Em um piscar de olhos se passaram 40 anos desde a primeira edição da Oktoberfest Blumenau. Para quem acompanhou o começo de tudo, é quase impossível não se emocionar diante desse marco. Aos poucos, a história da maior festa alemã das Américas foi sendo construída, mas nunca de uma forma linear. Até que se chegasse ao atual patamar do evento, a organização teve que aprender a lidar com altos e baixos, se reinventar sempre que necessário.
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Hoje, mesmo que já tenha uma certa idade, a Oktober pode ser vista como um fenômeno jovem se considerado tudo o que ainda está por vir. Só que não há como falar do futuro sem relembrar o passado. Uma breve volta no tempo, com um “quê” de nostalgia, se faz essencial. O futuro, porém, passa por um valor “inegociável”, que é manter as tradições germânicas, explicam especialistas.
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Mas vamos voltar no tempo: talvez você nem era nascido, mas na década de 1970 o assunto já vinha sendo discutido nos bastidores — cerca de 10 anos antes da estreia do evento em Blumenau. É o que conta Emílio Schramm, um dos responsáveis por trazer a festa da Alemanha para Santa Catarina.
Muito antes de receber a missão de ir até o “berço” da Oktoberfest, ele lembra já ouvir comentários sobre os planos que se tinha para organizar o evento na maior cidade do Vale do Itajaí. Isso porque, à época, o pai de Emílio participava de uma comissão de turismo em Blumenau e levava o tema, por vezes, para dentro de casa.
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Não demorou para que o filho se interessasse pelo assunto, vindo a integrar, também, o mesmo grupo, anos mais tarde. Assim, na década de 1980, quando a prefeitura estava sob o comando de Renato Vianna, Emílio conta que pretendia fazer uma viagem de férias a Munique, na Alemanha. Para unir o útil ao agradável, o prefeito pediu a ele que aproveitasse a ida ao país europeu para entregar uma carta endereçada ao gestor da cidade alemã.
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No papel, dizia que Blumenau tinha interesse em conhecer mais a fundo a Oktoberfest “original”. O prefeito de Munique, porém, nunca recebeu a correspondência, já que estavam em período de eleições na Alemanha e o homem havia se ausentado para a campanha política.
Por causa disso, a carta nem sequer chegou a ser lida.
— Ninguém abriu a carta endereçada a ele. Eu até falei porque eu falo um pouco alemão que poderia abrir, mas era como se eu estivesse falando uma heresia — lembra Emílio, aos 71 anos de idade.

Depois que explicou o que estava escrito no papel, o blumenauense foi levado até a mulher responsável por coordenar a Oktoberfest na Alemanha, à época. Emílio conta que, de forma simpática e receptiva, ela fez questão de mostrar como tudo funcionava durante uma manhã inteira.
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Enquanto isso, Emílio fazia registros de cada detalhe que pudesse contribuir para a festa em Blumenau. Não à toa, ele revela que toda a decoração da primeira Oktoberfest, em 1984, foi baseada nas fotos que ele mesmo tirou, em Munique. O famoso “céu azul” do pavilhão redondo — ou setor A —, por exemplo, surgiu depois da ida até a Alemanha, conta Emílio.
— A gente foi para lá para se inspirar na festa, mas ao mesmo tempo também mudamos bastante coisa. A gente fez a festa do nosso jeitinho, né? Não tem como fugir disso — complementa.
A estreia da Oktoberfest em Blumenau
Com uma cobrança cada vez maior dos empresários, na época, para tirar o projeto do papel e atrair mais turistas para a cidade, o prefeito Dalto dos Reis, eleito em 1983, definiu que naquele ano o público iria finalmente conhecer a Oktoberfest Blumenau.
Ricardo Stodieck — que, mais tarde, se tornaria diretor da secretaria de turismo na cidade — ressalta que Dalto teve um papel fundamental naquele momento. Isso porque, segundo ele, o apoio e incentivo da prefeitura foi essencial para os comerciantes que, de forma voluntária, se mobilizaram para a organização da festa.
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Com essa união entre poder público e privado, se fez o “casamento perfeito”, nas palavras de Ricardo.
— Dá para dizer que da década de 80 até aqui bastante coisa mudou, mas para melhor. As primeiras edições foram maravilhosas, porque era uma coisa nova. Da juventude aos mais velhos, todo mundo frequentava. Lembro dos grupos de amigos, a gente ia quase todo dia para festa em 84. Foi uma explosão de alegria, de felicidade. Foi fantástico. Ainda mais depois de tudo o que tinha passado durante a enchente também, né? Teve um significado ainda mais forte — relembra.
Como surgiu a Oktoberfest Blumenau: a história aos olhos de Dalto dos Reis
A festa que estava planejada para 1983, inicialmente, teve de ser cancelada por conta da dura sequência de eventos climáticos que atingiram a cidade. Foram quatro enchentes enfrentadas só em Blumenau naquele ano, tendo uma delas elevado o nível do Rio Itajaí-Açu para 15,34 metros. E 1984 ainda reservada mais.
Em agosto de 1984, as águas voltaram a subir, chegando a 15,46 metros no dia 7. Dois meses depois disso, a Oktoberfest Blumenau aconteceu pela primeira vez. O que era apenas um sonho tinha se tornado real.
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— A gente fez porque acreditava naquilo. Era quase impossível dar errado. Afinal, era uma cidade com um toque germânico. E a Oktober, em termos de festas germânicas no mundo inteiro, é a de maior expressão — ressalta Emílio.

Entre 5 e 14 de outubro de 1984, 100 mil pessoas passaram pelo Pavilhão A, na antiga Proeb. No ano seguinte, o público quase quadruplicou: foram 382 mil visitantes. Já em 1988, na quinta edição, a festa ultrapassou a marca de 1 milhão. O número só foi atingido de novo em 1992. Mas, apesar dos resultados positivos, havia algo que incomodava especialmente a população blumenauense e que precisava ser revisto o quanto antes.
Um “desvio de rota” e a insatisfação do público
Antes de se tornar diretor da secretaria de turismo em Blumenau, Ricardo Stodieck atuou como voluntário na Oktoberfest entre 1985 e 1987. Aos 18 anos de idade, ele ficou responsável por organizar a programação e contratação das bandas nacionais para a festa.
De 1985 em diante, Ricardo lembra que os pavilhões foram crescendo e fizeram o evento alavancar ainda mais, “explodindo” e chegando a números estratosféricos em 1987.
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Fotos da década de 1980 mostram como era a Oktoberfest Blumenau antigamente
Depois disso, em 1989 e 1990, ele passou a fazer parte da secretaria de turismo, mas ressalta que, enquanto visitante, já havia deixado de frequentar a Oktoberfest, pelo menos aos finais de semana. Por conta da grande quantidade de pessoas que ia para o evento, na época, Ricardo conta que ficava praticamente impossível se mexer dentro dos pavilhões. Nem sequer tinha controle de público, conforme relembra.
— E aí eu, como todo festeiro, me sentia insatisfeito com a festa, né? Tinha que mudar isso, não podia ser assim — diz.

Naquele período, a Oktoberfest Blumenau passava por o que muitos chamariam hoje de uma “crise de identidade”. Para tentar reverter esse cenário, surge Norberto Mette, organizador do evento entre 1993 e 1996.
Como secretário de Turismo na época, ele conta que, apesar de se prometer uma festa com raízes germânicas, quando as pessoas chegavam ao local, elas encontravam um evento comum, sem as famosas “bandinhas” ou gastronomia típica, por exemplo — que, hoje, já se tornaram marca registrada da Oktoberfest.
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— E aí havia uma reclamação generalizada da nossa gente, do pessoal mais ligado às tradições alemãs, dizendo que a festa tinha virado uma bagunça. Tanto a população local, quanto os turistas viam que a festa não tinha mais critério. Virou uma festa qualquer, sem sem uma linha conceitual — explica Norberto.
Diante disso, a festa se viu obrigada a passar por uma repaginada. O objetivo, conforme frisa Norberto, era resgatar a Oktoberfest, trazendo a valorização do traje típico, degustação de cervejas artesanais e o próprio ânimo do blumenauense, para que ele voltasse a frequentar a festa, como no início.

— A valorização da música também foi fundamental. Eu estabeleci que as bandas tinham que tocar 90% de música alemã durante um período e estimulei elas a buscar músicas novas, porque as músicas alemãs que eles tocavam eram muito antigas, algumas tinham mais de 70, 80 anos. A gente queria que o blumenauense dissesse, novamente, que a festa é nossa, que é uma festa da família. E foi isso o que nós fizemos — complementa.
O que esperar do futuro
Depois de ter se envolvido na Oktoberfest durante a década de 1980, Ricardo retornou em 2013 para assumir o cargo de secretário de Turismo e presidente da Vila Germânica. Dali em diante, o objetivo foi seguir com o processo de resgate da festa.
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Para ele, o que aconteceu nos anos anteriores pode ser definido, hoje, como um “desvio de rota”.
— Hoje a festa tem um patamar de amadurecimento, né? A Oktoberfest não pode ter crise de identidade, sob hipótese alguma. Ela é uma festa de tradição Germânica e ponto final. É isso que isso tem que priorizar. E dentro da origem germânica é uma festa de qualidade — ressalta.
O pensamento vai ao encontro ao do atual secretário de Turismo de Blumenau, Marcelo Greuel. Para ele, mesmo depois de 40 anos, a Oktoberfest continua com o dever de se destacar por ser, justamente, uma festa alemã, que valoriza as tradições germânicas.

Para o futuro, se prevê ampliações na estrutura e metas para nacionalizar o evento, transformando a Oktoberfest em uma festa do Brasil inteiro, conforme ressalta. Mas a essência vai continuar sempre a mesma. Isso, nas palavras dele, é algo inegociável.
— Nós temos que nos atualizar sempre, como nós estamos fazendo, mas sem perder a questão da tradição. Eu acho que o grande sucesso da Oktoberfest é é a tradição, é a cultura germânica, senão vamos virar um festival de música como qualquer outro aqui no Brasil. É isso o que vai manter a festa crescendo. É inegociável — diz Greuel.
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Não à toa, há 40 anos Ricardo não perde uma edição da Oktoberfest Blumenau e já se sente “em casa”, como ele mesmo diz. Emílio também carrega no peito um apego pela festa que ele ajudou a construir e não esconde o orgulho de ter feito parte dessa história.
— Faz 40 anos que eu vejo o desfile. Todo ano vou assistir pelo menos um. E me emociono como da primeira vez — finaliza o homem de 71 anos.
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