Como boa parte do Estado brasileiro, a Justiça Eleitoral que conhecemos é uma herança de Getúlio Vargas. A justificativa era ter um órgão independente de governos na elaboração e fiscalização das eleições – que na República Velha ficavam nas mãos das oligarquias estaduais. Em tese, a Justiça Eleitoral vinha para despolitizar o processo.
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Na última semana, talvez pela primeira e última vez em sua história, os brasileiros viveram uma overdose de direito eleitoral com o longo julgamento da chapa de Dilma Rousseff (PT) e Michel Temer (PMDB). Viram o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) absolvê-los por 4 votos e 3 e manter o peemedebista no cargo após serem deliberadamente desconsideradas as provas de abuso de poder político, econômico e o explícito caixa 2 da Odebrecht.
Olhando para a gênese da Justiça Eleitoral em 1932 e o julgamento encerrado na sexta-feira, fica a impressão de que a intenção original falhou, de que o tribunal politizou-se. Pode ser verdade, mas não é novidade. O TSE é especialista em ser rígido e punitivo com quem tem pouca margem de barganha política e ser criativamente garantista quando os casos envolvem maiores consequências.
Lembremos alguns casos catarinenses. Em menos de 10 anos, Criciúma teve os prefeitos Décio Góes (PT) e Clésio Salvaro (PSDB) cassados por irregularidades após vitórias consagradoras nas urnas. Só agora a cidade começa a se recuperar da insegurança jurídica e política que viveu. No mesmo período, os ministros do TSE acharam formas de contornar acusações contra o governador e o prefeito de Florianópolis – na época, Luiz Henrique da Silveira e Dário Berger.
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Ambos foram salvos por mudanças de jurisprudência. Ou seja, o TSE resolveu mudar a forma como julgara ações semelhantes. Acusado de abuso de poder político e econômico na reeleição em 2006, LHS chegou a ter três dos sete votos dos ministros pela cassação. A sessão foi encerrada com o argumento de que o vice Leonel Pavan (PSDB) deveria ter sido citado – algo que nunca havia sido feito. Um ano depois, foi absolvido por 6 a 1.
Hoje senador, Dário Berger foi julgado pela prática de “prefeito itinerante”. Duas vezes eleito em São José, estaria driblando os limites de reeleição ao trocar o domicílio para Florianópolis (onde se elegeu mais duas vezes). A interpretação levou a cassação de prefeitos de pequenas cidades, mas quando chegou a hora de um peemedebista de capital, os ministros acharam o caso rígido demais, deu-se um jeito.
Na semana passada, o TSE agiu como costuma agir, desta vez sob holofotes. Mas há uma diferença entre os casos de Temer e dos catarinenses LHS e Dário: os peemedebistas de SC vinham de vitórias consistentes nas urnas, o inquilino do Planalto sobrevive por um fiapo de institucionalidade cada vez mais esgarçado.
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