Em entrevista ao DC, o presidente da Assembleia Legislativa, deputado Joares Ponticelli (PP), faz um balanço dos seus seis primeiros meses no comando da Casa. No ano que vem, conforme acordo firmado entre as lideranças partidárias catarinenses, a presidência vai para o deputado Romildo Titon (PMDB).
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DC – Quais as principais dificuldades que o senhor encontrou aqui na presidência do legislativo?
Joares Ponticelli – Burocracia. O excesso da burocracia é o grande entrave que leva às respostas lentas que o poder público dá. Se tem uma coisa que eu não me conformo, é essa morosidade para dar as respostas. Vou citar um exemplo. Para adquirir algumas mesas para o restaurante da Assembleia, decisão que foi tomada pela mesa diretora logo nas primeiras reuniões, nós encerramos o semestre sem ver os equipamentos colocados à disposição. Exatamente pelo excesso de burocracia. Os entraves legais engessam demais. As coisas não andam com a rapidez que queremos. Outra dificuldade que me incomoda muito é a busca da solução para esses servidores que estão alocados em três prédios fora do edifício sede. Isso não está fazendo bem para o processo legislativo. Não faz bem para os servidores, que não estão estimulados, com a auto estima afetada. Os processos ficam mais lentos com isso. E aqui dentro mesmo temos servidores trabalhando em condições inadequadas. Nós ainda não conseguimos encontrar uma solução para trazer esses mais de 500 servidores que estão fora. Porque isso representará uma economia, já que são prédios alugados e dinheiro de aluguel é dinheiro que não retorna. E temos espaço para isso. Espero que logo no início do segundo semestre a gente possa resolver essa pendência.
DC – Não acaba indo na contramão do que as ruas pediram esse gasto na construção de um anexo?
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Ponticelli – Acho que não. Esses servidores são essenciais. Nossa casa, se você comparar com outros parlamentos, tem uma estrutura enxuta. Nós não temos como abrir mão desses servidores e nós não temos espaço para acolhê-los aqui. Mantê-los em prédios alugados não é um bom negócio. O ideal é que a gente possa fazer esse investimento agregando valor ao nosso patrimônio, que é coletivo, um patrimônio do povo. O cidadão não está preocupado com isso, ele quer é a resposta mais rápida.
DC – O senhor fala na construção do Anexo para trazer os funcionários de volta à Assembleia, mas o que levou os funcionários a saírem da casa foi a ampliação dos gabinetes dos deputados feita em 2011. O tamanho aqui hoje é o dobro do gabinete no congresso nacional, por exemplo.
Ponticelli – Mas não vou comparar pelo pior. Aquilo lá não é condição digna de trabalho para ninguém. Não tem condições dignas de receber com decência uma autoridade, alguém que tem um mandato legitimamente constituído e vai lá pleitear em favor da sua cidade. É claro que ninguém precisa de nenhum castelo, de nenhum palácio, mas há que se dar condições dignas de trabalho. Você não produz o quanto deveria sem essas condições. Aqui conseguimos atender uma demanda reprimida de muito tempo por condições decentes de trabalho nos gabinetes por um custo relativamente baixo. Agora precisamos oferecer isso para todos os nossos servidores também.
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DC – A Assembleia conseguiu desenvolver uma agenda positiva para dar resposta a esse descrédito com relação à classe política como um todo mostrado pela população nas manifestações?
Ponticelli – Olha, não temos grandes matérias de repercussão social represadas. As matérias aqui têm tramitado com certa celeridade. Não temos assim nenhuma grande demanda pendente. Todas foram deliberadas. Uma que considero extremamente importante é a criação do Fundo de Apoio aos Municípios. Tramitou em tempo exíguo aqui dentro, vai produzir resultados extraordinários para Santa Catarina porque é uma forma muito eficiente, muito eficaz, muito transparente de descentralização porque não estamos dando nenhum brindezinho, nenhum presentinho de grego para cada prefeito de dar uma escola para ele ter que manter depois. Estamos repassando o dinheiro sem contrapartida para que ele, prefeito, defina o que é mais importante e o que é prioritário. Digo sempre que o nariz do prefeito está mais próximo do dedo do cidadão, que está cobrando essa resposta. Nós vamos ver em pouco tempo que foi uma medida que vai impactar muito na nossa sociedade.
DC – Se levantou a possibilidade de acabar com o fim do recesso de julho algumas semanas antes dele começar aqui na própria casa. A discussão acabou ficando para a volta do recesso. A Assembleia perdeu a oportunidade de dar essa resposta para a sociedade?
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Ponticelli – O recesso faz parte da atividade parlamentar. A nossa democracia é representativa. Como é que você representa aqueles com quem não convive? Como se faz uma balanço, uma avaliação do mandato? Para ouvir as demandas, as sugestões, para acompanhas as mobilizações locais? Os cidadãos também cobram a nossa presença. Se um parlamentar ficar aqui no plenário os quatro anos e não voltar para a base ele não se reelege. Porque o nosso sistema de democracia é representativa. O cidadão que às vezes pode questionar isso também questiona a ausência do parlamentar. Se você pegar a agenda dos 40 deputados nessas duas semanas apenas de recesso, eu aposto meu mandato como a maioria esmagadora está comprometida com roteiro muito mais intenso de atividades do que se aqui estivesse. Temos um período de recesso que não considero exagerado. Acho que esse tempo é necessário para que se restabeleça o contato com as bases.
DC – Mas os parlamentares já não tem os fins de semana, as segundas e as sextas para isso?
Ponticelli – Temos. Mas final de semana você vai participar de festa, de rodeio, de futebol. Naqueles eventos de maior concentração pública. Agora essas reuniões de avaliação de mandato e as visitas você não consegue fazer no final de semana.
DC – E as segundas e sextas que são dias úteis e as prefeituras estão funcionando
Ponticelli – Olha, nós também temos muitas atividades concentradas nesses dias na própria casa. Você vê pelo volume de audiência públicas que tivemos, quase 30. Essas geralmente ocorreram nas segundas ou sextas. Tivemos um grande volume de atividades. E elas geralmente ocorrem ou nas regiões ou aqui na própria casa.
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DC – Em abril o senhor anunciou a auditoria do ponto dos servidores. Era um mês, mas já levou um período um pouco maior.
Ponticelli – E vai levar um pouco mais.
DC – Qual a previsão de conclusão do trabalho?
Ponticelli – Estamos avaliando e tomando algumas medidas já. Um medida concreta que já tomamos foi a redução dos equipamentos de pontos de relógios de ponto, para inibir qualquer ação de alguém que possa bater ponto em um equipamento e sair por outro local. Estamos analisando todo o conteúdo das filmagens com muito cuidado. Temos uma comissão avaliando dessa forma para não cometer injustiças com o servidor, que daqui a pouco pode colocar a Assembleia na obrigação de ter que reparar qualquer dano promovido.
DC – O assunto do auxílio-moradia surgiu e desapareceu aqui em Santa Catarina. Em São Paulo, o Ministério Público derrubou o benefício, mas os deputados retomaram com um outro tipo de auxílio-moradia. Há interesse em retirar o auxílio para quem já tem apartamento em Florianópolis ou é residente aqui?
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Ponticelli – Na verdade, o parlamento quando instituiu o auxílio-moradia, aqui foi em 1999, instituímos exatamente para compensar essa despesa que o parlamentar tem para se manter aqui 3 ou 4 dias por semana, mas ele não pode se fazer do domicílio na sua região. Se ele não estiver aqui no exercício do mandato, esse imóvel vai estar gerando uma receita para ele. Se ele estiver aqui, esse imóvel vai ter uma despesa. Vai ter que ter alguém que cuide dele, que cuide das roupas, da manutenção, de condomínio, de luz, de água. Então esse imóvel, mesmo que seja do titular aqui, ele gera despesa para o exercício do mandato. A verba, no meu entendimento, é uma verba indenizatória porque ninguém vem para cá para morar embaixo da ponte.
DC – O salário já não é suficiente para isso?
Ponticelli – Se você considerar o aumento do auxílio-moradia, representou pro parlamentar em torno de R$ 1,5 mil por mês de incremento, depois de quase 14 anos. O fim do 14º e do 15º representou menos R$ 3,5 mil no contracheque do parlamentar. E disso pouco se falou. Se falou muito nesses R$ 1,5 a mais e pouco nesses menos R$ 3,5 mil. Veja que nós também cortamos na carne e não há a mesma repercussão. Falo disso para cobrar um pouco mais de justiça também. Porque em qualquer regime que o poder seja exercido ele tem um custo. Na democracia, tem um custo. Ainda acho que, mesmo com todos os consertos que precisamos fazer, esse é o melhor regime. Na monarquia, tem um custo. Na ditadura, tem um custo. Estive em Cuba há pouco tempo. Eu vi onde mora o povo e eu vi onde moram os membros do governo. É uma diferença monstruosa. O povo mora em casa caindo as janelas. Os membros do governo moram em verdadeiros palacetes. De fazer inveja a muitos magnatas americanos. Mas é uma opção que aquela sociedade fez. Ou não sei se pode fazer. O exercício do poder tem um custo de manutenção. O que precisa é ter a coragem de se discutir quanto custa o exercício em cada um dos três poderes.
DC – O corte do 14º e do 15º é realmente um corte do que os parlamentares recebem. Mas ao mesmo tempo é o corte de um privilégio que ninguém mais da população tem. Ponticelli – Também é verdade. Por isso se cortou. Mas eu não sei porque não se cobrou a mais tempo. Tinha casos de assembleias que tinham há mais de 30 anos esse benefício. E veja que no momento certo se percebeu que não dava mais para manter aquilo. E cortar da própria carne não é fácil. Foi o que aconteceu. Por isso estou com a consciência muito tranquila. Porque no balanço estamos economizando R$ 2 mil por mês por parlamentar. Se somar isso no final de uma legislatura, vai se ver que estamos avançando cada vez mais. A população está aí na rua para isso.
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