São inegáveis os avanços nos sistemas de alerta e monitoramento de cheias em Santa Catarina após a enchente de 1983, e que ganharam um reforço com a tragédia de 2008. Estações meteorológicas, informações para o cidadão por aplicativo, planos de contingência, cotas de inundação. Mas obras efetivamente ainda são o calcanhar de Aquiles do governo do Estado.
Continua depois da publicidade
Receba notícias de Blumenau e região por WhatsApp
A barragem de José Boteiux é um exemplo disso. Com capacidade para reter 357 milhões de metros cúbicos de água, considerada a maior do Brasil para essa finalidade, começou a ser construída em 1976. Isso porque inundações sempre fizeram parte da rotina da região e chegaram, inclusive, a ser contadas em cartas pelo fundador da cidade, Hermann Bruno Otto Blumenau.
Primeiro registro de uma grande enchente em Blumenau é achado na Alemanha
A construção ficou pronta 16 anos mais tarde, em 1992, justamente quando Blumenau voltou a enfrentar uma nova enchente. No aguardado ano da inauguração, o Itajaí-Açu alcançou 12,8 metros na cidade e a estrutura do Alto Vale se consolidou como a principal para contenção de cheias no Médio Vale do Itajaí.
Continua depois da publicidade
— Se em 1983, 1984 as enchentes chegaram a 15, 16 metros, e depois da barragem ativada em 1992 nós não tivemos mais nenhuma enchente que ultrapasse os 14 metros, a história já diz: a diferença é de dois metros de água para mais ou para menos com a barragem operando ou não — frisa o secretário de Defesa Civil de Blumenau, Olímpio Menestrina.
Embora primordial, a estrutura está condições deploráveis fruto de impasses com a comunidade indígena desde antes do início da obra, quando o governo federal decidiu fazer a construção em uma terra demarcada, comprometendo as moradias e plantações do povo Xokleng, até hoje não indenizado pelas perdas — embora desde 2015 existe um acordo de compensação aos moradores.
Barragem de José Boiteux: linha do tempo explica impasse entre governo e indígenas
A situação chegou ao ponto de a Defesa Civil de Santa Catarina precisar usar caminhão hidráulico para operar as comportas por causa de danos na casa de máquinas e até de equipamentos que simplesmente sumiram. O Estado chegou a anunciar a licitação para reforma da barragem, com apoio financeiro da União, mas houve entraves burocráticos e não há mais previsão de quando isso deve ocorrer.
Apesar da situação precária, o secretário de Defesa Civil de Santa Catarina, Armando Schroeder, diz que a estrutura pode ser ativada se houver necessidade. O cenário traz insegurança a quase 1,5 milhão de moradores que confiam na barragem para conter as cheias no Médio Vale do Itajaí e representa um risco na visão de Menestrina:
Continua depois da publicidade
— Não digo que essa barragem é importante: ela é fundamental para mitigar os efeitos da chuva. Foi construída com dinheiro público justamente para isso e queremos ter a tranquilidade de que quando precisar, ela vai estar funcionando.
Obras emperradas
Quando a enchente de julho de 1983 completou 30 anos, o Santa mostrou que os sistemas de monitoramento e alerta que existem hoje na Defesa Civil de Santa Catarina já estavam nos planos. O radar de Lontras e a sobrelevação das barragens de Taió e Ituporanga em dois metros, obras inauguradas entre 2014 e 2016, também. Tudo faz parte de um projeto global da Bacia do Rio Itajaí-Açu, fruto de uma parceria com Agência de Cooperação Internacional do Japão (Jica).
Mas algumas das ações previstas há uma década, ainda não saíram do papel. É o caso da implantação de três barragens em Mirim Doce, Braço do Trombudo e Petrolândia, de quatro minibarragens em Pouso Redondo e Agrolândia; do melhoramento da calha do rio nas cidades de Taió, Rio do Sul e Lontras e do canal extravasor com controle de vazão do Salto Pilão.
Em audiência pública no mês passado, quando deputados manifestaram preocupação com a manutenção das estruturas de prevenção a cheias no Vale do Itajaí por causa do El Niño, a Defesa Civil do Estado disse estar trabalhando para iniciar algumas dessas obras. Na lista estão as barragens de Mirim Doce, Braço do Trombudo, Petrolândia e dragagem do rio entre Rio do Sul e Lontras e do canal retificado no Itajaí-Mirim.
Continua depois da publicidade
Leia também: As dores e lições da enchente de 1983 em Blumenau e região, 40 anos depois
Conforme o secretário de Defesa Civil de Santa Catarina, Armando Schroeder, as obras foram elencadas como prioridade do governo estadual junto à União, de onde deve vir parte dos recursos. Porém não estabeleceu prazos para o início de cada uma delas. Uma barragem também é projetada para Botuverá, chegou a ter licitação lançada, mas os orçamentos precisaram ser refeitos e não há data para a obra começar.

Leia mais
A história por trás de foto emblemática de resgate na enchente de 1983 em Blumenau
Galeria de fotos mostra dimensão e força da enchente de 1983 em Blumenau
Médico de Blumenau relembra angústia da enchente de 1983: “Pessoas gritavam no telhado”