Em meio ao verde, à lama e às águas do manguezal localizado no centro de Palhoça, o Mercado Municipal, prédios, casas e até mesmo um estádio de futebol profissional dividem espaço. O contraste entre a urbanização do município da Grande Florianópolis e a natureza é grande, mas fica ainda maior quando visto de cima. Pelas fotos de satélite, é possível ver ruas que adentraram o mangue, um aglomerado urbano consolidado, mas que, segundo o Ministério Público Federal, não poderia ter acontecido. Por isso, a região agora virou alvo de uma ação civil pública.
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Nela, o procurador da república Walmor Alves Moreira diz que Prefeitura de Palhoça e a Fundação Municipal de Meio Ambiente “são responsáveis por permitir as construções e omissos no seu dever de fiscalizar as obras em áreas invadidas, e ainda concederam licenças impertinentes e deixaram de tomar medidas efetivas para a demolição de construções irregulares”.
A área localizada no centro de Palhoça fica nos limites do Rio Partural, na intersecção com a Rua João Born, seguindo pela Rua Capitão Augusto Vidal em direção ao curso do Rio Passa Vinte até o ponto em que ele encontra o mar. Dentre as invasões mais graves, segundo foi apurado na fase do inquérito e com autuações da Fatma, está o aterramento de grandes áreas de manguezal para a comercialização de lotes nas ruas Ervino Scheidt e Servidão Belarmino Antônio da Silva.
Segundo consta em um inquérito civil anexado na ação, desde 1981 foram expedidos autos de infração contra o município de Palhoça por danos aos mangues, e, segundo o procurador, mesmo o manguezal estando em uma Unidade de Conservação Municipal de Proteção Integral, criada em 1996 (Parque Municipal de Palhoça), o ecossistema costeiro continua ameaçado na região.

Licenças devem ser suspensas
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Walmor Alves Moreira ainda enfatiza que as “ocupações desordenadas estão crescendo e aumentando, e o município não faz nada para contê-las ou recuperar as áreas, pelo contrário, favorece construções irregulares na região”.
Ele pede a condenação do município, que deverá adotar a legislação federal para áreas de preservação permanente. Além disso, o município de Palhoça e a Fundação do Meio Ambiente devem suspender a emissão de novas licenças e autorização para obras e construções na região e desfazer canalizações de esgoto no prazo de 90 dias. O Ministério Público Federal ainda pede que a Justiça obrigue o município a recuperar o ecossistema degradado por meio de um plano aprovado pelo Ibama.
O procurador não faz menção à demolição das construções existentes, mas pede que município identifique e cadastre, caso seja condenado, a população de baixa renda da região para eventual programa habitacional. No caso de descumprimento, o MPF pede a fixação de multa diária no valor de R$ 10 mil.
Ação surpreende população

O comerciante Luciano Vidal tem uma banca de verduras há cerca de 10 anos no Mercado Público de Palhoça, e soube pela imprensa da ação. Ele diz que fica preocupado, pois além de trabalhar, também mora em uma rua que está dentro da área da ação do MPF:
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— Não chegou nada aqui nem na minha casa, mas a gente tem medo. A casa em que eu moro é herança do meu pai há muitos anos, mas sei que se olhar no mapa, praticamente todo o Centro era mangue. Realmente não sei se isso vai dar em alguma coisa. O Mercado Público é tombado, então não tem como derrubar e recuperar toda essa área — comenta.
Amaro José da Silva Junior, administrador do Guarani Futebol Clube, que possui o campo dentro da área, conta que também soube pela imprensa, mas não está preocupado pois o clube teve autorização da União para construir o estádio Renato Ramos da Silva em 1972. Além disso, possui contrato de cessão de uso da área e paga anualmente o laudêmio (tarifa para à União para direito de ocupação de terrenos da marinha):
— O clube ocupa uma área de 42 mil metros quadrados, mas não está dentro do Parque. A gente tem até nossa própria estação de tratamento de esgoto. Quando a União deu a matrícula, já determinou que poderia ser construído o estádio. Até conversei rapidamente com o prefeito, mas ele disse que vão recorrer — falou.
Na Rua Ervino Scheidt, a reportagem conversou com alguns moradores que relataram não ter conhecimento da ação do MPF.
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Procuradoria vai recorrer
Desde que teve conhecimento da ação do Ministério Público Federal no dia 6 de junho, a Procuradoria Geral do Município de Palhoça está preparando a defesa. De acordo com o procurador Felipe Neves Linhares, a tese não se sustenta, pois na época da fundação da área central Palhoça, em meados do século XVIII, não havia legislação específica sobre ocupação destas áreas. Ele explica que o principal objetivo do MPF é preservar o manguezal e impedir ocupações irregulares.
Em entrevista à Rádio CBN na manhã desta quinta-feira, o prefeito de Palhoça, Camilo Martins, disse que a população pode ficar tranquila:
— Essa ação me causa surpresa porque traz insegurança jurídica. Quero crer que o Ministério Público Federal fez essa ação para conter futuras invasões ou construções irregulares, não para demolir residências e prédios construídos há mais de 40, 50 anos. Isso é uma intranquilidade para a população — falou.
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O prefeito de Palhoça assegura que, durante sua gestão, nenhum alvará foi liberado para se construir em áreas de preservação permanente. Camilo Martins disse que chegam à Prefeitura várias solicitações de construções irregulares, mas são sempre negadas:
— O que está trazendo mais problema é a nova demarcação das áreas de marinha. Isso não existe em mais nenhum lugar do mundo, só no Brasil. Essa ação é baseada nessa nova demarcação, que vai trazer prejuízos incalculáveis. Essa nova demarcação feita pela União é uma vergonha. Durante meu governo, jamais foi liberada qualquer licença para construir em área de preservação permanente. Inclusive, fizemos um levantamento de toda a região do município, principalmente o sul. Já fizemos os mapas sobre onde já era APP. Mesmo assim, as pessoas solicitam, mas a prefeitura nega — disse.