Rogério "Peninha" Mendonça (MDB) é deputado catarinense e autor do projeto 3722/2012, proposto para regulamentar a posse e o porte de armas no país, considerado o próximo passo do governo Jair Bolsonaro (PSL) na política de flexibilização armamentista. Ele integra a popular "Bancada da Bala" no Congresso e defende o direito de autodefesa.

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Na entrevista, Peninha fala sobre seu projeto e a política de flexibilização armamentista do governo Bolsonaro:

Seu projeto prevê o direito à posse e ao porte de arma. Por que o senhor defende que um cidadão comum possa andar armado?

O que eu pretendo é ter o direito à autodefesa, não é o direito de matar que eu estou querendo. O que me levou a apresentar esse projeto? Foi a maior pesquisa da história de um projeto antes de ser apresentado. Ouvi mais de 150 milhões de pessoas. Foi o referendo que nós tivemos, em 2005, e estava imbuído lá dentro para perguntar se a população era contra ou a favor. O que aconteceu? 64% da população disse "não" ao desarmamento. Santa Catarina fez 76% contra o desarmamento. Quando foi aprovado o estatuto, a grande argumentação é que reduziria a criminalidade. Com isso, houve a redução da comercialização de armas no Brasil em 90%. Pela lógica deles, a criminalidade iria diminuir. Foi o que aconteceu? Claro que não. Tiraram a arma da mão do cidadão de bem. O governo não combinou com os bandidos para eles entregarem também. Quais são os cinco Estados com mais armas registradas no Brasil? Acre, Rio Grande do Sul, Roraima, Santa Catarina e Mato Grosso têm 33% das armas registradas e 9% dos homicídios. Por outro lado, Pernambuco, Bahia, Ceará, Sergipe e Maranhão têm 6% das armas legais e 26% do total de homicídios no Brasil. Ou seja, os cinco Estados mais armados têm menos homicídios. Os menos armados têm mais homicídios. Todos os números mostram que não é a arma na mão do cidadão de bem que aumenta a criminalidade. Nossa intenção não é armar a população, é simplesmente o direito à autodefesa, que é o pilar de uma sociedade livre, democrática.

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Os cinco Estados mais armados têm menos homicídios. Os menos armados têm mais homicídios

Uma arma de fogo custa caro. A prática de tiro também não é barata. Isto não significa que só uma parte privilegiada da população vai ter acesso às armas?

Não. Veja esses caras que são a favor do desarmamento. Deputados… Andam com dois, três seguranças, carro blindado. Aí o cidadão que não tem dinheiro não pode ter uma arma? Infelizmente, isto é o mercado. Eu defendo também a abertura do mercado nacional para a comercialização de armas, para que venham mais empresas. A questão do preço da arma é igual a questão do carro, é maior ou menor em um ano. Hoje quase que existe um monopólio da Taurus no Brasil, então eu defendo essa abertura. Pior é como está hoje, que só o cara poderoso tem segurança armado.

Nos últimos dias, a pesquisa Datafolha apontou que mais de 60% da população brasileira é contra a posse de armas. Isto não contradiz seu projeto e o decreto recém-publicado?

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Qual é a segurança que eu tenho na pesquisa da Datafolha? Eu tenho certeza é do referendo. E pode fazer outro referendo no Brasil que não vai dar muito diferente. Eu mesmo, antes da campanha, fiz uma pesquisa para uso interno. Pesquisas minhas, que contratei, elas têm números infinitamente superiores em relação à decisão do cidadão ter a posse e o direito à arma. Pesquisa é muito relativa. No período eleitoral, ninguém dizia que o Bolsonaro ganhava. Aqui em Santa Catarina mesmo, diziam que o (Carlos) Moisés nem sonhando iria para o segundo turno.

Defendo também a abertura do mercado nacional para a comercialização de armas

Nosso Estado teve uma redução expressiva de homicídios em 2018, o que é atribuído às estratégias das forças policiais. Esse não é o caminho mais adequado para enfrentar a violência?

É o mais adequado, não tenho dúvida. Mas enquanto nós não tivermos essa condição… Em 2001, antes do Estatuto do Desarmamento, nós tínhamos 8,7 homicídios por 100 mil habitantes no Estado. Hoje, temos 14,2. Deus queira, se o Estado conseguir dar segurança para nós todos… Como aconteceu na minha região do Alto Vale, com um agricultor, seu trator estava sendo roubado. Ele pegou a arma, atirou, o ladrão fugiu. Na mesma noite, outro cara ouviu o barulho de alguém tentando roubar e ligou para a polícia. Está até hoje esperando. Como é que se admite o Estado não dar segurança para quem mora lá, sujeito à mulher ser estuprada, ter o trator roubado? Não dá segurança e não dá a liberdade para o cara se proteger. Foi um bom trabalho (a redução de homicídios em SC), espero que continue. Vou ser o primeiro a bater palmas e dizer: "tira o meu projeto porque hoje o Estado dá segurança para todo mundo". Mas, pelo que eu vejo, vai longe.

O senhor tem arma? Anda armado?

Não tenho, até pela questão da legislação. Estou morando em Balneário Camboriú, inscrito em um clube de tiro. Vou fazer um curso agora, em função do decreto. Acredito que, no máximo, nesse semestre já vou ter minha arma. Estou me preparando para ter a posse, nesse primeiro momento, de uma arma. Aproveitando a legislação.

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A definição de "cidadão de bem" tem sido muito repetida. O que o senhor considera um cidadão de bem?

É o que está aqui na legislação dizendo que ele pode ter arma. É um cara que não tem antecedentes criminais, não cometeu crime em nenhuma esfera, não deve nada a ninguém. Tem uma ocupação lícita, uma residência certa, convivência com a sociedade, pode andar onde quiser e não temos preocupação com ele. Cidadão que não é de bem é o cara que já roubou, assaltou, tem antecedentes criminais, ficha corrida, já bateu na mulher. Esse não é de bem, o cara que bateu na mulher, no filho, tem um histórico de agressão familiar, na sociedade, com os vizinhos. Não sei por que há dúvida quando digo cidadão de bem.

O noticiário policial registra cotidianamente homicídios por motivações banais. Desentendimentos entre vizinhos, brigas de bar. Com mais armas à disposição, isto não vai ser mais comum?

Vai continuar havendo exceções. Hoje, as brigas existem com faca, violão, com carro. Mas eu considero o número de pessoas, casas, famílias que conseguiram preservar seu patrimônio, sua vida, e não entram nas estatísticas. Por exemplo, o agricultor que deu o tiro para cima e o ladrão fugiu. Esse não deu queixa na polícia. Aquele outro que ligou para a polícia, a polícia não atendeu e o trator foi roubado, esse deu queixa. As exceções sempre vão existir, mas nós queremos que na lei possamos filtrar ao máximo. O cara que tem a posse, se em qualquer momento ele cometer algum deslize e for denunciado, vai perder a posse. Eu acredito que, na regra geral, vamos ter muito mais benefícios do que problemas. Problemas vão existir, com armas ou sem armas.

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Vamos ter muito mais benefícios do que problemas

O senhor inicialmente fez ressalvas ao decreto assinado pelo presidente Bolsonaro. Ainda tem pontos que não o agradam na proposta?

Na verdade, quando saiu o decreto dizia lá o seguinte: "Somente será dado para os Estados com altos índices de violência, mais de 10 homicídios por 100 mil habitantes". Eu ainda pensava que os índices de Santa Catarina eram aqueles que eu tinha em mente, ou seja, Santa Catarina estaria fora, São Paulo estaria fora. Mas, como depois fui ver detalhadamente, eles estão considerando os índices de 2016. Na verdade, universalizou. A minha preocupação é a universalização (do direito à arma).

Muitos especialistas que estudam o fenômeno da violência apontam que mais armas vão provocar mais mortes no país. Ele estão errados?

O grande problema é que a maioria desses especialistas trabalha mais com ideologia. Quem defende esse tipo de posicionamento lá na Câmara é o PT, o PSOL. Essas ONGs sempre foram financiadas pelo governo do PT nesses anos todos, que tem esse tipo de posicionamento, ideológico. Quero ver sem esses financiamentos, pesquisas sérias… Com certeza, os números que eles apresentam não é nada confiável. Vamos ter a discussão do meu projeto lá na Câmara e é muito claro, nenhum deputado do PT vai votar para nós. Os do PSL, todos vão votar.

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Acredito que, no máximo, nesse semestre já vou ter minha arma

O senhor considera que o seu projeto tem apoio suficiente no Congresso para ser aprovado?

Tudo na Câmara é polêmico. Na atual legislatura (termina no final de janeiro), acho que até daria, mas seria mais complicado. Com a nova legislatura, que tem perfil mais conservador, acredito que vai ser facilitado. Mas, evidentemente, o meu projeto não vai poder ser aprovado tal qual eu apresentei. Vamos ter que ceder, aprovar dentro do possível em um primeiro momento. Tenho falado com o pessoal do governo e eles me pediram para não colocar em votação antes de votar a Reforma Previdenciária, vai tumultuar muito e acaba atrapalhando a votação da reforma. Não quero que meu projeto vá prejudicar a economia do Brasil. Passando essa fase, penso em colocar em plenário. Um relator de plenário que eu penso que seja tipo o Eduardo Bolsonaro, filho do Bolsonaro, que é deputado comigo. Ele, como relator, vai ouvir diferentes segmentos políticos e tentar apresentar um substitutivo possível de aprovar.

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