso a Petrobras – a assumir todo o empreendimento. E foi o que aconteceu. Já a cláusula Marlim assegurava aos belgas uma rentabilidade mínima de 6,9% ao ano, como se apenas a empresa brasileira tivesse a obrigação de absorver perdas. É óbvio que as condições contratuais desfavoreciam a estatal. Tanto que a aquisição da refinaria logo se comprovou como péssimo negócio.
A parceira estrangeira, amplamente privilegiada, desistiu da empreitada, que hoje pode ser definida, sem exageros, como uma aventura bilionária. É surpreendente que duas cláusulas decisivas para a compreensão do imbróglio tenham sido omitidas pelo citado diretor, na época da apresentação do relatório prévio ao conselho de administração da empresa, em 2006. Disse agora Nestor Cerveró aos parlamentares, com a maior naturalidade, que tais informações seriam detalhes sem importância. Há uma evidente contradição entre a percepção do ex-diretor e a da própria presidente da República. A senhora Dilma Rousseff já se referiu à omissão das cláusulas, no momento da apresentação do relatório ao conselho. Na época, a economista presidia o conselho e chefiava a Casa Civil.
Esta semana, também a atual presidente da Petrobras, Graça Foster, em depoimento no Senado, criticou a falta de referências às cláusulas quando da exposição de Cerveró e disse que o ex-diretor foi afastado da direção da área internacional em 2008 exatamente por conta desta omissão. Nada disso anula as responsabilidades de todos os envolvidos nas negociações. Ao contrário, o conflito de pontos de vista, dentro do próprio governo, indica que o Senado deve ater-se a este e outros detalhes nebulosos, durante as atividades da CPI que investigará a estatal.
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Ampliam-se, a cada manifestação dos protagonistas do negócio de Pasadena e das intervenções públicas do Planalto, as evidências de que a compra da refinaria teve dados camuflados e causou danos financeiros e à imagem já desgastada da Petrobras. Resta esclarecer se há fundamento nos indícios que, além do erro, podem ter ocorrido delitos. Esta é a principal missão da CPI.